Balé da Cidade e a reconstrução da humanidade no espetáculo ‘Anatomia 01’

Companhia paulistana mostra nova apresentação com coreografia da norte-americana Francesca Harper

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Por Juliana Ravelli
Atualização:

São Paulo encontrou Nova York quando a norte-americana Francesca Harper veio coreografar para o Balé da Cidade Anatomia 01, que teve estreia mundial na quinta-feira, 5, no Teatro Municipal. Francesca compartilha com Ismael Ivo, diretor da companhia paulistana, o entendimento de que a arte precisa olhar para a cidade e refleti-la.

Metrópoles – e seres humanos – não param de ser construídas nunca, material e subjetivamente. E é sobre reconstrução, reorganização e recomeço que Anatomia 01 trata. Francesca começou pesquisando o poder, seus abusos e sua relação com a política. A discussão sobre esses temas se aprofundou durante os encontros com os bailarinos brasileiros.

Ensaio do Baléda Cidade,que estácom nova coreografia no Teatro Municipal Foto: Gabriela Biló/Estadão

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“O trabalho acabou investigando onde poderíamos terminar se não permanecermos conscientemente em nossa humanidade. É sobre essa linha tênue entre humanidade, empatia e a falta delas. Lembra as pessoas que precisamos tomar cuidado em cada ação”, diz a coreógrafa, em entrevista ao Estado. “Com tudo isso ocorrendo politicamente e socialmente agora, Ismael e eu estamos preocupados e percebemos que a arte é uma plataforma social para mudanças se somos corajosos e dizemos o que precisa ser dito.”

São 16 bailarinos que compõem o elenco de Anatomia 01. Na trilha, composições dos alemães Johann Sebastian Bach (1685-1750) e Paul Hindemith (1895-1963), que são executadas ao vivo pela Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, sob regência do maestro Luís Gustavo Petri. Os figurinos são de Angélica Chaves.

Amigos

A bailarina, coreógrafa e cantora fundou em 2005 sua própria companhia: The Francesca Harper Project. Ela e Ivo se conhecem desde o início dos anos 1980, quando estudaram e dançaram na companhia de Alvin Ailey (1931-1989), em Nova York. Pouco depois, Ivo foi para a Europa. Anos mais tarde, os dois voltaram a se encontrar quando o brasileiro entrou em contato com o Ballet de Frankfurt, dirigido pelo norte-americano William Forsythe e no qual Francesca era solista. Ivo estava interessado na técnica de improvisação e na linguagem elaboradas por Forsythe. Eles também trabalharam juntos no ImPulsTanz, o festival de dança contemporânea que Ismael Ivo criou em Viena.

“O próprio Forsythe disse que desenvolveu essa nova forma da técnica do balé por meio da experiência dos corpos dos bailarinos. Francesca estava no centro da investigação. Achei que ela é a pessoa ideal para o Balé da Cidade, uma figura original que traz informação da fonte, essa técnica, essa desconstrução que, na realidade, constrói um outro tipo de arte da dança”, afirma Ivo.

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Essa foi a primeira passagem de Francesca pelo Brasil. Foram duas semanas de trabalho com o Balé da Cidade, que resultaram no que ela chama de “uma das colaborações mais importantes” de sua vida. “Ismael e eu realmente entendemos um ao outro, o que é raro. Mais do que tudo, nossa filosofia é a mesma. Como nos dirigimos aos bailarinos e como queremos empoderá-los, criar espaço para que eles contribuam. Isso é o que nos faz feliz e nos estimula como artistas”, diz a coreógrafa.

Durante a concepção de Anatomia 01, o pessimismo passou pelas discussões, mas o que ficou foram os questionamentos e a necessidade urgente de uma transformação realizada em conjunto, sem divisões. E Francesca afirma que há motivos para se ter esperança. “Sinto uma mudança de consciência. Nunca havia sentido com meus alunos (em Nova York) uma menor resistência e menos ego na sala como sinto agora. As pessoas estão muito nervosas e avaliando o que está acontecendo politicamente. Estão mais conscientes e atentas sobre como expressar seu amor um pelo outro ou a necessidade do amor. É algo notável.”

‘Risco’

O espetáculo Risco, criado por todo o elenco do Balé da Cidade e dirigido por Sérgio Ferrara, completa o programa. O trabalho estreou em março e leva a arte dos grafites ao palco para pensar sobre a convivência de diferentes ideias no espaço urbano.

BALÉ DA CIDADE 

Teatro Municipal

Praça Ramos de Azevedo, s/nº, tel. 3053-2090.

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6ª a dom., 20h (dia 15, 17h).

R$ 10/ R$ 40. Até 15/10. 

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