Tradutora de 'Grande Sertão: Veredas' para o inglês consegue apoio financeiro

Alison Entrekin estava em busca de financiamento para seu ambicioso projeto de verter a obra-prima de Guimarães Rosa

PUBLICIDADE

Por Guilherme Sobota
Atualização:

A saga da tradutora Alison Entrekin – australiana radicada em Santos – para verter ao inglês e publicar Grande Sertão: Veredas atinge agora um novo patamar: o Itaú Cultural vai anunciar o patrocínio do projeto por três anos. Uma das tradutoras mais populares quando o assunto é literatura brasileira contemporânea em inglês – ela já trabalhou com obras de Paulo Lins, Cristovão Tezza e Clarice Lispector –, ela estava há mais de um ano buscando apoio financeiro para a empreitada, nada fácil levando em conta a densidade e a riqueza do texto.

PUBLICIDADE

Duas editoras já manifestaram interesse: a Alfred A. Knopf, de Nova York (que publicou uma contestada tradução do livro, em 1963), e a Harvill Secker, de Londres, do grupo Penguin Random House. “Quero que o leitor do inglês seja seduzido pelas palavras e que consiga projetar um livro imaginário, porque a transposição regional é uma das impossibilidades da tradução”, explica Alison – o livro se passa num sertão meio real (entre Minas Gerais e Bahia), meio imaginado. “A salvação da pátria é o neologismo. O brasileiro lê e não sabe bem se as palavras e expressões são coisas reais ou se foram criações. Vou tentar recriar esse enigma em inglês.”

O anúncio do apoio – que envolve outras contrapartidas da tradutora, que envolve atividades e outros conteúdos – será feito nesta quarta-feira, 9, na primeira mesa do seminário Conexões – que ocorre este ano ao mesmo tempo em que o Encontros de Interrogação. Os dois eventos, que vão até o dia 11 na sede do Itaú Cultural (Av. Paulista, 149), têm mesas e painéis que vão discutir literatura contemporânea, suas relações com a política e com o momento atual do Brasil, tradução e estética (veja a programação abaixo). Alison divulgou em julho um primeiro estudo da tradução – que ela assegura que ainda vai ser modificado.

Australiana. Traduções de obras de Clarice, Tezza e outros Foto: Roberta Laas/Divulgação

UM ENSAIO DA TRADUÇÃO O original

"- Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser - se viu -; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram - era o demo. Povo prascóvio. Mataram."

Em inglês

"- Nonought. Shots you heard weren’t a shootout, God be. I was training sights on trees in the backyard, at the bottom of the creek. Keeps my aim good. Do it every day, I enjoy it; have since the tendrest age. Anyhow, folks came a calling. Bout a calf: white one, strayling, eyes like no thing ever seen and a dog’s mask. They told me; I didn’t want to see. Seems it was defective from birth, lips curled back, and looked to be laughing, person-like. Human face, hound face: they decided-it was the devil. Oafenine bunch. They killed it."

Publicidade

PROGRAMAÇÃO

CONEXÕES

9 de novembro

Sala Vermelha - 16h

Mesa 1: A Tradução de Grande Serão: Veredas

O tradutor pode ser considerado um leitor muito privilegiado. Cada tradução é uma nova leitura, que enriquece e lança luzes sobre a obra traduzida. Em alguns casos, a complexidade de um livro impõe uma reflexão sobre a própria tradução. É o caso de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa.

Com Alison Entrekin, Berthold Zilly e Sandra Vasconcellos. Mediação: Felipe Lindoso

Publicidade

10 de novembro

Mesa 2: A literatura de Luiz Ruffato no exterior

Sala Vermelha - 16h

Luiz Ruffato é um dos escritores brasileiros com mais espaço no cenário internacional.Traduções de seus livros em vários países e sua agenda em feiras e universidades atestam a sua contribuição para a circulação da literatura brasileira fora do país. Mas como se dá a leitura e o ensino de sua obra no exterior?

