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Jerusalém, sob a lente de Montefiore

Pesquisador britânico escreve a biografia da cidade santa, um verdadeiro museu a céu aberto da história do mundo

Por Marilia Neustein
Atualização:

Foi depois de três longos livros sobre a Rússia (Stalin - A Corte do Czar Vermelho e O Jovem Stalin) que o historiador Simon Sebag Montefiore resolveu se debruçar sobre um tema que lhe atingia e interessava desde a infância: a cidade de Jerusalém. De origem judaica, o jovem Montefiore costumava ir à cidade sagrada desde pequeno. "Sempre quis escrever uma biografia da cidade, mas não me sentia pronto", revelou o autor, em entrevista ao Estado. Segundo o escritor, no entanto, a demora teve uma razão: não gostaria de escrever para acadêmicos. "A maioria dos livros sobre Jerusalém é muito seca, com um monte de detalhes sobre qual reino, qual igreja foi construída pelas Cruzadas em época passadas. Não há vida nesses livros", revelou. Incentivado a contar as histórias daqueles que construíram a cidade, o historiador chegou a conclusão de que deveria não apenas buscar os fatos históricos, mas tratar Jerusalém como uma personagem. E, então, escrever sua biografia. "Na Bíblia, Jerusalém é sempre descrita como uma linda mulher. E é como eu vejo a cidade. Me interessei em contar as histórias, das famílias, das civilizações, tanto quanto das construções. É por isso que é uma biografia. Porque é sobre as pessoas." O resultado é Jerusalém - A Biografia (Companhia das Letras), um minucioso panorama histórico da controversa capital de Israel transformado em um livro de 760 páginas. O autor relata as conquistas e guerras que assolaram a cidade, desde os egípcios, assírios, babilônios, passando pelos romanos, bizantinos, otomanos, britânicos, jordanos até o conflito atual, entre palestinos e israelenses. Não deixou de fora nenhum profeta, rei, imperador ou batalha: Herodes, Adriano, Jesus Cristo. Além de descrever a origem dos locais sagrados para as três religiões monoteístas, como a Igreja do Santo Sepulcro (cristãos), o Muro das Lamentações (judeus) e a Esplanada das Mesquitas (muçulmanos). "Queria todos os lados, os povos diversos no Oriente Médio - da Síria ao Egito, dos armênios aos maronitas, os judeus, os católicos, a fim de entender a história de outras seitas, grupos, religiões. Esse é um dos motivos pelo qual escrevi este livro de fato. É para ser lido por todos. O livro é organizado de forma cronológica - a partir do reinado de Davi - e abarca os acontecimentos até a partilha da cidade em 1967, na Guerra dos Seis Dias."Exatamente por isso, disse o autor, a veracidade dos fatos foi de extrema importância. Por ser uma cidade cheia de mitos, Montefiore preferiu explorar acontecimentos reais, mesmo que parecesse inconveniente a alguns religiosos: "Os mitos são importantes. Criam o comportamento das pessoas, mas quis me aproximar, ao máximo, da veracidade histórica". Para a vasta pesquisa, contou com a ajuda de profundos conhecedores da história do Oriente Médio, como o professor Ban Bahat, que foi arqueólogo de Jerusalém, e Hugh Kennedy, da Escola de Estudos Orientais e Africanos. Além de depoimentos de personalidades como Shimon Peres, a princesa Firyal, da Jordânia, e Amós Oz. Por mais de vinte vezes sitiada, destruída e reconstruída, Jerusalém, hoje, ainda é um barril de pólvora no meio do Oriente Médio. "Não é apenas disputada entre árabes e judeus. Também há conflitos sérios entre religiosos e seculares, por exemplo." Indagado sobre o futuro da cidade, o autor acredita que a cidade deve ser compartilhada. "Poderia ser a capital de duas nações. Embora eu ame Jerusalém, não acho que ela é algo pelo qual valha a pena morrer. Simplesmente deve ser compartilhada entre os palestinos e israelenses, com alguma forma de sistema internacional, em que todos possam ter acesso à cidade antiga." Sobre sua relação com a cidade, após escrever o livro, o historiador afirmou se emocionar toda vez que visita os lugares sagrados: "A verdade é que você nunca encerra o assunto Jerusalém. Certamente, é sempre um mistério. Espero que meu relacionamento com a cidade seja pela vida toda. Que eu continue a achando fascinante e surpreendente e estranha", finalizou.

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