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'Os 39 Degraus' leva ao teatro história filmada por Hitchcock

Dan Stulbach é o protagonista da peça com 4 atores e mais de 30 personagens

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Por Ubiratan Brasil
Atualização:

Alfred Hitchcock tornou-se o mestre do suspense graças a um recurso simples e, ao mesmo tempo, engenhoso: em boa parte de seus filmes, um homem, apesar de inocente, é apontado como culpado por algum crime e só lhe resta a alternativa de provar a inocência. A primeira vez que o diretor exercitou tal estratégia foi em um filme de 1935, ainda em sua fase britânica, chamado "Os 39 Degraus". O longa inspirou duas refilmagens e uma adaptação de sucesso para a Broadway, cuja versão nacional estreia neste sábado, 28, no Teatro Shopping Frei Caneca.

 

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"Quando assisti à montagem em Nova York, há alguns anos, fiquei fascinado, mas duvidava que a produção pudesse chegar ao Brasil graças à sua complexidade", comenta o ator Dan Stulbach, que vive o protagonista Richard Hannay. De fato, apesar de contar com apenas quatro atores em cena (os demais são Danton Mello, Fabiana Gugli e Henrique Stroeter), a peça tem mais de 30 personagens, todos envolvidos na trama em que Richard Hannay é acusado de assassinar a linda agente secreta, com sotaque alemão, Annabela Schimit. "Isso exige um trabalho de grande precisão, envolvendo contrarregras e técnicos de iluminação", observa Stulbach.

 

Ele fala com conhecimento de causa. Antes de iniciar a carreira como ator há exatamente 20 anos ("Os 39 Degraus", portanto, celebra seu aniversário artístico), Stulbach trabalhou como assistente em "O Mistério de Irma Vap", lendária montagem com Marco Nanini e Nei Latorraca em que a rápida troca de figurinos era essencial para o sucesso espetáculo. "Foi justamente essa mecânica, aliada a uma história engraçada, que me motivou a aceitar a direção", conta Alexandre Reinecke, que também viu a versão na Broadway, ficando igualmente empolgado.

 

Correria maluca - "Os 39 Degraus" exige, de fato, uma produção complexa. Ao tentar provar sua inocência, Richard Hannay foge para a Escócia, onde pretende investigar as informações passadas por Annabela. No caminho, cruza com diversas pessoas, especialmente Pamela, moça que desenvolve uma estranha forma de relacionamento com ele, pois ora o denuncia para a polícia, ora o ajuda na fuga. "Nessa correria, interpreto 13 personagens, o que me obriga a trocar de roupa em alguns segundos", conta Henrique Stroeter, que interpreta homens e mulheres. "É tudo tão maluco que, às vezes, eu assumo um personagem que já foi vivido por ele, instantes atrás", diverte-se Danton Mello, que também assume outra dúzia de papéis.

 

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"Como é preciso um sincronismo para não perder o humor, chegamos a ensaiar durante vários dias apenas com os três contrarregras que trabalham no escuro, para ajudar na troca de roupas", conta Fabiana Gugli. Apenas Dan Stulbach começa e termina a peça atendendo por um único nome.

 

A peça revive um gênero que marcou o cinema americano nos anos 1930 e 40, a screwball comedy, ou a comédia maluca, em que os diálogos são disparados como metralhadora. "Na verdade, apesar de manter até 80% dos diálogos do filme de Hitchcock, a peça é uma grande homenagem ao teatro", observa Reinecke. "É um desafio, pois apresenta várias técnicas e gêneros de cena, como o melodrama, a dupla de clowns, teatro de sombra, mímica e muita expressão corporal."

 

Ele já desenvolvera esse tipo de humor amalucado em Arsênico e Alfazema, peça que dirigiu em 2004 e também chegou ao cinema pelas mãos hábeis de Frank Capra, em 1945, recebendo no Brasil o título de "Esse Mundo É Um Hospício". Trata-se de uma interpretação de muita exigência física, além de pedir muita técnica para a comédia. E, apesar de os produtores primeiro pensarem em Fábio Assunção para o papel principal, Dan Stulbach tem o perfil perfeito - além de convencer como um sedutor, ele é talentoso ao viver o falso ingênuo, aquele sujeito que parece prestes a cair em uma armadilha, mas, na verdade, comanda o jogo.

 

 

Experiência - Pela primeira vez em sua carreira, Dan Stulbach dividiu a forma de se preparar para uma nova peça: ao mesmo tempo em que ensaiava no palco, malhava em uma academia de ginástica. "A exigência física é muito grande, o que exige bom fôlego", disse o ator que, por outro lado, sabe como é a sensação de trabalhar muito próximo a contrarregras, camareiras e iluminadores. "Fui assistente durante um período da temporada de "O Mistério de Irma Vap" - eu acertava as luzes depois que o elenco ia embora - e sei como a precisão dos gestos aqui é fundamental."

 

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A experiência permitiu um sólido entendimento dos bastidores. "Comprei muitas lâmpadas na Rua Santa Efigênia e sabia montar muito bem um refletor."

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Ao contrário dos colegas, Stulbach interpreta apenas um personagem em "Os 39 Degraus", mas praticamente não sai de cena. Daí a necessidade de um bom preparo físico. Ele também precisou contar com a boa vontade de Luiz Fernando de Carvalho, que prepara a próxima minissérie da Globo, "Afinal, O Que Querem as Mulheres?", que começa em outubro. "Luiz foi compreensivo e abriu espaço para que eu ensaiasse a peça", conta o ator, que estreou profissionalmente há exatamente 20 anos. "Em agosto de 1990, eu iniciei a temporada de Peer Gynt, de Ibsen, com direção de Roberto Lage, e, desde então, não havia experimentado ainda uma montagem tão diferente como Os 39 Degraus."

 

Na verdade, Stulbach desconfiou no início - afinal, todos diziam que Richard Hannay era um papel com o seu perfil. "Mais que isso, o que me atraiu foi a chance de fazer um tipo específico de comédia, mais cínica, em um tom amalucado", explica. "Humor é como matemática ou mesmo uma partitura: tem de surgir no momento exato para provocar o efeito esperado."

 

Como assistiu à uma montagem americana de "Os 39 Degraus", Stulbach já sabe o que vai diferenciar a versão brasileira. "O ator estrangeiro prende-se demais na técnica, praticamente repetindo os mesmos gestos todos os dias, enquanto nós somos mais criativos, mais maleáveis." Segundo ele, a peça, assim, torna-se uma celebração ao próprio teatro.

 

Os 39 Degraus - Teatro Shopping Frei Caneca. Rua Frei Caneca, 569, tel. 3472-2229. 6ª, 21h30; sáb., 21h; dom., 19h. R$ 70/ R$ 80. Até 28/11.U

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