PRODUTOR E como tá a escolha do elenco pra peça?
DIRETOR Sensacional. Todo mundo escolhido já.
Entra no palco uma senhora chinesa com roupa de Saci e uma pera na mão.
DIRETOR Olha aí, esse é o nosso novo Saci-Pererê.
PRODUTOR Cadê?
DIRETOR Tá aí. Fala oi, dona Tanaka.
SACI Oi.
DIRETOR Decora rápido ela, precisa ver.
PRODUTOR Mas ela vai fazer o Saci?
DIRETOR Ótima ela, né?
PRODUTOR Mas o Saci é homem.
DIRETOR Então, teve um movimento feminista meio radical que questionou isso. Alegaram machismo. Uma mulher não é boa o suficiente para ser um Saci? Por que a mulher precisa ser subjugada sempre?
PRODUTOR Tá, mas de qualquer forma essa é só a primeira das minhas observações.
DIRETOR Bom, a gente procurou uma série de mulheres negras e uma comunidade afro um pouco mais radical questionou isso. Por que o Saci malandro tem que ser negro? Quando questionei sobre ser branco, eles reagiram dizendo que era muito perigoso ficarmos nessa ditadura do preto e branco. Fomos na China.
PRODUTOR E por que ela tem uma pera na mão?
DIRETOR Porque a Vara da Juventude questionou isso. Disse que um cachimbo seria má influência para as crianças e uma apologia ao tabaco. Uma fruta passaria uma mensagem melhor.
PRODUTOR Entendi. Mas é que aí descaracteriza um pouco.
DIRETOR Não sei se ajuda, mas ela também é judia.
PRODUTOR Bom, ela consegue pular numa perna só?
DIRETOR Ah, sim, agora o Saci tem as duas pernas, sendo uma delas mecânica, porque uma associação de amputados questionou isso. Por que ele precisa sofrer? Por que não mostrar um Saci forte e recuperado? Alegaram capacitismo.
PRODUTOR E não podia ser alguém mais jovem?
DIRETOR Um grupo do movimento da terceira idade questionou isso. Disse que a ditadura da juventude não pode prevalecer, que eles precisavam ter o seu espaço.
PRODUTOR Mas tem a d. Benta que já é idosa.
DIRETOR Então, a gente precisava falar sobre isso mesmo. (Chama) Entra, d. Benta!
Entra uma travesti.
DONA BENTA Cadê Pedrinho?