Esta é a pitada de poesia que encontrei neste momento. Mas ficaram em minha mente essas perguntas cotidianas que todos estão fazendo. Ouço no dia a dia, pela manhã ao comprar o pão e o leite, no supermercado, no bar, numa escola, na livraria, ao entrar no cinema. Ouvi agora, ao percorrer cinco cidades do litoral, Cananeia, Ilha Comprida, Registro, Sete Barras e Itanhaém, na Viagem Literária, na qual 80 escritores, por alguns meses, percorrem, cada um, cinco cidades de todo o Estado. Ou seja, 400 cidades conversam com autores, um bem-sucedido projeto que já tem anos de sucesso. Jovens e mais velhos, acreditando que o escritor tem as respostas, me olhavam: “O senhor acha que a gente sai dessa?”. Só consegui dizer: “Não sei e acho que ninguém sabe”.
Não vejam nisso desesperança (palavra complicada, gera a paralisia) e, sim, perplexidade. A resposta pode vir quando menos se espera. Lembrei-me de uma viagem, há dez anos, entre Porto Alegre e Passo Fundo, em quatro ônibus que levavam os participantes da Jornada de Literatura Brasileira, uma das mais fantásticas proezas na formação de leitores, cancelada recentemente por ciumeira de uma reitoria inclemente. Manhãzinha, os ônibus partiram e a certa atura, em uma serra deserta, um dos veículos teve de parar. Uma pedra penetrara entre dois pneus paralelos traseiros e ameaçava rasgá-los. Pararam todos os ônibus, os quatro motoristas tentaram extrair a pedra. Nada. Desceram os passageiros. Professores de letras, gramáticos, ensaístas, ficcionistas, poetas, sociólogos, antropólogos, críticos, historiadores (a turma que ia à Jornada era diversa e competente), membros da Academia Brasileira de Letras, ficaram a contemplar as tentativas fracassadas. Quando se pensava em ligar para Porto Alegre e pedir um ônibus reserva, surgiu da neblina um garoto numa bicicleta. Parou, soube do problema e arriscou:
- Por que não esvaziam um dos pneus, soltam a pedra e seguem? Perto daqui tem um posto, consertam e vão embora.
Assim foi feito. Motoristas se cotizaram para uma gorjeta ao menino que recusou:
Para quê? Não fiz nada. Só dei uma ideia.
Ele se foi. Entramos nos ônibus e partimos. Mais tarde, em uma das sessões, o chileno Antonio Skármeta, de O Carteiro e o Poeta, fez um poema sobre o incidente e leu em público. Todos riram com a metáfora. Naquele bando de intelectuais que resolvem questões complexas sobre literatura, vida, filosofia, sociedade, Brasil, mundo, nenhum sabia tirar uma pedra do meio de um pneu. Os mais antigos vão se lembrar da história que li ainda no Tesouro da Juventude, de um menino que enfiou o dedo no buraquinho de um dique na Holanda, evitando que a água por ali penetrando ocasionasse um rombo, provocando uma inundação catastrófica.
Será que o menino na bicicleta vai passar e dar uma ideia para o Brasil voltar a andar?