Fernando Trueba exibe 'O Artista e a Modelo' no Festival do Rio

Filme do diretor espanhol conta a história de um velho escultor que retoma o gosto pela vida

PUBLICIDADE

Por LUIZ CARLOS MERTEN - O Estado de S.Paulo
Atualização:

RIO - Fernando Trueba já perdeu a conta das vezes em que esteve no Brasil, mostrando seus filmes. São documentários musicais, animações, dramas premiados como Belle Époque, que passou aqui como Sedução (e ganhou o Oscar de filme estrangeiro). O novo filme que traz o diretor ao Festival do Rio é O Artista e a Modelo. Começou a nascer em 1996, há 16 anos. Naquela época, Trueba escreveu a sinopse sobre um velho artista desiludido dos homens e das guerras. A ação situa-se em 1943. A mulher e ele acolhem na casa - e escondem - uma jovem que vira sua modelo. Ele retoma o gosto pela arte e pela vida. "Inspirei-me em muitos artistas, de Picasso a Henry Miller, embora meu protagonista seja um escultor. É curioso, mas carregava esse filme comigo há muito tempo, só achava que não estava preparado para viajar na intimidade deste velho. Não se trata de uma comédia, mas de algo mais profundo, uma investigação. Sobre o quê? Não queria fazer um filme cheio de frases feitas sobre a arte. Queria mostrar meu artista com as mãos na massa, sujas de barro." Ele conta que Jean Rochefort foi sua primeira escolha para o papel. "Tinha dois ou três nomes assinalados, mas Jean sempre foi o número um." Suas mãos foram dubladas por Michel Brigand, um escultor francês. "Jean brincava porque ele era alguns meses mais novo - dizia que era um menino." A jovem é Aida Folch, bela e talentosa. Claudia Cardinale tem um papel destacado. "Claudia é maravilhosa. E tem estado muito ativa nos últimos tempos. Saiu do meu set diretamente para o novo Manoel de Oliveira, O Gibão e a Sombra (NR: que estará na Mostra de São Paulo). Claudia filmou com todos aqueles grandes diretores. Luchino Visconti, Federico Fellini, Mauro Bolognini, Mario Monicelli, mas também Henry Hathaway e Richard Brooks. É uma grande contadora de histórias. Você pergunta por Hathaway em Madri, com quem filmou aquela história sobre o circo e ela desanda a falar. Sobre Visconti, tem histórias maravilhosas. E é um encanto de pessoa." O velho que reaprende a viver é um personagem que não é novo. "Não precisa ser o sexo, às vezes é o neto que estimula um idoso ou uma idosa a viver. As pessoas só precisam de estímulos." O filme ganhou o prêmio de direção em San Sebastian. "Tive ótimas críticas, mas vou lhe dizer. Não filmo por prêmios. O que me interessa são as pessoas, seus sentimentos." E a diversidade de gêneros e estilos? "Não é premeditado. Não digo vou fazer desse jeito, ou aquele filme. Eu me adapto sempre ao que me parece a melhor maneira de contar a história. Alguém dirá que não tenho estilo, mas sei por que filmo e o que filmo, e há coerência em meu trabalho." A crise atingiu o cinema espanhol, mas a dificuldade maior é para os jovens. "E o cinema, como diversão barata, continua atraindo o público, mas os tempos são difíceis", ele avalia. Algum novo documentário musical a caminho? "Não, desta vez trabalho num documentário sobre o cinema ibero-americano. Conhecemos nossa literatura, mas não nosso cinema. Tudo bem, existem hoje Pedro Almodóvar e Oliveira, mas um jovem brasileiro dificilmente conhece o cinema colombiano. Meu documentário nasce para tentar preencher essa lacuna." Ele admite que a pesquisa está sendo muito interessante. Forçou-o a rever filmes de que nem se lembrava e a descobrir outros. Reavaliar a obra de Luis Berlanga revelou para ele um artista muito maior do que lhe parecia o espanhol que desenvolveu sua obra autoral sob a ditadura de Franco. No Brasil, ele ama Nelson Pereira dos Santos e, um pouco menos, Glauber Rocha. "Foi um grande polemista, uma personalidade da estatura de (Pier-Paolo) Pasolini na Itália. Mas Glauber, se tem filmes brilhantes, tem outros que me parecem aburridos (aborrecidos)." A grande descoberta foi São Paulo S/A, de Luiz Sergio Person, dos anos 1960. "É um filme complexo e extraordinário. Estava adiante do seu tempo. Você encontra ali o esmagamento do indivíduo pela sociedade, os efeitos da competição e do consumismo, a angústia existencial. É um filme que fala de muita coisa sem perder o foco. Um clássico."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.