Com Luiz Ruffato, Michael Kegler e Nelson Vieira. Mediação: Rita Palmeira

11 de novembro

Mesa 3: O impacto da história recentíssima do Brasil nas aulas de cultura e literatura brasileiras

Publicidade

Sala Vermelha - 16h

As manifestações de junho de 2013 em todo o Brasil representaram um autêntico divisor de águas, muito embora as interpretações sobre seu significado são divergentes. Desde então, o político, em sua acepção ampla, ganhou uma nova dimensão não apenas no cotidiano brasileiro, mas também nas artes e na literatura. Qual o impacto desse presente imediato nas salas de aulas no exterior?

Com Lucia Tennina e Nelson Vieira. Mediação: João Cezar de Castro Rocha.

ENCONTROS DE INTERROGAÇÃO

PROGRAMAÇÃO

9 de novembro

Sala Itaú Cultural - 18h

Publicidade

Mesa 1: Autoria ou crítica: qual a política do texto hoje?

A relação entre escrita, função autoral e crítica vem sofrendo transformações influenciadas pelo suporte digital e pelo contexto de possibilidade democrática em que emerge uma noção de direito à escrita, cuja prática vai redimensionando o próprio papel do cânone literário tradicional. Existe uma política do texto, no texto?

Com: Ítalo Moriconi, Ricardo Lísias e Paloma Vidal. Mediação: Ieda Magri.

20h

Mesa 2: Como a forma se torna conteúdo político?

O poeta russo Vladimir Maiakovski afirmou que “não existe conteúdo revolucionário sem forma revolucionária”. No entanto é muito comum associar o valor político de um texto ao seu tema ou conteúdo, ao invés de perceber o desempenho formal.Passado o tempo das vanguardas, como a forma literária pode ser revolucionária em nossos dias?

Com José Luiz Passos, Fernando Paixão e Beatriz Bracher. Mediação: Josélia Aguiar.

Publicidade

Dia 10 de novembro

Sala Itaú Cultural - 18h

Mesa 3: Quais são as outras línguas da literatura?

A experiência da literatura no Brasil não está restrita às formas cultas. Ela pode se constituir também pela interceptação e alteração do idioma oficial por formas e maneiras vindas de outras línguas, de outros usos ou, ainda, emergir de contextos antes invisibilizados e em novos territórios.

Com Douglas Diegues, Kaká Werá e Jarid Arraes. Mediação: Sérgio Cohn.

20h

Mesa 4: O projeto literário implica uma escolha política?

Publicidade

Frente aos conflitos e transformações que a sociedade continuamente nos coloca, o escritor tem como se furtar a lidar com eles? Poderíamos dizer que suas escolhas literárias, os temas que os preocupam, surgem daí? Por quais processos passam suas ideias antes mesmo da escrita? Haveria uma intenção política no que você escreve?

Com Maria José Silveira, Ana Maria Gonçalves, Alberto Mussa. Mediação: Roberto Taddei.

11 de novembro

Sala Itaú Cultural - 18h

Mesa 5: Quais as interações possíveis entre literatura e política?

Diz-se que um autor abraça a política quando escreve de maneira posicionada, ou seja, inspirada em certos princípios. Mas engajamento e tema social são apenas uma parte da questão; há também as conexões sutis presentes na própria noção de literatura ou no estilo. Então: quais são as interações possíveis?

Com: Sheyla Smanioto, Márcio Souza e Ricardo Aleixo. Mediação: Noemi Jaffe.

Publicidade

20h

Mesa 6: Política das letras e política das imagens: distâncias ou convergências?

Uma visita a qualquer grande evento de arte contemporânea deixa claro que as artes visuais passaram, ao longo dos últimos anos, por uma virada política. Embora a política, em suas muitas dimensões, nunca tenha deixado de ser um tema para a literatura, nada de comparável, como tendência coletiva, se verifica entre prosadores e poetas. Quais as razões dessa diferença?

Com Élida Tessler, Carlito Azevedo e Nuno Ramos. Mediação: Eduardo Sterzi.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.