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Palco, plateia e coxia

"Hotel Mariana" volta ao cartaz e vai virar filme sobre tragédia mineira

Por João Wady Cury
Atualização:
Cena da peça "Hotel Mariana", sobre a tragédia de Mariana em 2015, em cartaz na Oficina Cultural Oswald de Andrade. Foto: Custodio Coimbra

 

 

Há uma semana, depois de temporadas em vários teatros desde que estreou, em 2017, a peça Hotel Mariana voltou ao cartaz na Oficina Cultural Oswald de Andrade com apresentações às segundas e terças, 20 horas, até 21 de fevereiro. Parece piada pronta, justamente quando uma tragédia de características similares acontece em Brumadinho -- desta vez com mais vítimas, 65, por enquanto, em comparação a Mariana, 18 pessoas mortas. E não se limitará a teatro: a peça vira filme, chamado Desterrados, e está em pré-produção.

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A encenação foi criada a partir dos depoimentos tomados de vários sobreviventes pelo ator e dramaturgo Munir Pedrosa. Desde 2015, ele vive com os fantasmas da tragédia de Mariana, ocorrida em 5 de novembro de 2015. Poucos dias depois do estouro da barragem de rejeito de minérios de Fundão, a 35km de Mariana, e administrada pela Samarco, Pedrosa rumou a Mariana com um gravador e colheu depoimentos que acabaram servindo de base para a construção da dramaturgia de Hotel Mariana.A técnica é conhecida como teatro verbatim, pois se utiliza de depoimentos reais das pessoas envolvidas no fato como elemento principal da dramaturgia.

Não foi à toa que, por conta de toda essa carga de intensidade e, pode-se dizer, de verdade, a montagem de Hotel Mariana tenha se tornado sucesso de público nos palcos paulistanos, levando a ser reapresentada diversas vezes nos dois últimos anos. A peça tem direção de Herbert Bianchi e dramaturgia de Munir Pedrosa e do próprio Bianchi. Pedrosa também participa do elenco, com um grupo formado por Ana Toledo, Bruno Feldman, Clarissa Drebtchinsky, Fani Feldman, Isabel Setti, Letícia Rocha, Marcelo Zorzeto, Rita Batata e Rodrigo Caetano.

Nesta terça, 29, pela manhã Munir Pedrosa conversou com a coluna ArCênico

 

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Como será o filme? O filme se utilizará dos mesmos depoimentos presentes na peça e imagens de arquivo. Construiremos uma Bento Rodrigues e Paracatu simbólicas, onde atores e depoentes reais se encontrarão conflitando os depoimentos de 2015 com os novos depoimentos dos dias de hoje. Roteiro e direção minha, produção do Daniel Gaggini, da MUK Filmes. O elenco ainda não está definido.

 

Não deu vontade de ir a Brumadinho, como fez com Mariana em 2015? Não é bem uma vontade, não há vontade de tocar as mãos numa tragédia. É muita tristeza e destruição. O que me levou até Mariana foi a raiva que senti, não dava mais pra conter, virou uma contramão inevitável. Falar de Mariana é também falar de Brumadinho. O mesmo crime, os mesmos criminosos, os mesmos motivos.

 

Mas considera ir? Penso na possibilidade de ir, mas não tenho certeza. Estou em cartaz simultaneamente com duas peças, Hotel Mariana e Dogville, que me prendem em São Paulo quase todos os dias da semana. Só não estou no palco às quartas e quintas-feiras, esses compromissos praticamente anulam minhas chances de viajar.

 

Vêm em Brumadinho a possibilidade de nova montagem? Não vejo, pelo menos até agora. Hotel Mariana é uma peça denúncia, ela cumpre este papel, além de ser um documento sobre o tema. Ir à Brumadinho, neste sentido, daria no mesmo. Falar de Mariana é também falar de Brumadinho. O que fizemos foi voltar para o material bruto da pesquisa que fiz em Mariana em 2015 pra encontrar nos depoimentos as falas que dizem que a tragédia vai se repetir. Muitos depoentes já previam isso por conta de outras barragens comprometidas. É um descaso sem fim. Vamos fazer uma pequena adaptação finalizando o espetáculo com essa triste previsão. Brumadinho está em Hotel Mariana.

 

 Foto: Estadão
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