Dois mundos em dobradinha no Municipal

Montagem das óperas 'Cavalleria Rusticana' e 'Pagliacci' apostam em linguagens cênicas distintas

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Por João Luiz Sampaio
Atualização:
Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão

Avaliação: Bom

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Crítica: Montagem tem na regência de Ira Levin o seu ponto alto

Há um risco duplo em óperas como Cavalleria Rusticana e Pagliacci, pertencentes ao movimento verista, que no final do século 19 levou ao palco histórias de corte mais realista. De um lado, transformá-las em narrativas derramadas, com emoções gotejantes; de outro, apostar em interpretações ascéticas que tendem a fazer dessas obras algo que elas não são, deixando de lado a força emocional, na proposta de combinação de texto e música, que está na gênese de ambas.

Na montagem das óperas apresentada sábado no Teatro Municipal, no entanto, o maestro Ira Levin conseguiu, com a Sinfônica Municipal de São Paulo, um equilíbrio precioso. Pode-se destacar passagens específicas – a grande cena coral ou a ária final de Turiddu, na Cavalleria, ou a recapitulação dos principais temas de Pagliacci, que Leoncavallo usa em profusão na cena final da obra. Mas, mais importante, é anotar a regência atenta às filigranas e a um discurso narrativo fluido e teatral.

O mesmo senso de estilo pode ser encontrado, na Cavalleria, no canto da meio-soprano Tuija Knihtlä (Santuzza), ou nas atuações de Luciana Bueno (Lola) e Lídia Schäffer (Mama Lucia). A elas, no entanto, somou-se o desempenho pouco inspirado de Alberto Gazale, como Alfio, e de Giancarlo Monsalve, como Turiddu, em especial por conta da aposta indistinta em velhos cacoetes de certo canto verista.

No Pagliacci, porém, dois cantores experimentados e musicais – o tenor Walter Fraccaro e a soprano Inva Mula – souberam dar personalidades próprias a suas personagens, o palhaço Canio e a jovem Nedda. Aqui, como Tonio, Gazale teve desempenho melhor, apesar de um Prólogo bastante irregular, abrindo espaço para que outro barítono se destacasse: Davide Luciano, no papel de Silvio.

A Cavalleria do diretor Pier Francesco Maestrini, nesse retorno ao palco (ela estreou no ano passado), parece se sustentar apenas pela cenografia de Juan Guillermo Nova e o modo como constrói, com naturalismo, a paisagem siciliana. Já no Pagliacci, William Pereira ambienta a história em um contâiner utilizado pela trupe teatral. O diretor joga com diversos aspectos da obra – o vídeo em tempo real que evoca o teatro dentro do teatro ou a cena do pastor evangélico, com a qual estabelece um diálogo com a religiosidade saturada da Cavalleria. O grande trunfo de seu trabalho, porém, está na direção de atores e na movimentação dos grupos corais, que tiveram bom desempenho vocal em ambas as óperas: o Coral Lírico e os coros adulto e infantojuvenil da Escola Municipal de Música.

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