Desde que se mudou para São Paulo, o gaúcho Filipe Catto vem fazendo shows arrebatadores por aqui e conquistando um público que mergulha em pé de igualdade no seu estilo passional, sentimental, na força interpretativa de uma voz incomum de contratenor. As canções do álbum de estreia, "Fôlego" (Universal), foram ganhando corpo nesses shows - como "Saga", de sua autoria, que surgiu antes num EP, entrou na trilha da novela "Cordel Encantado" e tornou-se sua assinatura musical - e as gravações decorrem do que ele vem fazendo no palco. "Tudo se deu de forma muito orgânica, desde a escolha do repertório até os arranjos e a banda, que também foi sendo incrementada com o tempo e adaptada de acordo com a minha necessidade musical", diz Catto. Quando entrou em estúdio com a banda, o cantor quis "preservar essa espontaneidade" e para isso acabou gravando o disco (produzido por Dadi e Paul Ralphes) com microfone de show, sem fones de ouvido, interagindo com os músicos e buscando "uma fidelidade ao que existe no palco a qualquer custo". Tanto no estilo, como nos gêneros das canções e na forma como ele as canta, há uma intensa carga dramática, teatral, uma certa atmosfera de "bar da noite", de cabaré. Essa ambiência é desenhada pelas letras que escolhe para cantar. "É muito claro pra mim que existe um lugar desses amores e desamores, e que esse lugar está presente no meu discurso, mas acima de tudo eu vejo claramente que existem diversos personagens ali. Tem a desforra de Roupa do Corpo, tem a alegria de Adoração, a paixão de Gardênia Branca. E tem também um palco de cabaré." Esse romantismo despudorado, kitsch, vem da canção popular - que muitos chamam de cafona ou brega - da dor de cotovelo, seja em ritmo de tango, samba-canção, balada ou bolero. O que Catto vê de mais interessante nesse universo é a coragem, "seja do Reginaldo Rossi ou do Chico Buarque, da Bárbara Eugênia, da Piaf", lista. "A canção popular romântica me agrada, com toda sua dignidade. Gosto de canções que falam abertamente sobre os sentimentos, que carregam essa força. Garçon (clássico de Reginaldo Rossi), por exemplo, é maravilhosa, papo-reto e belíssima", diz. "Mas minha relação com esse universo não passa por esse julgamento. Não olho pra música com essa classificação de cafona ou não cafona, mas sim de ver um potencial musical ou poético que me agrade e agregue ao meu discurso." Além de "Garçon", Catto reinterpreta canções de Arnaldo Antunes e Dadi ("2 Perdidos"), Nei Lisboa ("Rima Rica/Frase Feita"), Zé Ramalho ("Ave de Prata"), Marcelo Gross, do grupo Cachorro Grande ("Dia Perfeito"), e outra da trilha do filme "Frida" ("Alcoba Azul", de Hernán Bravo Varela). Escolhidas a partir das letras, são canções que ele diz que gostaria de ter escrito, um repertório que sentiu "completamente tatuado", que integra seu universo.