Juntos, Maria Bethânia e Zeca Pagodinho cantam seus clássicos

Dupla faz uma série de shows em que apresenta, ainda, músicas de Chico Buarque e uma composição inédita de Caetano Veloso feita especialmente para o encontro entre os dois artistas

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Por Roberta Pennafort
Atualização:

O samba nasceu no Rio ou na Bahia? “Ai amor amor amaro/ Ai cheirinho de Xerém/ Ai amor – paro/ Ai amor – vem”, o singelo refrão de Amaro Xerém, amarra poeticamente o inusitado encontro musical e afetivo da baiana Maria Bethânia e do carioca Zeca Pagodinho sem responder à inútil pergunta. 

Há quatro décadas, Maria Bethânia e Zeca Pagodinho seadmiram Foto: Marcos Arcoverde

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De Caetano Veloso, a composição que traça a ponte entre a cidade do Recôncavo onde nasceram os Velosos e o distrito da Baixada Fluminense no qual Zeca fez morada, foi criada especialmente para a série de shows De Santo Amaro a Xerém, que os dois iniciam sábado, 7, no Recife – em seguida, a dupla canta em Salvador (dia 14), Rio (21), Belo Horizonte (5/5), São Paulo (18/5) e Brasília (30/5). 

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No repertório, clássicos da trajetória artística dela (Ronda, Negue, Reconvexo), da dele (Verdade, Não Sou Mais Disso, Vai Vadiar), da Mangueira e da Portela, as escolas de samba de devoção de cada um. A dupla também recria Diz Que Fui por Aí, Desde Que o Samba É Samba, Naquela Mesa, Sonho Meu. A banda do show é uma mistura das que acompanham os dois. Ontem, os cantores, que estreitaram laços quando da participação dela no DVD Quintal do Pagodinho 3, em 2016, conversaram com o Estado, entre ensaios, afagos e crises de riso.

Como é fazer show em dupla?  MB: Conheci Zeca e o trabalho dele há muitos anos, mas cantar juntos foi só no Quintal. Estar perto dele é uma delícia. Tem um humor infernal, e tem muita decisão. Eu demoro, ele diz logo o que quer. Isso tem me ajudado, é um aprendizado bom. Como cantora, é uma escola linda ouvi-lo, ver as ideias dele, como ele emite. Sou fã. Estou aprendendo.  ZP: Ao mesmo tempo em que tô muito feliz, tô meio assim... Tô com a rainha, né? MB: Ah, esse papo de rainha... Não acredito!

Fica intimidado, Zeca?  ZP: Como é que vou entrar no palco com Maria Bethânia? Acho que vou entrar de costas, com vergonha. Vamos ver... Mas ela me tranquiliza, fala ‘calma, vamos nos divertir’...  MB: É, a ideia é fazer um show para a gente se divertir. A gente trabalha muito. Que a gente brinque, ache graça. Lógico que com seriedade, o devido respeito. Não é nossa história, não somos um dueto, então depois segue ele com o trabalho dele, eu, com o meu. Eu baladeira, ele, sambista, como gostam de definir. Esse encontro é adorável. ZP: Eu já aprendi tudo com ela, com Gil, Caetano, a Velha Guarda da Portela...

Como se conheceram?  MB: Do primeiro contato ele não lembra, mas eu lembro. Foi a (atriz falecida) Thereza Aragão que me apresentou. Ela disse: ‘Olha esse rapaz, é um espetáculo cantando’.  ZP: Onde foi, hein?  MB: Já te falei, foi lá na Funarte. Thereza trouxe a Velha Guarda de cada escola para se apresentar. E tinha um espetáculo no Opinião, quando eu fazia o Opinião, que se chamava A Fina Flor do Samba, às segundas, que era nossa folga, com Cartola e outros mais. Thereza conhecia absolutamente todos. Ela era mulher do (poeta Ferreira) Gullar, se separou dele e casou com um passista.  ZP: Esses caras de escola de samba são fogo!

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Zeca, o samba de roda da Bahia chegava ao subúrbio quando você era garoto?  ZP: Chegava, pelo rádio, ouvia-se muito rádio. E eu via muito programa de TV. Na minha casa, aos domingos, sempre tinha cantoria, meu tio tocava violão, flauta, os vizinhos iam. Depois, o meu primeiro sucesso grande foi com samba de roda, Samba pras Moças, do (baiano) Roque Ferreira. Acho que a primeira música que ouvi na voz da Bethânia foi Carcará, que gravei agora com o Gil.  MB: Roque, para mim, é ‘o’ compositor. Zeca sabe tudo, conhece demais. Ele não ouvia só samba, absolutamente, tem uma formação do cancioneiro brasileiro impressionante.  ZP: Lá em casa eu escutava muito choro, valsa, seresta.

Quem escolheu 'Chão de Estrelas' para o show?  MB: Os dois somos fãs de Silvio Caldas, sou apaixonada. Decidimos tudo juntos, uma sugestão, depois outra. Vai ter Chico (Cotidiano), Done Ivone (Sonho Meu)...

Afinal, o samba nasceu no Rio ou na Bahia? Interessa saber?  ZP: O samba nasceu no mundo...  MB: Veio lá daquele pessoal lindo da África, que mexe bem. Tem a história de Tia Ciata, de Santo Amaro, do Recôncavo, onde ela viveu, e a história dela aqui no Rio, como levantou o samba aqui... Vinicius (de Moraes) botou na letra (de Samba da Bênção), mas não há disputa. Zeca, Bethânia já foi a Xerém. 

Quando você vai a Santo Amaro?  ZP: Eu vou, é minha vez.  MB: Ele há de visitar em fevereiro, ver Nossa Senhora da Purificação. Vamos agradecer na festa dela, fazer um samba de roda no quintal de minha mãe, com Roque querido.

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Qual o parentesco entre o samba de roda e o partido-alto? ZP: Pergunta pro Paulão 7 cordas! (violão e direção musical do show).  MB: Essa coisa do improviso é mais comum no pagode, Zeca?  ZP: No meu tempo, era quando já tinham cantado tudo na roda, quando era para terminar, aí improvisavam.

Como lidam com as diferenças de personalidade? ZP: A gente é igual!  MB: A gente é parecidíssimo, interiorano, ele é muito família, eu também. Ele não está nos badalos, está sempre trabalhando, como eu.  ZP: É, agora estou quieto.  MB: Isso é recente, é, Zeca?

Como Mangueira e Portela entram no show?  MB: Sempre cantei samba, do meu jeito baiano. Vou fazer refrãos de sambas de enredo sobre Caymmi, Chico, Braguinha, Doces Bárbaros. (Zeca vai cantar ‘Foi Um Rio Que Passou em Minha Vida’, ‘Portela na Avenida’, entre outros tributos à sua escola.)

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E 'Carcará'?  MB: Se você gravou, podia cantar no show!  ZP: Está vendo o que você arrumou?  MB: Toda hora que eu falo ‘vamos botar essa no show’, ele corre!

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