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Espaços de música instrumental tentam conter ruído

Por Roger Marzochi
Atualização:

Conseguir educar o público é uma tarefa delicada para os espaços dedicados à música instrumental. Especialmente porque uma repreensão pode afastar o cliente da casa. Ou ainda pior: incutir na cabeça da pobre alma que música instrumental é coisa de gente chata, metida a besta, no mínimo.Letícia Guerra Pena, uma das sócias do Sindykat, afirmou que o bar se preocupa em manter um clima onde a boa música não seja prejudicada pelo barulho de alguns clientes, mas sabe que não adianta fazer "shhhh". "Já fizemos muito ''shhh'' também mas parece que o efeito às vezes vira o contrário", disse, em entrevista por e-mail, após a reportagem informar que já teve de fazer "shhh" a um casal eufórico. Eles não sabiam ainda se era namoro ou amizade. "O que fazemos as vezes também é oferecer uma outra mesa na parte que não seja próxima ao palco (na parte de cima da casa) para a conversa continuar, mas o que não fazemos é tratar os clientes como crianças, na base do ''SHHH!'' afinal nada somos sem eles."A reportagem também fez "Shhh" no Jazz nos Fundos, para uma mesa de senhores e para um casal. Caroline Sampaio, produtora do Jazz nos Fundos, lembra que, embora a casa tenha a música como elemento principal, e a casa ressaltar no início dos shows a necessidade de o público respeitar músicos e quem vai para ouvir música, reconhece que, às vezes, a informalidade do espaço e a longa duração dos shows fazem com que as pessoas tenham vontade de conversar."Tentamos mostrar ao público a importância de controlar o volume dessas conversas, e mostrar que, se a conversa ganhar uma importância maior, as pessoas devem se afastar do palco pra que os ouvintes atentos não percam a qualidade da apresentação. Essa política tem surtido efeito, mas confesso que ainda está distante do que consideramos ideal", explicou, por e-mail. A casa ainda distribuiu cartazes ao longo do espaço com avisos como: "Por favor, fale mais baixo que o volume do contrabaixo", ou "Jazz pede concentração, colabore e aprecie". Mas não é fácil: a reportagem já fez "shhhh" até para um grupo com faixa etária próxima à melhor idade.Letícia e Carolina explicaram que ambas as casas têm o cuidado de evitar que mesas com aniversariantes prejudiquem o show. Segundo Letícia, os que celebram seus aniversários no local são avisados, antecipadamente, que cantar parabéns só é permitido nos intervalos dos shows. "E mesmo quando pegamos as reservas grandes, frisamos que seria melhor reservar um espaço onde o aniversariante seja a atração principal, ou seja, longe da banda." De acordo com Carolina, o Jazz nos Fundos procura "sempre acomodar as festas de aniversário e grupos grandes o mais longe possível do palco, para que possam conversar à vontade sem atrapalhar o show".Letícia ainda conta que, uma vez, teve que prometer uma rodada de cerveja a um grupo de clientes caso fizessem silêncio. "Acho que tratar o cliente com um diferencial único e esperar a resposta, ajuda muito, afinal numa cidade onde são todos números e senhas, alguém que converse com cada cliente como deve, não tem como falhar."A reportagem entrou em contato por telefone e e-mail com a assessoria de imprensa do HSBC Brasil, mas não obteve resposta sobre o que a casa de espetáculo faz para contribuir na educação dos clientes. A reportagem já fez "shhh" também lá, para dois casais impossíveis. De pé, longe das mesas, ainda era possível ouvir entre um acorde e outro mais "shhhssss!" de outras pessoas incomodadas com outras pessoas impossíveis.A reportagem deixou duas gravações na secretaria eletrônica do Teta Jazz Bar, que também não retornou. Além do espaço ser pequeno, já ocorreu de um grupo ruidoso de clientes pedir, a todo momento, que um trompetista tocasse "A Night in Tunisia", de Charlie Parker. Aquele músico estava lá para apresentar composições próprias, alguns standards, e já havia pedido de forma clara, digamos até poética, para que os clientes se abrissem ao novo. Se não tocou aquela música, é porque havia algum motivo importante. O músico, quase sempre, tem razão.

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