De volta, o som pioneiro de Bill Withers

Um filme, regravações constantes, versões para hip hop e novos parceiros trazem à tona o cantor e compositor

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Por Fred Leal
Atualização:

"Eu sou apenas um velho sem rumo, andando em círculos por aí", diz Bill Withers ao telefone. "Estou velho demais. Parei de tocar há uns 25 anos." Se ‘tocar’ significa apenas fazer shows ou lançar álbuns, sim, Withers não toca há quase 25 anos - 1985 é o ano de seu último disco, Watching You, Watching Me. Mas é só uma meia verdade: ainda em 2009, o compositor de Ain’t No Sunshine cedeu ao CD Songs and Stories, de George Benson, o belo dueto A Telephone Call Away, e em 2004, dividiu vocais com Jimmy Buffett na canção Playing the Loser Again.

 

 

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O sucesso de Ain’t No Sunshine nas versões de Michael Jackson e, mais recentemente, do duo britânico Lighthouse Family (na trilha sonora do filme Um Lugar Chamado Notting Hill) ainda precede a reputação de Bill Withers no Brasil. Mais que um compositor de um sucesso só, o ex-marinheiro emplacou hits que vão do soul acústico de Grandma’s Hands (regravada por Gil Scott-Heron) ao funk mais descarado, cravando seu lugar no topo da lista de grandes nomes subestimados do cancioneiro norte-americano.

 

Fazendo o circuito de festivais de cinema desde o ano passado, o documentário Still Bill teve lançamento oficial nos Estados Unidos em janeiro. Carregando o mesmo nome do segundo disco de Bill Withers (de 1972), detentor de sucessos como Use Me e a balada Lean on Me, o filme já se encontra em pré-venda no site oficial, com entrega prevista para o meio do ano.

 

Gravado durante as preparações para um show-tributo em Nova York, Still Bill acompanha o Bill Withers de hoje, um senhor de 71 anos, ao mesmo tempo em que retrata a história do artista que garantiu diversos hinos à música negra dos anos 70. "Eles iam fazer um show no Brooklyn, e a coisa foi crescendo, e crescendo, e eles me seguiam para todos os lados. Não foi algo que eu planejei, eles só continuaram me seguindo", explicou Bill.

 

Bill Withers ainda se mantém em evidência através dos produtores de música pop e hip hop. Seus grooves se tornaram uma mina de ouro para samples, dando origem a canções de Kanye West, 2pac e Will Smith. O conjunto de R&B Blackstreet viu seu maior sucesso, No Diggity, acontecer sobre uma base extraída de Grandma’s Hands. O cantor não nega sua admiração: "Eu acho uma coisa fascinante, quando eles mexem com a música desse jeito. É muito inteligente. Eu não acho que seria capaz de fazê-lo, e costumo julgar as coisas pelo que sei ou não fazer. É muito criativo."

 

Para a trilha sonora do filme Hoot, de 2006, o Maroon 5 regravou Lovely Day com a luxuosa participação do próprio Bill Withers nos backing vocals. Lean on Me - uma das mais belas canções sobre amizade já escritas - foi reinterpretada por Sheryl Crow, Keith Urban e Kid Rock para o álbum Hope for Haiti Now, em prol das vítimas da tragédia no país.

 

Com poucos discos lançados por aqui, o mais perto que Bill Withers chegou do Brasil foi na construção de uma breve amizade com Gilberto Gil durante o festival Midem, na França. "Eu nunca pude tocar muito bem, só toco um pouco para acompanhar minha voz. Não posso tocar como Gilberto Gil, alguém que pode simplesmente chegar e tocar." E depois de perguntar sobre como anda nosso ex-ministro, completou: "Eu gosto do Gil, ele é um homem muito inteligente."

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"Eu me apaixonei pela música brasileira no Midem. Tinha um grupo de músicos brasileiros que ficavam tocando nos corredores, enquanto esperavam pela hora do show. Eu acabei não conseguindo ver os shows, mas aproveitei a música nos corredores", contou Withers. "Foi através da música brasileira que eu passei a gostar do acordeão, eu nunca tinha ouvido uma música no acordeão que eu gostasse até ouvir a música brasileira." E antes de ser perguntado sobre a versão de Ain’t No Sunshine executada pelo brasileiro Sivuca, emendou: "Também, com grandes músicos como o Sivuca... Ele é um gênio, eu não conseguia acreditar quando vi o Sivuca tocando, ele podia tocar qualquer coisa!"

 

A voz de Bill Withers ainda deve ser ouvida este ano, por meio do cantor americano de origem argentina Raul Midón. A canção é a primeira de Withers em espanhol, e segundo o compositor, "algo que já queria fazer havia bastante tempo". Talvez não seja a única: conversando com a esposa do cantor, Marcia Johnson, foi revelado um talento nato de Withers para responder e-mails. "Ele adora", disse ela, contando que o marido passa bastante tempo escrevendo no computador. Confrontado com a inevitável pergunta sobre o que anda escrevendo, Bill foi enigmático: "Você faz coisas diferentes em momentos diferentes na sua vida. Eu gostaria de escrever mais, provavelmente tenho coisas que flutuam pela minha cabeça que eu deveria terminar, então estou tentando resolver isso tudo... Sabe, você não percebe, e um dia olha para trás e vê que está com 70 anos e pensa ‘cara, como foi que eu cheguei aqui?’"

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