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Morte de grandes autores marcou ano de pouco crescimento do mercado editorial

Crise traz de volta ao debate a lei do preço fixo do livro, mas ainda dá espaço ao surgimento de novas editoras; conflito entre gigantes marcou o cenário internacional

Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

Mais do que por grandes lançamentos, o ano de 2014 ficará para sempre marcado por despedidas. Foi um ano especialmente triste para a literatura, que perdeu, num único mês, em julho, João Ubaldo Ribeiro, Ariano Suassuna, Ivan Junqueira, Rubem Alves e Nadine Gordimer. Em abril, foi o colombiano Gabriel García Márquez. Em novembro, Manoel de Barros.

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A Academia Brasileira de Letras recebeu seus novos imortais: Antônio Torres, Zuenir Ventura, Ferreira Gullar e Evaldo Cabral de Mello. Também imortal, o africanista Alberto da Costa e Silva recebeu o Prêmio Camões, o mais importante da literatura lusófona. O ilustrador Roger Mello ganhou o Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da literatura infantil e juvenil. O escritor e crítico literário Silviano Santiago, o Prêmio José Donoso, e a poeta Adélia Prado, o canadense Griffin.

Não houve unanimidade nas premiações brasileiras e o destaque foi para Ana Luisa Escorel, que inscreveu seu romance de estreia, Anel de Vidro, na categoria de autores veteranos do Prêmio São Paulo e se tornou a primeira mulher a vencer na categoria principal. Destaque, também, para Laurentino Gomes que venceu pela terceira vez o Jabuti de livro do ano de não ficção por sua trilogia best-seller sobre a história do Brasil. E para a criação do Prêmio Saraiva de Música e Literatura – para trabalhos originais.

Variedade. Mercado editorial teve diversas mudanças e Vale Cultura animou livreiros e público Foto: FELIPE RAU/ESTADÃO

O mercado editorial foi surpreendido por algumas notícias. A aquisição da Santillana pelo Grupo Penguin Random House refletiu no Brasil com a fusão da Companhia das Letras e Objetiva/Alfaguara. O Grupo Sextante comprou 50% da gaúcha L&PM. A Amazon começou a vender livros físicos no País, lançou seu serviço de aluguel de e-books sem o apoio de grandes editoras e lidera o comércio de livros digitais por aqui, que ainda é pequeno, mas vem crescendo. Segundo a pesquisa Produção e Venda do Setor Editorial, feita pela Fipe e anunciada este ano, o faturamento das editoras com o e-book saltou de R$ 3,8 milhões em 2012 para R$ 12,7 milhões em 2013 – um indício de que 2014 verá números ainda maiores. Pensando nisso, a Saraiva lançou o Lev, seu e-reader.

Mesmo com esses números, este foi, mais uma vez, um ano sem crescimento. Essa crise, a ameaça da Amazon, que chegou com tudo praticando preços que o mercado não consegue acompanhar, e a relação desigual mantida entre editoras e grandes redes de livrarias e entre editoras e livreiros independentes, levou de volta a lei do preço fixo do livro ao debate.

O cenário, no entanto, não impediu que novas editoras surgissem em 2014. Dois destaques: a Poetisa, que vai dar prioridade a boas traduções, e a Mundaréu, que se dedicará, por ora, a livros de história, filosofia e ficção alemã.

Independentes. Na cena independente, a editora Lote 42 comprou uma banca de jornal no bairro de Santa Cecília para vender seus livros e de outras editoras e artistas. E a Feira Plana se consolidou como importante ponto de venda e de encontro.

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Na área de livros usados, a briga foi entre os sebos e a Estante Virtual, com boicotes e abaixo-assinado. E agora, nos últimos dias do ano, o portal que reúne o acervo de quase todos os sebos do País anunciou que começaria a vender livros novos.

Aspirantes a escritor tiveram mais incentivos para tirar o livro da gaveta com o crescimento da autopublicação e por iniciativas como a da Casa das Rosas, que criou um curso para formação de escritores, inclusive para adolescentes.

O público jovem, aliás, lotou a Bienal do Livro atrás de seus ídolos, levou histeria e tumulto aos corredores do Anhembi e movimentou, durante todo o ano, a lista de mais vendidos. E de olho nesse leitor compulsivo editoras criaram selos, incrementaram a presença nas redes sociais e publicaram muito.

