Sylvio Back filma os últimos dias de Stefan Zweig

Cineasta roda em Petrópolis Lost Zweig, em que reconstitui a última semana de vida do escritor austríaco, no Brasil, no carnaval de 1942

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Por Agencia Estado
Atualização:

É a concretização de um sonho de 20 anos. Admirador de Stefan Zweig, Sylvio Back nunca havia pensado em realizar um filme sobre o escritor austríaco de origem judaica - até o dia em que leu o livro de Alberto Dines, Morte no Paraíso. O jornalista mapeou com riqueza de informações e estilo a narrativa da presença de Zweig no Brasil. Back usou o livro de Dines como fonte de consulta e referência. E escreveu (com o irlandês Nicolas O´Neill) o roteiro do seu filme Lost Zweig. Somente nos últimos quatro ou cinco anos, ele realmente encarou o desafio de montar a produção. Chocou-se com um paredão de desconfiança. Chegou a ouvir do diretor de Marketing de uma empresa a pergunta que o escandalizou: "Mas um filme sobre um judeu suicida? Não dá pelo menos para eliminar o suicídio da história?" Com apoio do Banespa, da BR Distribuidora, do PIC-TV (da Cultura), do Finep e da Prefeitura de Petrópolis, Back conseguiu levantar o dinheiro necessário (R$ 3,5 milhões) e roda agora em Petrópolis, no Estado do Rio, o tão sonhado Lost Zweig. Ele aceita, como Dines, a tese do duplo suicídio. Há controvérsia: uma corrente sustenta que o escritor e a mulher, Elisabeth Charlotte Altmann (Lotte), foram assassinados pela Gestapo. O filme trata da última semana da vida de ambos. Começa com o casal descendo a serra para participar, no Rio, do carnaval de 1942. Em meio à festa, Zweig encontra Orson Welles, que filma no Brasil o mítico É tudo Verdade. Esse encontro nunca ocorreu, mas Welles admirava Zweig e Back se permitiu a licença poética. "Sou um artista, não me prendo ao rigor jornalístico dos fatos." Ele ainda não encontrou o ator americano para o papel de Welles. Seu prazo está se esgotando. Não tenta iluminar as razões do suicídio. Concorda com Cioran, o filósofo que forneceu a Abbas Kiarostami a epígrafe para o admirável O Gosto da Cereja: a vida seria insuportável se não houvesse a opção do suicídio. Back acha que se trata de um problema moral de foro muito íntimo. Prefere usar Zweig - que chegou a dizer que, se houvesse um paraíso, teria de ser no Brasil - para discutir o País e o que lhe parece mais importante de tudo: a extraordinária atualidade do autor. Pacifista, contrário a todas as guerras, humanista antiideológico, livre-pensador, Zweig prenunciou a Europa sem fronteiras e com uma só moeda. Era contra todas as ortodoxias. E achava o Brasil o País do futuro. Vem daí a identificação de Back com Zweig. Ele também é livre-pensador, é contra os xiitas de qualquer ideologia ou religião. Depois do poeta Cruz e Sousa, um injustiçado, Back faz Lost Zweig para provar a modernidade do escritor, 60 anos após sua morte, em 23 de fevereiro de 1942. Back começou a rodar o filme há pouco mais de uma semana. Permanece na locação em Petrópolis até dia 17. Depois, a filmagem prossegue no Rio até 17 de dezembro. Ele trabalha rápido, mas teme não conseguir seu objetivo, que é ter uma cópia pronta em 23 de fevereiro de 2002. Para viver o papel, Back importou da Alemanha o ator de Wim Wenders, Rudiger Vogler. Para fazer Lotte, chamou a atriz austríaca Ruth Rieser. Pensou em rodar na própria casa do escritor, em Petrópolis, que ainda existe, na Rua Gonçalves Dias. "Mas ela está em ruínas e a restauração ia encarecer muito a produção." Back achou então uma locação sob medida: uma casa muito antiga, no meio de um parque. É aí que a equipe inteira está reunida na segunda à noite, para a rodagem de uma cena importante. Feito o pacto de suicídio, Zweig e a mulher recebem um casal de amigos brasileiros, interpretados por Ney Piacentini e Cláudia Netto. Ele está de excelente humor e fala da viagem que o amigo considera "misteriosa". O plano parece simples, mas é complicado. É um plano-seqüência no qual a câmera acompanha Zweig que sai de dentro da casa para receber os amigos e depois desliza por um trilho para seguir a entrada do trio na casa e a chegada de Lotte. Novos cumprimentos, os quatro se posicionam no espaço compondo um túnel e, ao fundo, aparece a governanta para anunciar que a mesa já está pronta. A cena é repetida mais de dez vezes. Uma hora é a luz, outra é o excessivo barulho dos cachorros (que motiva, após várias tentativas, um comentário de Back: "Vamos agora de qualquer jeito; se houver problemas a gente dubla"), outra é o ator que erra o diálogo em inglês. Back e o diretor de fotografia Antônio Luiz Mendes seguem tudo pelo monitor de vídeo. A nona tomada é considerada a melhor, mas o diretor ainda faz mais uma (e outra) como garantia. Esse cuidado com a imagem é típico de Back. O repórter viajou a convite da produção

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