O bispo d. Pedro Casaldáliga dedicou um poema; o cardeal d. Paulo Evaristo Arns fez a orelha; o crítico literário Antonio Candido mandou uma resenha; teólogos, políticos, sociólogos e economistas produziram ensaios e uma equipe multimídia gravou entrevistas. Quase tudo inédito e exclusivo, as 565 páginas de Utopia Urgente reúnem, entre fotos e ilustrações, os textos que 37 amigos e companheiros escreveram em homenagem aos 80 anos de frei Carlos Josaphat, o dominicano que incendiou a esquerda brasileira com seu livro Evangelho e Revolução Social, na véspera do golpe militar de 1964. O lançamento é amanhã, às 20 horas, na Igreja de São Domingos, em Perdizes, zona oeste de São Paulo, precedido de uma missa, às 18h30. Na esteira desse livro e dos sermões que pregava no convento das Perdizes, em São Paulo, o frade fundou o semanário Brasil Urgente, porta-voz da premente utopia que só agora, quatro décadas depois, ele vê se tornar realidade. "Aquilo com que a gente sonhava nos anos 60 - realizar uma verdadeira revolução social de inspiração humanística - e que é um imperativo evangélico, está de volta", disse frei Carlos Josaphat em depoimento gravado já para a comemoração de seu aniversário, mas meses antes da eleição de Lula para presidente da República. Lançado em março de 1963, com apoio da Juventude Universitária Católica (JUC) e da Ação Popular (AP), o jornal durou até 1.º de abril do ano seguinte, quando foi fechado pelos militares. "Fascistas preparam golpe contra Jango!", dizia a manchete de sua última edição, a de número 55, publicada quando o fundador iniciava um exílio de 30 anos na França, de onde se transferiu para a Suíça, por ordem do Vaticano, atendendo a pressões do núncio apostólico em Brasília. "Fora padre comuna", protestava uma pixação anônima na porta principal da Igreja de São Domingos, onde o frei Carlos Josaphat superlotava missas com suas homilias. Os textos de Utopia Urgente tratam, por encomenda e por afinidade ideológica, de temas caros ao frade - ética, política, economia, questões sociais, revolução e espiritualidade - na linha da doutrina de Santo Tomás de Aquino na teologia e do exemplo pioneiro de Bartolomeu de las Casas, na defesa dos índios durante a colonização espanhola. À homenagem dos intelectuais brasileiros - e de estrangeiros que, como o padre José Comblin e frei João Xerri, optaram pelo Brasil - alinham-se amigos e colegas de cátedra da universidade suíça de Friburgo, atendendo todos à convocação de Frei Betto, Adélia Bezerra de Meneses e Thomaz Jensen, organizadores da obra. Ensaios densos, análises competentes, testemunhos de reconhecimento e admiração, os textos desses colaboradores selecionados a dedo, pelo critério de sua ligação com frei Carlos Josaphat, constituem preciosa contribuição para a análise do pensamento católico, à luz dos ensinamentos de João XXIII, o papa do Concílio Vaticano II. Radical na pregação da justiça e revolucionário na abordagem da questão social, o frade dominicano permeia todas essas páginas, mesmo quando os autores mal citam seu nome. Nem precisaria haver referência explícita, pois a identidade de temas e idéias não dá margem a dúvidas. A entrevista sobre Brasil Urgente é um capítulo à parte. Falando a Adélia Bezerra de Meneses, Melchíades Cunha Jr., Thomaz Jensen e Waldecy Tenório, frei Carlos Josaphat resgata não apenas a história do jornal, mas todo o contexto político e social dos anos 60, sob a perspectiva da esquerda católica, aí incluindo, naturalmente, a ala progressista da Igreja que levaria à efervescência da teologia da libertação. Um portfólio de oito páginas reproduz as capas mais ousadas do semanário, da afirmação de que "remédios matam o Brasil" ao já citado anúncio de que se preparava um golpe contra Jango. "José Serra, 20, deu uma lição de moral na CPI!", informava outra manchete, ao relatar o depoimento do então presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Fome, miséria, reforma agrária, liberalismo econômico e participação dos padres na política eram assuntos de primeira página. Brasil Urgente, que contava com a colaboração de militantes cristãos como Franco Montoro e Plínio de Arruda Sampaio, dava cobertura ao movimento do educador Paulo Freire e apoiava, com reservas, as Ligas Camponesas de Francisco Julião. Utopia Urgente - Escritos em Homenagem a Frei Carlos Josaphat nos seus 80 Anos. Organizado por Frei Betto, Adélia Bezerra de Meneses e Thomaz Jensen. Editora Casa Amarela/Educ. 565 páginas. R$ 40,00 (preço de lançamento). Amanhã (09), às 18h30 missa; e às 20 horas noite de autógrafos. Informações 3819-0130. Igreja de São Domingos. Rua Caiubi, 126.