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O outro debate

Por Luis Fernando Verisssimo
Atualização:

Não faz muito, 150 mil pessoas se manifestaram nas ruas de Tel-Aviv contra a política do governo israelense em relação aos palestinos e pela criação de um Estado palestino na região. Aqueles que se apressam a atribuir qualquer crítica a Israel ao antissemitismo talvez possam explicar a presença de 150 mil antissemitas em Tel-Aviv. O Haaretz é o principal jornal de Israel e um dos mais importantes e respeitados do mundo. A posição do jornal na questão palestina é a mesma dos manifestantes de Tel-Aviv. A crítica mais informada e relevante à política da direita no poder em Israel é feita nos seus editoriais e nas colunas de colaboradores como Gideon Levy, citado por Noam Chomsky num recente artigo deste para a revista The Nation, e que é apenas um exemplo dos muitos intelectuais, escritores, artistas, homens públicos e outros cidadãos de Israel que se opõem às ações do seu governo - e não são antissemitas. Antes, se preocupam em evitar que a maior conquista da antidiáspora judaica, a construção de uma sociedade moderna, democrática e pluralista numa paisagem inóspita, seja frustrada não pelas areias do deserto, mas pelo radicalismo. É óbvio que a eleição de um governo duro como o liderado por Netanyahu é consequência da ameaça à segurança e à sobrevivência do Estado de Israel, mas Netanyahu não é a cara de Israel, muito menos da cultura e da história do Povo do Livro, e o mandato dado à direita pelo eleitorado não inclui a autorização expressa de matar civis e crianças para fechar túneis, uma missão de difícil compreensão. Nos debates que se travam no mundo inteiro sobre os direitos e as culpas dos dois lados no atual conflito se tem dado pouca atenção a este outro debate, dentro de Israel e antigo como ele, entre direita e esquerda, teocratas e laicos, falcões e moderados, e que, no fundo, sem literatura, é uma disputa pela alma do país. O Moacyr Scliar, escritor judeu, laico, homem de esquerda, entusiasmado pela experiência social que transcorria em Israel, mas preocupado com os efeitos da radicalização no seu futuro, pregava menos explosão e mais moderação no Oriente Médio. Foi chamado de antissemita.

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