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Livretos em cordel abordam realidade do universo LGBT

Com mostra na Galeria Olido e distribuição gratuita de fanzines, projeto ‘Lampioa’ tem aparticipação de mais de 40 artistas

Por Celso Filho
Atualização:

A estética remete à arte popular brasileira, mas o assunto tratado, por vezes, é visto como um tabu no País. Em quatro fanzines, o projeto Lampioa aborda questões do universo LGBT no formato de literatura de cordel. Idealizada pelo designer João Zambom e pelo jornalista Bruno H. Castro, a publicação conta com textos e ilustrações de mais de 40 artistas - entre eles, Laerte Coutinho, Tom Zé, Ronaldo Fraga, Thiago Pethit e Arrigo Barnabé.

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Entre rimas e prosas, o preconceito, o amor proibido, a religião e os dilemas da identidade de gênero são alguns dos temas abordados. “E na escola... Brigar não brigava, nem jogava bola / Mamãe estranhou, papai não gostou! / Mamãe não gostou, e logo procurou um remédio”, escreve Arrigo Barnabé, em um texto sobre a vida de uma transexual.

A tradicional xilogravura nordestina também ganha ares mais sensuais, com figuras nuas e cenas de romance homoafetivo. Em uma série de quatro quadrinhos, por exemplo, a artista Cecília Silveira ilustra a história de um relacionamento amoroso entre duas mulheres. Já nos traços da cartunista Laerte Coutinho, o monólogo de um personagem homofóbico: “Você é uma bicha asquerosa. Me dá nojo / Mas não consigo controlar meu desejo por você / Morra”. 

Regional. Quadrinhos de Cecília Silveira fazem parte do projeto Foto: Divulgação

Também há espaço para interpretação de clássicos. É o caso da colaboração de Silvana Martins e Antônio Pádua, que analisa a obra Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa.

A ideia de Zambom e Castro é levar a realidade e dilemas dessa minoria a um público mais amplo, fora da comunidade LGBT. “Queríamos abrir um novo meio de comunicação sobre a causa para expandir a discussão para outros espaços e públicos. E foi justamente por isso que unimos o cordel com a fanzine e o universo LGBT”, explica Castro.

Pode até parecer, mas a escolha do nome não foi uma questão de ironia - mesmo com a polêmica biografia de Virgulino Ferreira, na qual o escritor Pedro de Morais questiona a orientação sexual de Lampião. Do famoso cangaceiro, a dupla se inspirou em sua faceta de anti-herói, marginalizado. “Queríamos feminizar o símbolo do ‘cabra-macho’. Essa é a essência do projeto. Lampioa não tem gênero. É aberta e mutável como todo ser humano”, afirma Zambom.

A partir desta ideia, a dupla começou a convidar os colaboradores - homossexuais ou não - para escrever de forma livre. “Propusemos para cada artista que pegasse o seu formato de fazer arte e interpretasse este universo LGBT por meio da literatura de cordel, do repente e da xilogravura. Cada um podia falar o que tinha vontade”, explica Castro.

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Quando as temáticas foram surgindo, o material foi dividido em quatro categorias. No livreto de capa vermelha, o amor é abordado. Já o amarelo diz respeito à sexualidade e suas diversidades. O verde é sobre os dilemas dessa minoria com a sociedade. Por fim, o de cor azul fala sobre questões do indivíduo, como a relação com o corpo para transgêneros.

Distribuição. Por enquanto, não há planos para o mercado editorial do projeto da dupla, contemplado em um edital do Programa de Ação Cultural (Proac) do Governo do Estado de São Paulo. Inicialmente, foram impressos quatro mil exemplares, mas eles planejam imprimir mais. São distribuídos gratuitamente e também estão disponíveis para download no site oficial. 

Um dos locais para encontrá-los é a Galeria Olido, no Centro, onde foi lançado oficialmente nesta semana. No espaço, até 30 de novembro, há uma mostra com as páginas dos livretos ampliadas em folhas A3 e dispostas em varais, como nos cordéis tradicionais. Também são expostas cerca de 25 obras originais que compõem a arte dos fanzines, além de lambe-lambes do projeto Microrroteiros da Cidade, da artista Laura Guimarães.

Além da Galeria Olido, o Lampioa também tem recebido convites para participar de eventos da comunidade LGBT. É o caso de uma parceria com o Festival Mix Brasil, que vai até o dia 23 de novembro na capital. Além da programação de música, teatro e cinema, o evento, que é considerado um dos principais sobre o universo gay, também irá distribuir os livretos. EXPOSIÇÃO LAMPIOAGaleria Olido. Hall do Centro de Dança Umberto da Silva. Av. São João, 473, tel. 3331-8399. 9 h/ 20 h. Grátis. Até 30/11.

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