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‘Eu vou fazer uma canção pra ela’

Qual o limite na arte? Faz tempo que venho pensando nisso e resolvi compartilhar aqui. Foi no ano passado, quando Barbara Ohana, cantora e compositora, lançou o clipe da música Your Armies com o ator Cauã Reymond interpretando uma transexual e muita gente achou ruim, pois um ator estava “se apropriando do lugar de fala de uma mulher trans”. Mas e aí, onde fica o trabalho do ator que é justamente interpretar personagens? Um ator só pode interpretar o que ele é? Assim vamos reduzir as possibilidades na arte, não?

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Por Roberta Martinelli
Atualização:

O que seria de Lolita? Nelson Rodrigues? Pense em quantas obras maravilhosas e fundamentais na nossa formação não se perderiam? 

Cauã Reymond no clipe 'Your Armies', deBarbara Ohana Foto: ALLEXIA GALVÃO & DANIEL REZENDE

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REPRESENTAÇÃO

No sábado agora fui assistir à premiadíssima e essencial peça de teatro Luis Antonio – Gabriela, direção e argumento de Nelson Baskerville com a Cia Mungunzá de Teatro. Aliás, se você não viu, vá! Está em cartaz até o dia 17 de abril no recém-inaugurado Teatro de Contêiner da Mungunzá, recomendo fortemente. 

Na peça, Luis Antonio que é Gabriela é interpretado desde pequeno até a morte por um homem. Nelson, é interpretado por uma mulher. Isso não viria ao caso. É teatro, representação. O palco é lugar de fala dos atores que estão querendo contar uma história com seus personagens. 

Kiko Dinucci Foto: Gabriela Biló / Estadão

Kiko Dinucci (foto) lançou na semana passada o disco Cortes Curtos em um belíssimo show na Choperia do Sesc Pompeia. No álbum está a música Uma Hora da Manhã, inspirada por uma briga que ele presenciou no supermercado Extra, onde um cara gritava e agredia uma mulher por ela ser nordestina (infelizmente isso acontece – bizarro) e ela começou a gritar para se defender e para isso começou a xingar o cara de veado. Sim, um verdadeiro horror de xenofobia versus homofobia. 

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No show, na hora que a letra diz “seu veado, veadinho” e eu fui cantar junto, me senti muito esquisita. E aqui a obra de arte coloca no palco um caso de horror da vida. Isso também é um lugar da arte. Juçara Marçal e Kiko Dinucci estão juntos no palco interpretando falas que obviamente jamais seriam deles. Cantar a violência para espalhar o amor, foi o que eu senti neste show. Muito forte e poderoso.

Chico Buarque criou letras com eu lírico feminino, de mulheres, que se não soubéssemos que são de sua autoria, poderíamos falar que eram das mais sensíveis. 

Seria muito limitador para a arte se compositores só pudessem escrever canções que dissessem respeito ao próprio mundo, atores só pudessem interpretar personagens como eles, cantores só cantassem coisas que concordassem. 

Eu estou há uma semana impactada com o modo como a música Uma Hora da Manhã é cantada e não é à toa, ela foi composta para isso. 

Pela multiplicidade das falas que lutam pelo respeito sempre. 

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LANÇAMENTO 

Plutão Já Foi Planeta

Logo mais chega o segundo disco da banda de Natal (RN), Plutão Já Foi Planeta. O nome do disco é A Última Palavra Feche a Porta e tem produção de Gustavo Ruiz, músico e produtor dos ótimos discos da cantora Tulipa Ruiz. Já anunciadas as participações das cantoras Maria Gadú e Liniker. O disco será lançado em todas as plataformas digitais no dia 24 de março. 

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