Celulari traz um Beckett light para SP

O galã global estréia a peça Fim de Jogo, com tradução de Millôr Fernandes. Seguindo as orientações do autor, Celulari diz ter feito um espetáculo bem leve

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Por Agencia Estado
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Grande, no alto de seus quase 1,90m, cheirando a perfume Eternity, e pernas cruzadas invadindo inevitavelmente o espaço das cadeiras ao lado. Gestos amplos também, enquanto os olhos verdes meio apertados procuram no horizonte a melhor resposta para as perguntas. Sob a luz do teatro, veste preto dos pés à cabeça. Denunciando os 43 anos de idade, só alguns fios de cabelo branco. "Bem que eu gostaria de fazer a mãe nesta peça, uma velhinha, mas acho que não vai ser possível", diz Edson Celulari com uma sonora gargalhada, naquele mesmo estilo consagrado pela televisão. A julgar pelos predicados de galã global, definitivamente, o papel que ficou com a atriz Malu Pessin no espetáculo Fim de Jogo não lhe cairia bem. Encabeçando o elenco com Cacá Carvalho, Celulari apresenta o texto de Samuel Beckett que faz sua estréia amanhã na cidade, inaugurando o Teatro Folha no Shopping Pátio Higienópolis. É a sexta peça do ator em 23 anos de carreira. Com direção de Francisco Medeiros, Fim de Jogo ainda conta com a tradução de Millôr Fernandes, feita especialmente para esta montagem, e com o ator Lafayette Galvão. Celulari e sua trupe já rodaram com a peça por Belém, São Luís, Manaus, Belo Horizonte, Juiz de Fora e Petrópolis. "Foi uma forma de testar como o público reagiria a um texto de Beckett. Para isso não quisemos usar o eixo Rio-São Paulo", diz o ator, explicando que esta prudência decorre do fato de o autor ser considerado "meio maldito". "Mas fizemos um espetáculo bem leve, seguindo as instruções de Beckett, já que tivemos acesso ao caderninho com as anotações dele", diz. "O desafio é que nesta temporada paulistana, Cacá e eu vamos trocar de papel em algumas apresentações. Se bem que a gente queria fazer a velhinha", completa o marido de Cláudia Raia e pai de Enzo. Escrita originalmente em francês, em 1956 (logo após Esperando Godot e antes de A Última Gravação de Krapp), Fim de Jogo conta a história de quatro personagens que vivem o final dos tempos. Pelo menos até não trocarem os papéis, Celulari faz Clóvis e Cacá, Ham. O primeiro é o aluno, o aprendiz, o empregado, locomove-se com dificuldade e não tem acesso ao mundo das memórias. O segundo, mestre, pai e patrão, é dominador, não enxerga e não anda. Os outros personagens - Nagg (Lafayette Galvão), o avô, e Nell (Malu Pessin), a avó - a tal personagem cobiçada pelos astros - representam os pais de Ham. O casal vive em latas de lixo e recebe apenas uma ração diária, suficiente para não morrer de fome. "Costumam dizer que representar Beckett pelo menos uma vez já é um grande desafio para um ator", diz Celulari, na conversa sobre teatro e televisão, interrompida por telefonemas em nome do amor. Dizem que fazer Beckett é meio complicado, não? Um tanto profundo.. Como foram os preparativos? Édson Celulari - Realmente, é o maior desafio da minha carreira. Tive um grande preparo físico e emocional para enfrentá-lo. Como se tratava de jogo, fizemos um laboratório. Disputamos partidas de futebol, esconde-esconde e pôquer para treinar o blefe. Você é um bom blefador? Sim, quer dizer, não (risos). Quem diz que não é normalmente está blefando. E qual o seu jogo predileto? Gosto de tênis de mesa. Sou praticamente um japonês. Tanto que antes de enfrentar quem não conheço, costumo arregalar os olhos, blefando, já que meus olhos são estreitos. (Toca o telefone. É a produtora do Domingão do Faustão que vai homenagear Cláudia Raia naquele quadro para arrancar lágrimas do artista. Ela agenda a gravação do depoimento de Celulari.) O que você vai dizer na televisão? Vou contar o quanto Cláudia é sensacional, boa companheira, excelente mãe e atriz. Vou também dizer como eu a amo. Como anda a vida de vocês? Uma correria. Especialmente a Cláudia, tadinha, que não pára de gravar. Mas ela está vibrando com o papel. E vocês falam sobre trabalho em casa? Quando um dá espaço para o outro, lançamos opiniões. A Cláudia tem me mostrado algumas cenas, o texto, encena e pergunta se o tom está bom. Puxa, nos apaixonamos em uma novela (Deus nos Acuda, de Silvio de Abreu, em 93). É normal essa troca. Quando você volta para a televisão? No ano que vem, a Globo já disse que vai me colocar em duas novelas. Ainda não sei o autor nem o horário. Tem também um novo filho nesses planos para o ano que vem, não? Sim. Queremos um irmão ou irmã para o Enzo. Gostamos de barulho e casa cheia (risos). Fim de Jogo, de Samuel Beckett, com Édson Celulari, Cacá Carvalho e elenco. De hoje a 23/12. Teatro Folha (av. Higienópolis, 618, tel. 3823-2323). Sex. (18h e 21h30) e dom. (19h), R$ 40. Sáb. (19h e 22h) R$ 50.

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