Lya Luft celebra 50 anos de carreira

Escritora gaúcha será homenageada no Festival Literário de Araxá

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Por Ubiratan Brasil
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A comemoração poderia ter sido no ano passado, quando se completaram cinco décadas da publicação de Canções de Limiar, pequeno livro poemas que marcou a estreia literária de Lya Luft. “Como fui cobrada pelos familiares, decidimos festejar agora”, conta a escritora, que será a principal homenageada na quarta edição do Fliaraxá, Festival Literário de Araxá, que começa no dia 26.

Com mais de 30 livros, entre contos, romances e reflexões, além de um valioso trabalho como tradutora, Lya garante que, nesse meio século literário, sempre teve os mesmos motivos. “Tudo que escrevo nasce de uma indagação, um questionamento. Qual é o foco da minha literatura? Acho que é isso. Um pouco querendo entender, mesmo sabendo que não se entende. Mais perguntas que respostas.”

A autora. Ela sempre se deixa refletir em seus livros, mesmo sem conseguir as respostas Foto: Marcelo Barabani/Estadão

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Movida por esse pensamento, Lya lançou em 2003 o seu maior sucesso, Perdas e Ganhos, obra que consumiu sete anos de trabalho e na qual oferece um testemunho pessoal sobre a vivência do amadurecimento. O livro nasceu a partir da série de palestras que ela faz pelo Brasil, em que trata de temas misteriosos como amor e desencontro, vida e morte, fatalidade e possibilidade de escolhas. O sucesso foi retumbante (frequentou a lista dos mais vendidos por 80 semanas) e Lya consolidou-se como referência na literatura nacional.

Depois de estrear com Canções de Limiar, ela voltou a publicar poemas com Flauta Doce (1972). Seis anos depois, reuniu os textos que publicava na imprensa em Matéria do Cotidiano. Lya não renega as obras iniciais, mas jamais se nomearia escritora apenas com aquele material. O ponto da virada ocorreu quando, no final da década de 1970, enviou alguns contos para Pedro Paulo Sena Madureira, então editor da Nova Fronteira. A resposta foi animadora: o material era “publicável”. Mas ele a aconselhou a escrever romances. Daí surgiu As Parceiras, lançado em 1980.

O processo, porém, foi tortuoso - ela o reescreveu inúmeras vezes, além de ficar indecisa entre três títulos. O livro, porém, foi bem recebido pela crítica, já tendo sido publicado na Alemanha. O mérito da obra é o clima sufocante da narrativa ao contar a história de Anelise, que procura no passado as razões de sua vida atormentada. Tensões familiares, traumas de infância, sequelas na vida adulta, tudo, enfim, conduz a um universo com temáticas perigosas. 

Lya é uma escritora disciplinada, que prefere escrever pela manhã. Não busca os assuntos, tampouco alimenta caderninhos de anotação, pois gosta de seguir fielmente sua intuição. Também se preocupa quando lhe falha a inspiração ou quando projetos pensados sofrem mudanças radicais.

Uma curiosidade sobre sua produção é o fato de seus romances sempre começarem em torno de um personagem que se destaca. “É verdade. Ficcionista é uma pessoa que está sempre pensando. Temos o que chamo de falsa vagabundagem lírica, ou seja, parecemos não fazer nada, assistimos à televisão sem prestar atenção, mas, na verdade, as coisas estão se fazendo dentro de mim, de forma meio vaga - é o que Freud dizia ser atenção flutuante. É como se criássemos os futuros personagens e os deixássemos presos em um varal até que, de repente, um se destacasse”, conta.

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Lya cita como um bom exemplo seu terceiro romance, Reunião de Família, publicado em 1982. “Eu havia escrito dois livros trágicos (As Parceiras e A Asa Esquerda do Anjo), com muitos personagens neuróticos. Pensei então em contar a história de uma mulher simples, típica dona de casa, com veias nas pernas, cozinheira para o marido e os filhos. Tudo seguia bem até que, dias depois, pensei: e se ela fosse uma falsa pacata dona de casa, e tivesse dentro de si um universo diabólico? Aí a trama ficou mais interessante e nasceu o romance.”

Em todos seus escritos, independentemente da forma com que se expressa, Lya Luft se dispõe a fazer o leitor pensar e propõe um combate à mediocridade a partir da reflexão. A incomunicabilidade é um tema que sempre lhe atraiu, mas, ironicamente, consegue, há 50 anos, lidar com isso de uma forma clara e totalmente compreensível.

Em Araxá, debate com Nélida Piñon e Miriam Leitão “Tenho uma ótima relação com Minas Gerais, onde meus leitores são muito generosos”, comenta Lya Luft que, mesmo avessa a grandes homenagens, aceitou participar do 4º Festival Literário de Araxá, a Fliaraxá, que começa no dia 26 e vai até 30 de agosto.

Lya vai figurar em três eventos. No primeiro, conversa sobre seus livros com uma amiga, a também escritora Nélida Piñon. Depois, entregará o Prêmio Fliaraxá aos vencedores de um concurso de redação entre alunos escolares. Finalmente, divide um debate ao lado de Miriam Leitão, no qual vão conversar sobre o tema Livros que Sonhei Fazer, referindo-se às obras infantis de cada uma.

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