Curiosamente, para surpresa de alguns, lá fora, no "estrangeiro", o quadro não é muito diferente: pensa-se igualmente que a grama do vizinho é sempre a mais verde. O que todos os artistas buscam, em realidade,é de um lugar ao sol, de reconhecimento, mesmo que de modo desajeitado e errante, o que não deixa de ser um perigo. A busca mal entendida de sucesso pode confundir a legítima missão de ser músico com um desejo desenfreado de visibilidade, de sucesso, de sentir-se prestigiado e querido: uma espécie de carência afetiva artística, mixada com fama, glamour e desejo de poder. Nesta hipnose, as regras pouco claras deste jogo desdobram-se em um mar comportamental sem margens: músicos convidados em regime troca-troca (eu te convido para você me convidar), vínculos comerciais com managers e agências que vinculam convites a uma panelinha, artistas mais ou menos conscientes de seu despreparo que ocupam posições de chefia por laços de amizade (nada contra a amizade quando há competência). Confunde-se arte com exibicionismo. E a cultura se transforma em negócio.
Insisto: há muita gente, muito boa, no mercado. Talentos não noticiados pela grande mídia mas que causam furor por onde passam neste mundo afora. O pianista Eduardo Monteiro, carioca da gema, é um deles. O respeitado, atuante e impecável spalla do Theatro Municipal de São Paulo, Pablo de León, que acaba de retornar dos USA como professor do Jasha Heifetz Symposium é outro (faz poucos dias apresentou-se no Royal Albert Hall, em Londres, sob a batuta de Valery Gergiev). O respeitado pianista Arnaldo Cohen, exímio, encontra mais espaço fora do que dentro. Hoje, Sonia Racy relembra-nos outro nome: Flavio Varani (leia aqui). E tantos outros que, impossível citar o nome de todos, acabam não ganhando a merecida e real visibilidade, talvez por não jogarem o jogo da ambição, por estarem mais focados no que realmente interessa: sua arte. Chamou a atenção o fato de que a 16° edição do célebre Concurso Chopin, realizado em Varsóvia, não deu seu primeiro lugar ao pianista russo revelação do momento Daniil Trifonov. Ele ficou em terceiro lugar. Pedigree na música é importante, mas não necessário. O necessário é ter qualidade.
Ouve-se, com certa frequência, a frase: "Quem é esse "cara" que vai se apresentar? Ele não é conhecido...". Pois bem, vá e o conheça. A única forma de conhecimento é ir em direção ao desconhecido. Uma experiência existencial renovadora. Figuras carimbadas dos chamados "queridinhos" coloca em detrimento novos valores musicais, oferecendo-se ao grande público eventos que, menos pelo interesse artístico, movem-se pela segurança da bilheteria. Óbvio que não existe agenda ou espaço para que todos sejam chamados sempre e a todo momento. Mas a dança das cadeiras bem que podia ser um pouco mais democrática.