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Pílulas para ressaca

Para quem passou da conta, um pacotinho de historietas. Mal não há de fazer, espera o cronista

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Por Humberto Werneck
Atualização:

Eta mulherão, meu Deus! — grunhiu o Edvar quando por nós passou a Marília Gabriela, então no esplendor de sua gabrielice. 

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Era começo dos anos 80 e estávamos, um punhado de jornalistas, no intervalo de um show no Anhembi. A Gabi estava mesmo deslumbrante, mas não foi isso o que nos impressionou na exclamação do Edvar, e sim a ênfase que ele pôs na voz, inesperadamente rascante, testosterônica, com que registrou a passagem do mulherão. Ainda se fosse um homão... — pensamos todos, pois era por aí que iam as inclinações do nosso amigo. Caiu sobre a roda um instante de perplexidade antes que o Edvar acrescentasse, sem despregar os olhos das bamboleantes ancas da beldade:

— Deve ter cada irmão!

***

Ao “castelo” italiano daquela revista brasileira de celebridades não faltava uma sala de massagem, e tratou-se de inaugurá-la tão logo lá pousou a primeira leva de famosos. O fotógrafo já desembalava as câmeras quando os castelães se deram conta de que faltava alguma coisa, coisa essa nada irrelevante: massagista. 

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Fácil de resolver! – anunciou, prestimoso, um faz-tudo da produção. Habituado a prever tudo, ele guardara um exemplar do jornalzinho do vilarejo próximo, e na seção de anúncios pescou um telefone de massagista, imediatamente contratada. 

Pouco mais tarde, jazia sobre a mesa uma celebridade, já devidamente besuntada – mas a massagista, nada de pôr a mão na massa. Vamos lá! – impacientava-se a produtora, ante o olhar apalermado da criatura, que, pressionada, finalmente desnudou o equívoco: não sabia massagear. 

– Como não?!

– Io sonno una putana! – reagiu a ragazza, ofendida em seus brios profissionais.

***

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Esta quem contou foi o professor e político mineiro José Elias Murad, autor de um livrinho delicioso, Meus alunos, meus colegas e eu. O personagem é um cientista de suas relações, que um dia se embrenhou por experimentos para os quais necessitava de cobaias: sapos. Mais exatamente, do sexo masculino. 

Como não era o caso de chapinhar ele mesmo nalgum brejo, encarregou um funcionário da faculdade de conseguir os batráquios. 

– Mas como vou saber se é macho ou fêmea?

Fácil, explicou o pesquisador: basta cutucar o ventre do sapo – se for macho, ele vai agarrar seu dedo. 

Dias depois, está o cientista no último banco de um ônibus, quando lá na frente, prestes a descer, o auxiliar o vê – e, radiante, anuncia:

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– Professor, arranjei um macho para o senhor! 

Ainda especifica, antes de apear:

– Daqueles bem agarradô!

***

Voltavam os dois para o hotel, após pesado dia de trabalho — tão pesado que, para se ressarcir da correria e sufoco (estavam em Montevidéu, cobrindo mais um golpe militar), resolveram dar cabo de uma garrafa de vinho antes de se recolherem. Na suposição de que no Uruguai tomar apenas uma é descortesia com os nativos, tomaram outra e, por via das dúvidas, uma saideira. De forma que repórter e fotógrafo trocavam as pernas quando, em seu modesto hotel, passaram pela solitária figura do recepcionista, um velhinho sorridente.

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Mal chegados ao quarto, um deles ligou para a recepção:

— Señor, por favor, dos chicas.

Depois de uns segundos de perplexidade, o porteiro se pôs a explicar que aquele era um hotel de família, razão pela qual não poderia atender o jovem brasileiro em seu pedido de duas garotas.

— Dos chicas, señor, por favor — insistiu o rapaz, com a inflexibilidade bovina dos bebuns. 

— Lo que usted me pide no es permitido en este hotel — volveu o velhinho, e já perdia a paciência quando veio de lá, pastosa, a frase que por pouco não lhe destronca a inteligência:

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— Bueno, entonces ¡dos jugos de naranja!

***

E essa agora?, pergunta-se ele, às voltas com um pepino inédito em sua vida de repórter. 

A entrevista ia bem, bastando-lhe inflar os decibéis para transpor a surdez do entrevistado. A certa altura, porém, a fala do outro começou a se fazer ininteligível, convertida numa sopa de letras à base de mmm, rrr, ooo.

À beira do pânico, o repórter vai-se chegando para a frente no sofá, mais, mais, por pouco não acaba no colo do interlocutor, e nem assim consegue decifrar o pastoso ronronar ao qual se soma agora um chiado de gramofone cuja corda estivesse nas últimas. Em desespero, ele já se pergunta se não é o caso de chiar também, quando passa pela sala a mulher do entrevistado: 

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— A dentadura, amorzinho, a dentadura!

Sem se interromper, amorzinho dá um peteleco nos incisivos, devolvendo-os ao interior da boca, e, como um rádio finalmente sintonizado, volta a falar feito gente.

***

Bárbara não pode se queixar: foi ela quem teve a ideia de arrastar a mãe para um giro pela Europa, quando tudo o que a plácida senhora queria era ficar quieta no seu canto, saindo da toca apenas para a reza diária na igreja ao lado. 

Mas Bárbara insistiu, e agora lá estava em Copenhagen, sem saber o que fazer com Babita naquela cidade gelada onde nem missa em língua de gente se podia achar. Por sorte, topou com um anúncio que lhe pareceu salvador: uma peça de teatro com tema religioso! 

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Bárbara não lê dinamarquês, mas foi isso o que concluiu ao ver na foto uma revoada de freiras, daquelas com chapelão de esvoaçantes abas laterais.

O que viu entrar no palco, porém, não foram noviças moderadamente rebeldes, como esperava, e sim um pelotão de moças espevitadas — e o mínimo que as criaturas fizeram foi levantar o hábito e sacudir as pernocas no mais profano cancã. 

Quando os seios começaram a saltar de seus habitáculos, Bárbara espiou de lado, em tempo de morrer, e deu com a outra de rosto caído, mão direita tapando os olhos.

— Tirando um cochilo, mãe?

— Não — murmurou Babita. — Adiantando o terço.

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