Companhias de dança reclamam da falta de apoio do governo

Sem patrocínio, grupos como Cisne Negro e Ballet Stagium lutam para manter espetáculos em meio à alta dos aluguéis dos teatros

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Por Helena Katz
Atualização:

Quem acompanha a dança que acontece na cidade de São Paulo não deixa de se surpreender com a quantidade de trabalhos que estreiam a cada semana. Essa vitalidade se deve ao Programa Municipal de Fomento à Dança, criado em setembro de 2006, através da Lei 14071/05, que transformou a cena local, irrigando-a com um fluxo incessante de criações.

Todavia, a dança de São Paulo não se restringe aos que vivem desse programa - situação em que se encontram, por exemplo, o Ballet Stagium e o Cisne Negro. Sem patrocínio que lhes assegure verba para cumprir com a sua folha de pagamentos e com os custos das suas produções, dependem da venda de seus espetáculos para sobreviver. O que sucede quando desaparece a possibilidade de continuar a dançar nos teatros nos quais sempre se apresentaram porque o preço do aluguel das salas de espetáculo extrapola a sua condição financeira? Esta questão ganha uma relevância enorme porque expõe a condição de fragilidade a que ambas estão condenadas pela inexistência de uma política cultural que reconheça a importância do que cada uma tem depois de 43 (Stagium) e 38 anos (Cisne Negro) de trabalho contínuo.

 Foto: Evelson de Freitas/Estadão

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“Para nós, está ficando simplesmente impossível preparar uma programação para o ano, como sempre fizemos”, conta Décio Otero, que fundou e dirige o Stagium junto com Márika Gidali, que complementa: “Nós não pararemos, estamos sempre enfrentando tudo o que vai surgindo, mas os atuais preços dos aluguéis dos teatros estão fazendo de 2015 um ano realmente muito difícil”. 

Busca. Hulda Bittencourt, fundadora e diretora do Cisne Negro, concorda. “Temos um espetáculo para apresentar no Rio, porque precisamos cumprir um contrato firmado no ano passado, e não estamos encontrando uma casa para nos receber com preços possíveis de serem pagos para o seu aluguel”, afirma ela.

Danny Bittencourt, filha de Hulda, que foi bailarina, e hoje é coreógrafa e divide com ela a direção do grupo, complementa: “É preciso somar a esse quadro preocupante também a ausência de datas para a dança no Theatro Municipal de São Paulo, inclusive com redução do espaço para a companhia da casa, o Balé da Cidade de São Paulo”. 

“Não fosse o apoio permanente do Sesc e do Sesi, e a possibilidade de dançar nos CEUs, e não saberia como planejar este ano”, diz Márika, no que é totalmente endossada por Hulda, salientam que os preços estão oscilando entre R$ 15 mil e R$ 50 mil. Para Hulda, “deveria existir um preço especial para as companhias de dança nesses aluguéis. Onde está o olhar necessário para ajudar a dança a ocupar o seu lugar na sociedade? O Estado também deveria explicar porque pratica uma injusta distribuição de recursos para as companhias de dança em São Paulo. Sempre apoiei os jovens, mas é indispensável reconhecer o que já foi feito”.

Com a determinação que as caracteriza, as duas companhias se preparam para seguir, enfrentando ventos muito pouco a favor. Décio Otero, que acaba de ampliar e atualizar Choros (1993), inicia uma nova criação, Canto da Minha Terra, com estreia prevista para o segundo semestre, na qual fará de Ary Barroso, mineiro de Ubá como ele, seu eixo condutor. “Nesse novo processo de pesquisa tenho pensado assim: o Décio Otero não faria isso, mas agora eu faço, porque não quero cair no risco de produzir outra Old Melodies (obra de 1998 cuja trilha sonora reúne uma sucessão de canções).” 

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Hulda Bittencourt anuncia que o Cisne Negro está com um excelente elenco. “Tem bailarino de todos os tipos, bem do jeito que eu gosto. Continuamos fazendo tudo da melhor maneira possível e não conseguimos aceitar porque está sendo tão difícil dançar no nosso país.”

O preço impeditivo dos aluguéis das casas de espetáculo torna-se um agravante que pesa no rol das muitas dificuldades que estas duas companhias continuam a enfrentar, e que também atingem outras que compartilham da mesma situação. Isso ocorre porque Stagium e Cisne Negro permanecem desabrigadas do que lhe devemos como reconhecimento pelo que vêm fazendo pela dança no nosso país, cada uma do seu modo.

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