Lenine e o holandês Martin Fondse lançam DVD do projeto 'The Bridge'

Os dois músicos foram apresentados um ao outro por um amigo em comum, Wim Westerveld

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Por Adriana Del Ré
Atualização:

O processo musical de Lenine não se dá apenas solitariamente. Ele é feito também de encontros - às vezes, por pura afinidade; em outras, por gratas surpresas. E foi assim, fruto do acaso, que o músico brasileiro e o maestro holandês Martin Fondse, também compositor, arranjador e pianista, se uniram no projeto The Bridge (a ponte, em português). Com repertório de canções de Lenine que ganharam arranjos de Fondse, para ser executadas com sua orquestra, a Martin Fondse Orchestra, o show rodou o Brasil e o exterior nos últimos três anos. Em Bimhuis, importante casa de jazz de Amsterdã, Lenine, Martin e orquestra fizeram o registro da apresentação, que acaba de lançado em CD e DVD, Lenine & Martin Fondse Orchestra - The Bridge Live At Bimhuis.  Os dois músicos foram apresentados um ao outro por um amigo em comum, Wim Westerveld, diretor do festival Music Meeting, realizado na cidade holandesa de Nijmegen. Poucos minutos de conversa depois, Lenine e Martin já sabiam que precisavam fazer um projeto juntos. Lenine ainda não conhecia o trabalho de Martin. Mas Martin já. Ele foi apresentado às músicas de Lenine pela família que tem no Brasil. “Elas chamaram minha atenção imediatamente. Pouco tempo depois, eu vi um show ao vivo em Atibaia (SP) e era fã”, conta Martin, ao Estado (leia entrevista com o maestro holandês abaixo).

E por que a conexão entre os dois foi tão rápida? “Tenho impressão que, num primeiro momento, o Wim percebeu que a gente tinha uma percepção de música parecida e foi um grande acerto, porque, em 15 minutos de conversa, parecia que estávamos há muitos anos dialogando”, avalia Lenine. “Isso foi incrível, a delicadeza com que ele decupou a minha música a ponto de ser fiel às gravações originais, mas com um outro tipo de sonoridade, de relevo sonoro, mais acústico.”

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No total, o projeto reúne 17 músicas, como A Rede, Chão, O Dia Em Que Faremos Contato, Jack Soul Brasileiro, Paciência, entre outras. A instrumental Mauricio de Nassau Bridge, de Martin Fondse, faz uma abertura eloquente para um repertório bem familiar de Lenine, mas com novas roupagens. “Percebi de imediato que o Martin tinha compreendido o universo em que eu transito, a ponto de saber que as minhas escolhas das canções que compõem o repertório seriam aquelas que tivessem mais estímulos para ele aprofundar os arranjos”, diz Lenine. “Escolhi canções que se adequavam àquele universo sonoro da orquestra do Martin: é oboé, clarone, sax barítono. Então, tem uma timbragem aí que definiu muito as escolhas das canções e, como a gente estava muito distante, a referência que eles queriam das canções seriam as gravações originais. As escolhas foram em função da possibilidade de adaptação que cada uma delas poderia ter.” 

E várias pontes foram estabelecidas. A ponte que se cria entre os músicos daqui e de lá. A ponte entre o universo popular e o acadêmico. A ponte histórica entre Pernambuco, terra de Lenine, e Holanda, onde Martin nasceu, se lembrarmos da invasão holandesa em Olinda e no Recife no século 17. Aqui cabe também fazer analogia à ponte Mauricio de Nassau, no Recife, uma réplica da ponte sobre o Rio Amstel, em Amsterdã. Por isso, para eles, não havia nome mais apropriado para o projeto do que The Bridge. 

“Teve até um momento que eu quis evitar a obviedade desse título, mas ele corroborava tantas coisas e até pelo fato também de existir uma canção chamada Ponte, minha e do Lula Queiroga”, afirma Lenine. “Trata-se de uma ponte não só material, mas essa ponte mais lúdica, mais poética, de duas pessoas de países distintos, com histórias distintas terem chegado ao mesmo tipo de resolução sonora.” 

Lenine e Martin não pensam em retomar a turnê. No caso deles, esse registro, feito em parecia com o Canal Brasil, finaliza um ciclo. Vira um arquivo documental, histórico. Os dois planejam outros projetos juntos, como o de levar outro repertório para esse universo acadêmico, com orquestras maiores. Lenine segue ainda com sua turnê Carbono por mais um ano. “Continuo compondo, mas com Carbono encerro um ciclo que iniciei com Labiata, depois retomei com Chão. Antes, quando tinha desejo de fazer um disco, eu já tinha mais da metade de um álbum composto. Fazendo uma analogia com a literatura, isso me dava uma sensação de estar fazendo sempre uma coletânea de contos. E passei a perseguir o romance, desde Labiata: escolhia um título, uma ambiência sonora e só então ia atrás de fazer as composições, como capítulos de um romance. Tenho impressão que estou livre desse ciclo”, diz. “Não sei se agora vou fazer um livro de poesias, uma coletânea de contos, uma ficção científica, que eu adoro. Me sinto agora liberto para fazer outra coisa.”ENTREVISTA Martin Fondse - Arranjador e maestro - 'Conexão: hoje mais importante do que nunca'

Qual o desafio de fazer arranjos para as canções de Lenine?

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Combinar o som da minha orquestra com a voz e o violão de Lenine. Encontrar uma maneira que pudéssemos tocar o que quiséssemos e, ao mesmo tempo, soando fresco e novo.

Há quanto tempo você e Lenine estão envolvidos no projeto?

The Bridge durou por 3,5 anos. Pedi a Lenine que integrasse a primeira parte desse projeto em 2013 para o Music Meeting Nijmegen, um festival de renome na Europa. Não poderíamos prever que duraria tanto tempo. Mas, com amor pela música sem fronteiras, trilhou seu caminho durante esses anos facilmente!

Por que vocês escolheram o nome The Bridge (A Ponte)?

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Nós dois nascemos em uma ilha. Precisávamos de uma ponte para chegar mais longe em nossas vidas. Precisávamos dessa ponte para encontrar novas pessoas e novas fronteiras para remover. E, claro, a influência holandesa no Nordeste do Brasil ainda é visível: a ponte Mauricio de Nassau no Recife é uma cópia de uma ponte em Amsterdam.

Você conhece o trabalho de outros compositores brasileiros? Milton, Villa-Lobos, Clube da Esquina são famosos na Europa. Esses músicos brilhantes fizeram uma conexão pessoal com influências europeias, africanas e indígenas tão originais que ainda são vitais hoje. Esperamos continuar essa história de desenvolvimento musical com novos ramos nessa maravilhosa árvore universal! Conexão: hoje mais importante do que nunca! Nenhuma diferença jamais bloqueará nossas semelhanças mútuas! Todos somos iguais.