Livro póstumo de Günter Grass critica política alemã na questão dos refugiados

Último livro de Nobel de literatura, morto em abril, chama atenção à incoerência da xenofobia e lança críticas à chanceler Angela Merkel

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Por Juliana Domingos de Lima
Atualização:

Um jovem social-democrata no pós Guerra, hoje amadurecido, talvez se encontre desgostoso com as diretrizes políticas da Alemanha contemporânea. Principalmente com relação ao tratamento dado aos refugiados em situação similar à que viveram tantos alemães durante a guerra. De além túmulo, através da publicação de seu último livro Vonne Endlichkait (“Sobre a Finitude”, ainda sem lançamento no Brasil), o escritor alemão Günther Grass adverte sobre a hostilidade direcionada aos estrangeiros em situação de vulnerabildade. Segundo o jornal britânico The Guardian, a obra póstuma do romancista e poeta ganhador do Nobel de Literatura foi publicada na última semana, a mesma em que ocorria no país um debate sobre considerar ou não refugiados dos Bálcãs e do norte da África na mesma “categoria” que refugiados “nativos” e que sucedeu uma série de ataques criminosos a abrigos destinados a estas pessoas.

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Sendo ele próprio um social-democrata ativo e crítico dos rumos definidos pela chanceler Angela Merkel, Grass morreu em abril deste ano sem perder o posto de “consciência moral” dos alemães, que abordou desde o sentimento de culpa recaído sobre a sociedade alemã após a Segunda Guerra Mundial até a questão Israel-Palestina.

A crise enfrentada pelo país com o influxo massivo de refugiados não é o único assunto atacado postumamente pela poesia e prosa de Grass, ilustradas no livro por seus próprios desenhos. No texto “Mutti” , Grass critica diretamente a chanceler, segundo ele, encurralada por lobistas sedentos de lucro que a chantageiam como uma máfia. O escritor critica também seu próprio partido por entrar em uma coalisão com os democratas cristãos de Merkel.

Para além das amarguras políticas, Vonne Endlichkait também é um livro sobre o envelhecimento e o confronto com a finitude enfrentados pelo escritor. Em um trecho do livro, o cachimbo, sua marca registrada, torna-se expoente da impotência de um homem na velhice. Grass diz andar com o objeto cheio de tabaco, metáfora do desejo que não deixa de existir, mas estar sem fósforos para acendê-lo. 

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