Festival reúne cinco grupos de língua portuguesa

Companhias de Moçambique, Angola, Portugal, Cabo Verde e Brasil discutem o seu ofício no mundo globalizado

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colunista convidado
Por Leandro Nunes
Atualização:

Durante a apuração dessa matéria, o governo de Portugal estava ameaçado. Na tarde da terça-feira, 10, a maioria parlamentar, de esquerda, aprovou uma moção para rejeitar o primeiro-ministro Passos Coelho (PDS/CDS) e sua política de austeridade. “Observe como o mundo se transforma e o teatro está aí para pensar nisso”, aponta a doutora em Linguística Elizabeth Brait e responsável por organizar a programação do Festival de Teatro Lusófono no Sesc Bom Retiro.

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A mostra, que tem abertura no sábado, 14, traz montagens de cinco países – Moçambique, Angola, Portugal, Cabo Verde e Brasil, nações que possuem em comum bem mais que o mesmo idioma. “Os espetáculos descrevem trajetórias muito parecidas, em torno tanto de narrativas de libertação como histórias de emancipação democrática.” Na montagem portuguesa 24A74 Salgueiro Maia, o ator Ricardo Simões traz o relato do militar Fernando José Salgueiro Maia (1944-1992). Sua participação na revolução de 1974, a Revolução dos Cravos, pôs fim à ditadura vigente desde 1933 no país. 

A reunião de espetáculos de língua portuguesa também se faz urgente pela distanciada relação do Brasil com o teatro produzido por estes países, explica Elizabeth. “Na nossa formação escolar, não aprendemos literatura lusófona africana, por exemplo.” 

Direto da África, a obra Olímias, do escritor angolano Adriano Botelho de Vasconcelos, ganha montagem pela Companhia Dadaísmo de Teatro. Nela, a infidelidade de um pai amaldiçoa os três filhos. O castigo do homem será assistir à destruição de sua família, sem poder fazer nada. “Na maioria das vezes, só conhecemos as obras portuguesas que nos definiram enquanto país colonizado.”  Outro representante africano, Cinzas Sobre as Mãos, traz de Moçambique o lugar de um conflito crise político-militar. A peça mostra dois coveiros cumprindo o trabalho de recolher e enterrar as vítimas da guerra. Um dia, eles encontram uma sobrevivente e, com medo de serem acusados de colaborar com o inimigo, transformam a mulher em escrava. 

E, para representar o Brasil, a atriz Arieta Correia encontra a poesia da portuguesa Florbela Espanca (1894-1930), obra que conheceu em uma viagem pelo país. “Apesar de ser curta, a vida de Florbela foi muito tumultuada”, conta. Em 1907, a menina escreveu seu primeiro conto em homenagem à mãe, Antonia da Conceição Lobo. No ano seguinte, a mulher falece. Anos mais tarde, foi a vez do irmão, Apeles Espanca, que morreu em um acidente de avião. “Florbela dizia que ele era o amor da vida dela. Até acusaram de incesto, mas era apenas uma relação fraternal.” 

Após os trágicos acontecimentos, e duas tentativas de suicídio, Florbela é diagnosticada com edema pulmonar e se mata em 8 de dezembro, no mesmo dia em que completava 36 anos. “Seus textos falam de um mundo violento, que pode machucar as pessoas. Ela transformou essa dor, transformou-a em arte.” 

Sua obra mais importante se chama Charneca em Flor, publicada postumamente, em 1931. O livro é composto por sonetos que também homenageiam sua terra natal. “Ela é muito estudada e respeitada nas universidades de Portugal. Como todo artista, Florbela foi uma inconformista. Levava uma vida boêmia e era chamada de prostituta por sair com diversos homens. Mas nada abalou sua poesia. Ela amava o amor”, conta Arieta.

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NA PROGRAMAÇÃO

‘Cinzas Sobre as Mãos’ (Lareira Artes – Moçambique) Dois coveiros trabalham durante uma guerra. Um dia, eles encontram uma sobrevivente que pensam ser do lado inimigo.   ‘24A74 – Salgueiro Maia’ (Centro Dramático de Viana – Portugal) O ator Ricardo Simões traz seu monólogo inspirado na Guerra do Ultramar e nos conflitos entre o país europeu, Angola,M oçambique e Guiné.    ‘Olímias’ (Cia. Dadaísmo Teatro – Angola) Na trama, três filhos foram amaldiçoados por um pai infiel. O castigo do homem será assistir, passivamente, ao fim de sua família.

FESTIVAL DE TEATRO LUSÓFONO. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann, 185. Bom Retiro. 14, 20h; 15, 18h; 17 e 18, 20h; 21, 19h; 22, 18h; 25 e 26, 20h; 28, 19h; 29, 18h. R$ 9 / R$ 30.  

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