A política do livro saiu da Fundação Biblioteca Nacional, no Rio, e voltou a Brasília. Lá, uma audiência pública debateu o conceito de livro – que deve mudar para incluir os e-books e, com isso, isentá-los de imposto. Existe o lobby para que o e-reader também seja considerado um livro, mas a ideia não agradou – exceção seria feita para aparelhos produzidos aqui, mas todos vêm da China. A lei das biografias avançou e recuou, mas houve uma vitória: Sinfonia Minas Gerais – A Vida e a Literatura, de João Guimarães Rosa, fora das livrarias desde 2008 por processos movidos pela família do autor, foi liberada.

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O Brasil passou discreto pela Feira do Livro de Frankfurt um ano após ter sido o convidado de honra e fez bonito na Feira do Livro Infantil de Bolonha, onde foi homenageado. São Paulo, cidade convidada da Feira do Livro de Buenos Aires, passou bem pelo evento portenho.

Centenários como o de Julio Cortázar, Bioy Casares e da Primeira Guerra Mundial e ainda os 50 anos do Golpe Militar motivaram o lançamento de dezenas de livros. Em São Paulo, uma caneta que pertencia a Graciliano Ramos foi furtada antes da abertura de exposição dedicada ao autor, no Museu da Imagem e do Som. Em Porto Alegre, vida e obra de Moacyr Scliar foram contadas na mostra O Centauro do Bom Fim. E Belo Horizonte expôs cartas de Carlos Drummond de Andrade na exposição Quase Poema.

O Vale Cultura levou novo ânimo e consumidores para as livrarias – e editores e livreiros seguem na torcida para que ele seja usado em massa para a compra de livros. E o brasileiro, por sua vez, torce para que iniciativas como a da escritora Patrícia Engel Secco de simplificar obras de autores clássicos, como Machado de Assis, autorizada pelo Ministério da Cultura a captar R$ 1,5 milhão e que tanta polêmica causou este ano, não se repitam. 

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DESTAQUES

Roger Mello 

Primeiro ilustrador brasileiro a ganhar o Hans Christian Andersen 

‘Coleção Gregório de Matos – Poemas Atribuídos’ 

Organizada por João Andersen e Marcello Moreira (Autêntica)

‘Poesia Total’

Reunião de obra de Wally Salomão (Companhia das Letras)

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‘Grande Sertão: Veredas’

Adaptado para HQ por Eloar Guazelli e Rodrigo Rosa (Globo)

‘Graça Infinita’ 

de David Foster Wallace, ganha primeira tradução no País (Companhia das Letras) 

Manoel de Barros

Obra do poeta é transferida para o catálogo da Alfaguara / M.F.R.

Livros biográficos na livraria da Villa da Alameda Lorena Foto: NILTON FUKUDA/ESTADÃO

Conflito entre gigantes marcou o mercado internacional

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por Guilherme Sobota

Outro fato muito importante que marcou o mercado editorial internacional em 2014 foi a briga da Amazon com as grandes editoras do Big Six, grupo que reúne as maiores casas editoriais do mundo – e a relação foi difícil especialmente com a francesa Hachette.

Em novembro, as duas empresas afirmaram ter chegado a um acordo depois de meses de negociações complicadas – a Amazon, maior loja online de livros e e-books do mundo, chegou a tirar exemplares da editora de suas prateleiras digitais, e a Hachette, apoiada por diversos grupos de autores, mantinha uma posição crítica em relação ao suposto monopólio da empresa de Jeff Bezos. O conglomerado francês de mídia que detém a Hachette disse em novembro que o acordo com a Amazon sobre preços do e-book não teria impacto sobre as margens e que esperava “aumento significativo” nas vendas – o comunicado não dava detalhes sobre a conclusão das negociações, mas deixava claro que a editora seria responsável por definir os preços finais dos livros.

O conflito (re)começou em maio, poucos meses depois de uma decisão da justiça americana ter julgado a Apple culpada por conspiração relacionada aos preços de sua loja de e-books entre 2009 e 2010. Quando o assunto é livros digitais, mesmo em 2014, todo mundo ainda pisa em ovos – e eles costumam ser mais frágeis quando o assunto é a Amazon. 

Sobre a empresa e o seu controverso CEO, a editora Intrínseca lançou este ano o interessante A Loja de Tudo: Jeff Bezos e a Era da Amazon, do jornalista Brad Stone, com tradução de Andrea Gottlieb. Eleito o livro de negócios do ano pelo Financial Times em 2013, ele recupera a história da empresa, cujo site entrou no ar em julho de 1995. Desde o início, é curioso notar que a obstinação de Jeff Bezos em fazer o melhor produto nem sempre é regida pelo lucro (pelo menos não o imediato). “À medida que sua fama (do site) se espalhava, a pequena equipe da Amazon percebeu quase imediatamente que havia aberto uma estranha janela para o comportamento humano”, diz o livro. Pois é. / G.S.

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