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Chega a SP a nova versão de '5 X Comédia', que oferece riso com conteúdo

A convite do 'Estado', atores de montagens anteriores da peça fazem perguntas aos da versão atual

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Por Ubiratan Brasil
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O dilema de uma arara de pet shop que perde a estribeira porque não consegue ser vendida convive com o de um pai de recém-nascido que enlouquece por um boneco da Peppa Pig; enquanto isso, Branca de Neve lê Simone de Beauvoir e se enche de Rivotril na busca de se tornar uma nova mulher, uma figurante tira o diretor do sério durante um teste de elenco, e um rapaz, Flavio, quer estabelecer regras para uma suruba que está prestes a começar durante uma festa que acontece no apartamento emprestado da mãe. Eis o ponto de partida para 5 X Comédia, espetáculo que foi uma das sensações do teatro brasileiro nos anos 1990 e que agora volta, em versão atualizada, no Teatro Frei Caneca, a partir desta sexta-feira, dia 10.

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“Quando minha irmã Sylvinha concebeu o 5 X Comédia, em 1993, havia nos textos uma certa ingenuidade, um olhar mais voltado para dentro, para si, enquanto agora eles se voltam mais para fora. Estão impactados pela realidade que nos invade a cada segundo, mesmo quando as personagens são a Branca de Neve ou uma arara vermelha”, comenta Monique Gardenberg, responsável pela direção da nova versão ao lado do comandante da antiga, Hamilton Vaz Pereira.

Para isso, o time atual é formado por especialistas no humor - nomes como os de Bruno Mazzeo, Debora Lamm, Fabiula Nascimento, Lucio Mauro Filho e Thalita Carauta. Também os autores dos textos têm como especialidade descobrir o lado mais engraçado da vida: Antonio Prata, Julia Spadaccini, Jô Bilac, Gregorio Duvivier e Pedro Kosovski.

Personagens. Assuntos que transitam do novo feminismo à barbárie Foto: Dado Marietti

Monique conta que os ensaios foram estimulantes. “Foi delicioso, o mundo dos sonhos”, comenta. “Éramos cinco atores, cinco autores e dois diretores em uma troca intensa, todos criando com bastante liberdade, mas muita colaboração ao mesmo tempo. A coxia se tornou um segundo olhar, vivo, diário. E a parceria com Hamilton Vaz Pereira, uma aula.”

E o desafio é grande justamente para manter viva uma tradição. “Eu me lembro de entrar em cena como um corredor de revezamento parte para a corrida - com a responsabilidade de não comprometer o todo, de não murchar o público com o seu quadro. Existia uma progressão muito feliz de esquetes na primeira versão”, relembra Fernanda Torres.

Quinteto. Os atores, depois da apresentação no Teatro da Paz, em Belém Foto: Dado Marietti

A nova versão de 5 X Comédia nasceu, uma vez mais, de uma iniciativa das irmãs Gardenberg - em 1993, a montagem foi criada por Sylvia depois de um encontro com Pedro Cardoso; agora, Monique se aproximou de Bruno Mazzeo por intermédio de Augusto Casé, produtor dos filmes de ambos. “Essa é uma homenagem a ela”, conta Monique sobre Sylvia, que era sua parceira na produtora Dueto e morreu precocemente em 1998, aos 38 anos.

Como são cinco monólogos, Mazzeo comenta sobre a estranha sensação de estar solitário em cena, porém acompanhado pelos colegas nos bastidores. “Nunca me sinto sozinho e a interpretação depende do ‘diálogo’ com o público”, observa ele que, no espetáculo, vive Rodrigo, o clarinetista enlouquecido com a dura tarefa de fazer dormir o filho recém-nascido. “O que vem de volta vai ditando os caminhos. É uma experiência incrível e que me engrandece como ator.” Mazzeo respondeu a uma pergunta formulada por Fernanda Torres a convite do Estado, que também pediu a outros integrantes de antigas montagens (houve versões em 1993, 1995 e 1999) a apresentarem suas questões ao grupo que atualmente roda o País com a peça (veja trechos de algumas “entrevistas” nas laterais dessa página). 

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As conversas, se trazem a informalidade como marca principal, também ajudam a entender a forma como o humor se transformou ao longo de duas décadas. “O que você vê de mais contemporâneo na linguagem dessa montagem?”, perguntou Claudia Raia a Lúcio Mauro Filho, que respondeu: “A gente manter a estrutura da comédia teatral, com texto, cenário, figurino. Afinal de contas, hoje em dia, o mainstream é o stand-up e sua despretensão de produção”. 

