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Medicina napoleônica

Por Vanessa Barbara
Atualização:

Nas últimas semanas, 844 leitores me escreveram, desesperados, em busca de informações sobre o estado de saúde da tartaruga Napoleão. Em primeiro lugar, gostaria de pedir muita calma. Não é o momento de promover passeatas raivosas nem de empastelar os jornais em busca de notícias; ameaças de morte não são construtivas e apenas deixam o veterinário mais nervoso. Dito isso, vamos aos fatos: é com grande alegria que informo que, após 14 dias de internação, 28 injeções de antibiótico, dezenas de sessões de nebulização e banhos de soro fisiológico, o pequeno réptil se recuperou quase que totalmente, restando apenas uma inexplicável lesão na pata direita que o faz manquitolar pela vida afora. Voltou a comer feito um hipopótamo e está boiando com perfeição, anexando territórios e batendo a cara no vidro como todo bom imperador francês. Peço, portanto, que parem de organizar vigílias pela recuperação da tartaruga e concentrem suas orações na saúde de um jabuti chamado Michelangelo e de um axolotle que foi acometido por fungos, ambos internados na clínica do dr. Renato Leite Leonardo.O veterinário, médico titular do meu quelônio, tem uma loja de aquarismo que fica ao lado de um rodízio de sushis, mas, contrariando as piadas fáceis, é um competente especialista em peixes ornamentais. De seu currículo constam o atendimento de uma pirarara que comeu uma ventosa, um peixinho dourado com problema na vesícula, um uaru totalmente prostrado e com suspeitas de infecção fúngica, um ciclídeo flowerhorn red dragon com anorexia, uma carpa que comeu um papel de bala e inúmeros peixes beta com cistos, tumores ou intoxicação por amônia. (Na minha opinião, seu ápice profissional veio com a consulta de um peixe beta chamado Arnoldinho.)Jovem e falante, o dr. Renato atende todo tipo de animais silvestres e exóticos - embora às vezes confunda o nome dos pacientes, chamando Napoleão de "Leopoldo". (O que, convenhamos, é um ótimo nome para tartaruga.) Na mesma semana, pode fazer uma endoscopia numa arraia que engoliu um palito e um ultrassom num miniporco de nome Baconzitos. Já tratou de polvos, pererecas, anêmonas, tubarões, iguanas, camarões, canários, calopsitas, tucanos, agapórnis, gansos, saguis, galos, chinchilas, porcos-espinhos e porquinhos-da-índia. Atende igualmente papagaios e peixes-papagaio. Já diagnosticou um ferret com tumor na adrenal e uma hamster com um distúrbio uterino. Entende de caramujos de água doce e fez uma amputação em uma estrela-do-mar.Anos atrás, o dr. Renato atendeu na clínica um coral - sim, um coral - que estava sofrendo de falta de iluminação. "O mais bonito foi ver a preocupação do dono, que o enxergava não como um objeto de ornamento em um aquário, mas sim como um animal de estimação", afirmou.Fico imaginando como ele preencheu, na ficha, os campos "nome" e "idade" do pet.

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