Minissérie de Vítor Mafra com Matheus Nachtergaele faz belo retrato de Zé do Caixão

O ator é a alma da minissérie que começa nesta sexta-feira, 13, no Space

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:
  Foto: Marjorie Sonnenschein | DIV

Com todo respeito por José Mojica Marins, Matheus Nachtergaele consegue ser mais Zé do Caixão que ele. O ator é a alma da minissérie que começa nesta sexta-feira, 13, no Space, pegando carona na data, sexta-feira 13. São seis episódios, sempre nesse dia e horário, 22h30. Os dois primeiros foram exibidos pela Mostra, como homenagem a Mojica. Poderiam estrear nos cinemas como um filme de duas horas sobre a gênese de Zé do Caixão. Em O Tapete Vermelho, de Luiz Alberto Pereira, Matheus fez um personagem inspirado em Mazzaropi, não exatamente o comediante que deu cara ao jeca paulistano. Em Zé do Caixão, de Vítor Mafra, ele não faz um personagem 'inspirado', mas o próprio. Em princípio, nada os aproximava, e muito menos o físico.

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Essa parte foi resolvida com auxílio de figurino, maquiagem. O temperamento é mais uma questão de interpretação. Pelo menos nos dois primeiros capítulos, e nesse que o telespectador verá nesta sexta, o Zé do Caixão de Matheus e Mafra é um pouco o Ed Wood brasileiro. Basta lembrar-se do personagem icônico de Tim Burton, com Johnny Depp. Wood era um homem com um sonho. Queria ser um grande cineasta – foi o pior do mundo, reza a lenda. Burton, numa licença poética, chegou a imaginar um encontro – que nunca houve – entre Ed Wood e o criador de Cidadão Kane, Orson Welles. O pior e o melhor diretor do mundo, ambos apaixonados por seu meio de expressão.

No começo, Mojica dá aulas de interpretação e toma dinheiro dos alunos, em troca de papéis, para garantir a produção. Embora com liberdades, a história é real. Ainda nos anos 1950, Mojica estreou com um faroeste caboclo intitulado Sina de Aventureiro. A gênese do cineasta é, um pouco, a da Boca do Lixo. Bangue-bangue, e sexo. O importante é mostrar a mocinha como uma gostosa. A filmagem movimenta uma cidade do interior. O padre enlouquece de desejo pela estrela. Um marido zeloso deixa-se seduzir pelo mundo da ‘arte’. A mulher ciumenta troca balas de festim por projéteis de verdade e quase provoca uma tragédia.  

Essa é a parte que vai ao ar hoje. A similaridade com Ed Wood não diz tanto respeito ao talento, mas a circunstâncias de produção. Autodidata, Mojica valia-se de expedientes (as aulas) para financiar a vocação. Era um primitivo, avançando na intuição. No próximo capítulo, aí sim, chegando ao fundo do poço e desistindo do western brasileiro, Mojica vai se reinventar no terror, criando seu personagem emblemático – Zé do Caixão. Depois de À Meia-Noite Levarei Sua Alma, de 1964, e percorrendo uma via que praticamente não existia no Brasil – o terror –, ele iniciou a trajetória que o levou a obter reconhecimento até no exterior, onde Zé do Caixão virou (nos EUA) Coffin Joe.

Vítor Mafra baseou-se na biografia de José Mojica Marins escrita por André Barcinski e Ivan Finotti, publicada em 1998 – Maldito. Há uma acentuada preocupação com a verossimilhança. A reconstituição de época é bem cuidada e o próprio Barcinski, em seu blog, contou da emoção que foi ver as cenas com os pais de Mojica. O pai, ele só conheceu de fotos, mas, com a mãe, chegou a conviver, por conta de sua atividade como biógrafo. Barcinski garante que Annamaria Barreto, que faz Dona Carmem, é perfeita. A própria cena é bonita. Uma cozinha modesta, no bairro de classe média de Vila Anastácio. A mãe sacrifica-se e dá a própria aliança, o pai vende o carro, tudo para financiar o sonho louco do filho. Matheus transmite a paixão, a loucura (positiva) do criador. Mojica não poderia ter encontrado melhor expressão dele mesmo.

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