'Bordados', o Sex and the City do Oriente Médio

Iraniana Marjane Satrapi ('Persépolis') revela com humor e ironia os segredos dos ‘tricôs’ de sua avó e amigas

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Por Flavia Guerra e de O Estado de S. Paulo
Atualização:

"É o Sex and the City do Oriente Médio. Extravagante, explícito e engraçado!", disse Kelley Know, da Time Out London, sobre Embroideries, de Marjane Satrapi. A afirmação tem lá sua verdade. Afinal, Embroideries (que ao pé da letra significa ‘bordados’, como o livro será chamado no Brasil quando for lançado em um mês pela Companhia das Letras) traz um grupo de mulheres conversando sobre homens, relacionamentos e, claro, sexo.

 

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Mas há em Bordados algo que o faz mais interessante que a série que transformou o ‘papo calcinha’ em assunto de primeira ordem. Além da assinatura da iraniana Marjane Satrapi, Bordados abre as portas de um universo que até pouco tempo era completo mistério: a sexualidade no Oriente. E a maior descoberta que se faz ao folhear as páginas de Bordados é que mulher é tudo igual. Só muda de país. Ou quase. Nas páginas e nos desenhos de Bordados descortinam-se os tabus, desejos e ousadias de um grupo de amigas da avó de Marjane. Entre um chá e outro, elas revelam que até perdem a virgindade antes do casamento, mas não perdem o humor jamais. O que fazer diante de uma avó viciada em ópio ("O doutor me mandou tomar porque disse que era bom para minhas dores", justificava a avó), que adora falar da vida dos outros ("É o ventilador do coração") e reúne as amigas para ‘ventilar’ a alma após as refeições? "Aproveitar, aprender e rir muito", concluiu a jovem Marjane bem cedo e muito antes de, nos anos 70, ser mandada pelos pais a estudar na Europa.

 

Bordados é a continuação de um projeto que começou com Persépolis, em que Marjane contou e desenhou as sensações de ser uma garota de família liberal de esquerda em um país onde andar com os cabelos à mostra é considerado contravenção. O livro fez tanto sucesso que virou filme premiado. Agora em Bordados, Marjane dá ao leitor o direito de ser uma mosquinha capaz de ouvir histórias de como a avó da autora ‘ensinou’ uma amiga a ‘disfarçar’ a virgindade perdida cortando-se com uma gilete na primeira noite com o marido. "Não deu certo. Em vez de se cortar, ela acabou cortando os testículos dele", conta a avó. "Ela poderia ter feito um ‘full embroidery’", argumentam as amigas. Aí é que entra a piada com o título original. Full Embroidery (bordado completo) é também como é chamada a himenoplastia (cirurgia que ‘devolve’ a virgindade’). Só essa passagem faria Carrie Bradshaw corar.

 

"Ela não faz nada demais além de publicar histórias que todas ouviram de suas avós", disse uma leitora iraniana em Londres. Este ‘nada demais’ é que é o ‘a mais’. As histórias de tantas outras avós mundo afora estiveram sempre ali, esperando ser escritas. Marjane rompeu a inércia e o fez. Numa época em que o mundo ainda está em luto pela morte de Neda Soltan, baleada em um protesto no Irã em junho de 2009, rir ainda é o melhor remédio e a melhor forma de acordar para a beleza de um país que sofre, mas não se cala.

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