Em papo divertido, vencedores do Man Booker Prize discutem humor e questões raciais na Flip

Marlon James e Paul Beatty protagonizaram um dos encontros mais esperados desta edição da Festa em Paraty

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Por Guilherme Sobota
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL / PARATY - Marlon James e Paul Beatty, os dois vencedores mais recentes do Man Booker Prize, fizeram a mesa principal deste sábado, 29, na Festa Literária Internacional de Paraty. A expectativa virou realidade quando os dois protagonizaram um debate interessante e cheio de humor.

A questão racial – tema central da Flip 2017 – também perpassou pela mesa, e Beatty, cujo O Vendido é um livro cômico sobre a história das relações raciais nos EUA, ofereceu o seguinte insight: “Sempre me perguntam se algum branco poderia escrever esse livro… Eu sou o único filho da p. vivo que poderia escrever aquele livro, então não entendo essa pergunta”.

Marlon James e Paul Beatty em encontro na Flip neste sábado, 29 Foto: Walter Craveiro/Divulgação

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“Alguém realmente escreveu uma versão politicamente correta de Huckleberry Finn”, citou como exemplo. “Um amigo escreveu um artigo defendendo, dizendo que era difícil explicar aos filhos por que a palavra ‘nigger’ estava lá. Eu acho que a graça é justamente explicar por que você ama esse livro apesar disso.” Para ele, as pessoas, especialmente nos EUA, ficam desconfortáveis com contradições, “mas ela está lá o tempo todo”.

O tema inicial da mesa era “o grande romance americano”. James apontou que American Tabloid, de James Ellroy, foi o que chegou mais perto, mas disse rejeitar a ideia. “Acho que é frustrante para os irlandeses que alguém já tenha escrito o grande romance irlandês”, comparou. Beatty, por outro lado, disse nem ter ouvido uma conversa sobre isso em pelo menos 15 anos.

A política de Donald Trump também foi tema na discussão. “É impossível ser divorciado do seu tempo”, disse Beatty, hesitante em se alongar no assunto. “Às vezes a batalha contra algumas coisas intervém no ‘tempo’ que as pessoas separam para a arte, mas não sei se isso necessariamente muda o jeito de as pessoas fazerem as coisas.” James concordou, e disse sempre desconfiar de “artistas numa missão. Porque geralmente eles fazem arte ruim”.

O escritor jamaicano está lançando no Brasil o romance Breve História de Sete Assassinatos, pela Intrínseca, uma viagem entre as décadas de 1970 e 1990, na Jamaica e nos EUA. Ele explicou que queria fazer uma novela policial curta, mas acabou escrevendo um livro de 700 páginas. “Eu fui no caminho contrário”, disse Beatty, que também comentou o humor em sua obra. “Algumas vezes as pessoas riem muito de um trecho em alguma leitura, às vezes não, e aí você pensa: ih, será que essa merda não é tão engraçada assim?”.