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Ferreira Gullar é eleito para a Academia Brasileira de Letras

Maranhense vai ocupar o lugar do poeta e tradutor Ivan Junqueira

Por Felipe Werneck
Atualização:
Ferreira Gullar, de 84 anos, foi eleito nesta quinta-feira Foto: Estadão

Atualizado às 19h30 RIO - “A minha entrada para a academia é uma grande transgressão comigo mesmo”, disse nesta quinta-feira o poeta maranhense Ferreira Gullar, de 84 anos, após ser eleito para ocupar a cadeira 37 da Academia Brasileira de Letras (ABL), no Rio de Janeiro. O titular anterior da cadeira era o poeta e tradutor Ivan Junqueira, que morreu em 3 de julho deste ano. Gullar obteve 36 dos 37 votos possíveis - houve apenas um voto em branco. Dezenove acadêmicos votaram pessoalmente e 18 enviaram sua escolha por carta. A cerimônia de posse deve ocorrer até o fim deste ano. Após o resultado, o poeta recebeu amigos e acadêmicos na casa do integrante da ABL Antonio Carlos Secchin, na avenida Atlântica, em Copacabana, na zona sul. “Ninguém estava esperando (que eu entrasse para a ABL). Costumo dizer que o acaso na vida é uma coisa muito grande. A minha vida é um pouco assim. Eu não pensava sobre isso (entrar para a ABL). Quem fazia eu pensar era o (também acadêmico) Eduardo Portella. Ele vivia ligando para a minha casa, semana sim e a outra também. Foi muito bom eu ter entrado, inclusive porque vou substituir o Ivan, meu querido amigo, numa cadeira que foi ocupada pelo grande poeta João Cabral de Melo Neto. Então, para mim, é uma honra tudo isso”, declarou Gullar. Convidado há pelo menos 20 anos para ingressar na Academia, o poeta maranhense disse que começou a se sentir arrogante por dizer não. Portella disse que era apenas um grande torcedor para o ingresso de Gullar na ABL. “Ele demorou a se candidatar, mas essa demora foi como a de quem reabastece o tanque.” Para Portella, a ABL precisa de grandes nomes como o de Gullar para se legitimar. “Ele é o maior poeta brasileiro vivo, essa é a verdade.” O historiador e também acadêmico José Murilo de Carvalho brincou com o poeta dizendo que foi uma longa batalha convencê-lo a entrar. “Faz tempo que a Academia está tentando trazê-lo. Ele não está lá há mais tempo porque não quis, como se viu pela votação praticamente unânime. Ele engrandece a ABL. Acho que os bons candidatos para a academia são os que não precisam da academia.” Sobre o fato de um escritor considerado transgressor ingressar numa academia, Murilo disse: “As pessoas mudam. Faz parte da qualidade humana mudar de ideia”. O documentarista Silvio Tendler estava com sua equipe de filmagem na casa de Secchin gravando cenas para o documentário sobre Gullar que se chamará Há Muitas Noites na Noite. O filme vai abordar a vida do poeta e seu trabalho mais importante, o Poema Sujo, escrito em Buenos Aires durante seu exílio. Os ocupantes anteriores da cadeira 37 foram Silva Ramos (que escolheu como patrono o poeta Tomás Antônio Gonzaga), Alcântara Machado, Getúlio Vargas, Assis Chateaubriand e João Cabral de Melo Neto. “Foi uma votação muito generosa. Ele foi acolhido com muito carinho. Foi um ingresso auspicioso. Ele entra nessa casa com a sua poesia, o acolhemos com muita galhardia”, disse a escritora Nélida Piñon. José de Ribamar Ferreira, o Ferreira Gullar, nasceu em São Luís (MA), em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre. Descobriu a poesia moderna somente aos 19 anos, lendo Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Em 1951 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde trabalhou em jornais e revistas. Em 1954 publicou A Luta Corporal, livro que o lançou no cenário literário do País. Entrou para o Partido Comunista e passou a escrever poemas políticos e a participar da luta contra a ditadura militar em 1964. Foi preso na Vila Militar e, libertado, deixou clandestinamente o País em 1971 e foi para Moscou, Santigo, Lima e Buenos Aires. Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Depois voltou a trabalhar na imprensa e como roteirista de TV. Fundou o Teatro Opinião e escreveu peças com Oduvaldo Vianna Filho. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura.

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