Lucinho, que no espetáculo vive o frustrado organizador da orgia, também foi inquirido por Diogo Vilela, que buscou uma análise mais aprofundada sobre a forma como a graça pode trazer questões íntimas. “Você acha que o humor pode ser psicológico quando representado?”, questionou Vilela. E a resposta foi: “Acho que existe um componente psicológico em qualquer tipo de representação. O que importa é a dosagem que, no meu caso, deve ser mínima”.

Filho do grande humorista Lúcio Mauro, Lucinho foi ainda desafiado por Andrea Beltrão a apontar a diferença existente entre o humor dos anos 1990 e o atual. Para ele, que pode acompanhar ao menos três gerações de comediantes graças à carreira do pai, o ponto principal está na inflação do mercado. “Nos anos 1990, verificamos que o bom ator tinha que se arriscar no humor. Hoje, os jovens não querem mais ser guitarristas, nem DJs. Querem ser comediantes. Com isso, há uma certa saturação e até mesmo um nivelamento por baixo”, disparou.

Com tal comentário, Lucinho sai da zona de conforto e busca, voluntariamente ou não, chacoalhar seus colegas de profissão. Uma bem-vinda medida, aprimorada por outras questões formuladas pelos convidados do Estado, especialmente aos jovens componentes do novo grupo, cuja maioria ainda não atingiu os 40 anos de vida. E coube, uma vez mais, a Diogo Vilela a missão de cutucar - para Debora Lamm, que interpreta a angustiada Branca de Neve, ele passou duas perguntas: “O comediante precisa se achar engraçado para fazer humor?” e “Você acredita que, para fazer humor, o comediante precisa ter técnica ou apenas o improviso?”. Debora, que se lembra de sair de uma sessão de 5 X Comédia no Canecão com as bochechas doendo de tanto rir, ofereceu uma resposta para as duas ponderações: “Independentemente de a pessoa se achar engraçada ou não, ela deve fazer o espectador rir. A técnica da comédia é muito precisa, o improviso também não é simples, exige agilidade do pensamento. O comediante é o ator que tem o requinte de um olhar crítico, debochado, generoso. Questão de olhar”.

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Para a mesma pergunta, Fabíula Nascimento, que vive a revoltada arara vermelha diante do novo mascote do pet shop, um poodle queen, foi sucinta: “Tudo é uma mistura de técnica com improviso”.FERNANDA TORRES entrevista BRUNO MAZZEOCostumo dizer que o 5 X Comédia era uma versão Las Vegas dos herdeiros do Asdrúbal e do Besteirol. A ideia de retornar com o 5 X rondou o grupo original, mas vocês vieram na hora certa, quando uma geração de novos atores e autores chegou à idade que tínhamos na época, 30 anos, idade Vegas, da maturidade. Qual a sensação de ter chegado aos 30? Adorei isso de Vegas. O primeirão só assisti em vídeo. Concordo quando diz que foi a hora certa da retomada. Mas, sobre a sensação dos 30, agora que tô chegando aos 40, confesso que não lembro!DIOGO VILELA entrevista DEBORA LAMMO comediante precisa se achar engraçado para fazer humor? Você acredita que para fazer humor o comediante precisa ter técnica ou apenas o improviso? Espero que tudo dê certo para esse espetáculo que amei fazer!

Independentemente de a pessoa se achar engraçada ou não, ela deve fazer o espectador rir. A técnica da comédia é muito precisa, o improviso também não é simples, exige agilidade do pensamento. O comediante é o ator que tem o requinte de um olhar crítico, debochado, generoso. Questão de olhar.

DEBORA BLOCH entrevista LÚCIO MAURO FILHO Qual é a dificuldade e qual é a grande delícia de fazer 5 X Comédia? A dificuldade está em conseguir fazer um desenho interessante durante a cena, com colorido e espaço para a dinâmica, pois cada um só tem sua própria cena para apresentar. A delícia é poder estar representando uma grife que preza pela excelência em todos os setores, interpretação, texto, direção, cenografia.E o que é comédia para você? Aquilo que provoca riso, com menos explicação possível.

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LUIZ F. GUIMARÃES entrevista FABÍULA NASCIMENTO Como você se sente trazendo à tona um espetáculo que foi um marco de público em todo o Brasil? Esse modelo de teatro muda alguma coisa para você como ator ou atriz? Eu fiquei muito feliz quando recebi essa oportunidade e também sinto muita responsabilidade, é um peso gostoso. Teatro é teatro, cada espetáculo tem um modelo diferente e o exercício real é o de nos transformar em cada projeto. Ser atriz é transformar, então, sim, esse modelo me levou para outros lugares, e a riqueza está exatamente nisso.

5 X COMÉDIA Teatro Frei Caneca. Rua Frei Caneca, 569 - Shopping Frei Caneca, 7º piso. 6ª, 21h.  Sáb., 21h30. Dom., 19h. R$ 50 / R$ 120. Até 30/4