Impaciente, uma senhora resolveu puxar palmas e foi seguida pelo público. Havia quase 40 minutos, uma plateia numerosa aguardava ontem à tarde pela apresentação de José Celso Martinez Corrêa e o seu Teatro Oficina na 29.ª Bienal de São Paulo. Mas foram em vão os apelos para que o diretor começasse logo. Muitos não sabiam, mas do outro lado do prédio os atores, seminus, já tocavam seus tambores, dançavam e eram seguidos por uma pequena multidão.
Como prometido, o Teatro Oficina encenou sua releitura para O Bailado do Deus Morto, única peça teatral escrita pelo artista Flávio de Carvalho, em 1933. A obra, que estreou há quase 80 anos e chegou a ser interditada pela polícia na época, surgiu em nova versão pelas mãos de Zé Celso. Mas não menos polêmica.
Com tom mais festivo que o texto original, o diretor transformou o espetáculo em um grande cortejo carnavalesco e abriu espaço para incorporar uma série de comentários, muitos em tom crítico, aos episódios que marcaram o primeiro dia de abertura da Bienal ao público, no sábado. Durante a encenação, surgiram menções ao pichador Djan Ivson, que teria invadido a instalação do artista Nuno Ramos e pichado a frase "libertem os urubu" (sic), anteontem à noite. A obra, cercada por tela, tem três urubus.
A ação dos seguranças, que entraram em confronto com pichadores e manifestantes que protestavam contra a instalação, também foi citada durante uma das passagens. Mas, apesar do tom irônico, o curador-geral da Bienal, Moacir dos Anjos, afirma não ter visto na performance críticas à organização. "O Zé Celso sempre incorpora o que acontece em trabalho. É um teatro vivo, político", disse o curador, logo após a apresentação do grupo.
De fato, não faltaram referências à política atual na encenação. Durante a peça, o diretor fez questão de ressaltar aquilo que chamou de "temas tabus". Os atores incorporam à sua dramatização questões como o narcotráfico.