Chuck Hipolitho e Thadeu Meneghini possuem uma química quase que perfeita. Ao trocarem olhares relapsos e risadas descontraídas em um sofá desbotado do estúdio Wah Wah, na zona oeste de São Paulo, a dupla dos Vespas Mandarinas consegue, sem pestanejar, externar para o local o sentimento de leveza e experimentação das 14 faixas de Daqui Pro Futuro, segundo disco de estúdio da banda, que será lançado nesta sexta-feira, 10, nas plataformas digitais. “Nós passamos por grandes transformações. A gente se alimenta disso para fazer música, na verdade. Expectativas são feitas para serem quebradas, tanto pelo lado positivo quando pelo negativo”, afirma Tadeu em entrevista ao Estado.
O antes quarteto, e agora duo, mudou drasticamente desde o elogiado Animal Nacional (2013), trabalho de estreia da banda. Ainda com Flavinho (baixo) e Pindé (bateria) no grupo, alcançaram o status de grande revelação do rock nacional dos últimos tempos. Guitarras frenéticas, letras bem elaboradas e riffs em ebulição renderam aos Vespas uma indicação para o Grammy Latino na categoria de melhor disco de rock brasileiro. Tantas críticas positivas colocaram pressão no grupo. Como manter o foco e a qualidade do primeiro trabalho? Estariam eles fadados à maldição satânica do segundo disco? Não, isso, aparentemente, não aconteceu. A saída de Flavinho e Pindé teve o efeito contrário. Qualquer banda sofreria absurdamente com a ausência de dois integrantes. Os Vespas, entretanto, evoluíram. Resgataram algo perdido em seu DNA. “Começamos naquele lema de um por todos e todos por um. Não deu certo. A vibe era bem diferente. Agora, apenas comigo e o Tadeu, estamos no mesmo estágio de quando a coisa começou, só que com uma liberdade muito maior. Agora, isso tudo é permanente. Somos uma dupla. É como diz o nome do nosso disco. É da canção para o futuro. Daqui para frente”, conta Chuck.
Mais à vontade para criar e produzir, Chuck e Tadeu entraram de cabeça no projeto. Pegaram coisas que haviam rascunhado e decidiram transformá-las em canções potentes e avessas ao rótulo de “é só mais um rockezinho moderno aí”. Para isso, beberam da própria fonte, nas principais referências musicais do grupo: o rock brazuca. De Leoni, passando por Edgard Scandurra, que toca guitarra nas faixas E Não Sobrou Ninguém e Só Se Vive Uma Vez, a Pupilo, Marcelo Yuka e a participação especial de Samuel Rosa, do Skank, no single Daqui Pro Futuro. “Amamos o rock nacional. A gente foi arrebatado de uma maneira irreversível. Isso não é amor, é uma identificação nata. O rock nacional é a coisa mais importante para a gente. Pode tirar tudo, menos isso. Nós estamos aqui por causa deles: Paralamas, Ira! e Legião Urbana: o rock é o cancioneiro do País. Você pode colocar ritmo de axé, samba e qualquer outra coisa nele. O rock dos anos 1980 era tão brasileiro que até uma criança podia interpretar a letra, sabe? Naquela época, a música tinha um contexto de valorização muito maior”, contextualiza Tadeu.
Gravado e produzido na tradicional ponte aérea Rio-São Paulo, e com a produção de Rafael Ramos e Michel Kuaker, os Vespas experimentaram coisas até então inéditas para eles. Flertaram com teclados e violões. Além disso, abusaram do pop e aprenderam a falar de sentimentos com mais delicadeza. Isso, claro, refletiu em canções serenas como Fica Comigo e Expresso Nova. “A música é sempre algo poderoso. As canções não precisam se limitar a um conceito de banda. É preciso ter liberdade para consumir e fazer música. A velha liberdade de pensamento”, conclui Tadeu.
O clipe de Daqui Pro Futuro, lançado no início de fevereiro no canal KondZilla, no YouTube, recebeu muitas críticas de alguns fãs, que se surpreenderam com a sonoridade mais leve e voltada para o pop de Chuck Hipolitho e Thadeu Meneghini. “O clipe de Daqui Pro Futuro tem um fundo amarelo, que é a nossa cara. Muita gente reclamou porque colocamos o tchu tchu tchu ru tchu no rock ‘n’ roll. Até o Robert Smith, do The Cure, já fez isso, por exemplo. É preciso abrir a cabeça. As pessoas, no geral, são fechadas para outros estilos de música. O KondZilla é um canal de funk e hip-hop. Talvez por isso tenha assustado tanta gente. Por que decidimos publicar o clipe ali? Queríamos alguma novidade, quebrar paradigmas e mostrar o quão aberto poderíamos ser para outros estilos”, conclui Chuck. FAIXAS DO ÁLBUM
Daqui Pro Futuro Participação de Samuel Rosa
Que Esse Dia Seja Meu Letra de Marcelo Yuka
Fingir Que Não Dói Balada de Chuck e Leoni
Só Pra Te Dizer A música mais romântica
Carranca Outra balada melada
Fica Comigo Dedilhado potente
Cada Um Sabe de Si Melodia suave de Thadeu
E Não Sobrou Ninguém Letra inspirada no poema de Vladimir Maiakovski
Lambe-Lambe Pop bem feito na voz de Chuck
Expresso Nova Mantém a cadências do pop
Inutensílios Lembra o melhor dos anos 1980
De Olhos Bem Fechados Chuck assume os vocais
Só Se Vive Uma Vez Guitarras de Edgard Scandurra
Questão de Ordem Encerra o disco de 'baladas'