'Spotlight' reconstrói investigação sobre pedofilia na Igreja

Filme conta a história de repórteres que denunciaram abusos sexuais de crianças por padres em Boston

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Por Lorne Manly
Atualização:

Num escritório abarrotado, um grupo de jornalistas profundamente engajados trabalha para expor o acobertamento da Arquidiocese de Boston de dezenas de anos de abusos sexuais de crianças por inúmeros padres. Definitivamente, uma investigação digna do Prêmio Pulitzer, ganho pela equipe do Boston Globe pela série em 2002. Mas material para um filme de Hollywood? O diretor e corroteirista Tom McCarthy, cujas realizações incluem Vias Cruzadas e O Visitante, estava convencido de que os aspectos essenciais do jornalismo de grande qualidade podem dar uma versão cinematográfica incrível. O resultado é Spotlight - Segredos Revelados, que estreia nesta quinta-feira, 7, com Michael Keaton, Mark Ruffalo, Rachel McAdams e Liev Schreiber no elenco. O filme permitiu que McCarthy e seu corroteirista, Josh Singer, explorassem ao mesmo tempo a relevância do jornalismo investigativo local numa época de avassaladoras mudanças nos jornais, e as conspirações do silêncio em torno dos crimes de instituições aparentemente admiráveis. Não só eles usaram suas descobertas em artigos da equipe do Spotlight publicados anteriormente, como também o seu próprio jornalismo para fornecer conteúdo a todos os aspectos do roteiro. Em questões graves e menores, McCarthy e Singer enfatizaram o cuidado e a autenticidade contra a tendência a enfeitar os problemas típica de Hollywood. “Enquanto eu e Josh preparávamos o roteiro, tínhamos como meta respeitar totalmente a verdade para dois grupos de pessoas: os jornalistas e os sobreviventes”, contou McCarthy. “Quero muito que essas pessoas assistam a esse filme e sintam que entendemos esses dois mundos.”  

Os seis principais jornalistas da série Spotlight deram aos produtores opções dos direitos autorais sobre suas histórias (inicialmente sem qualquer custo), e assim começou o longo caminho de desenvolvimento do roteiro. McCarthy entrou na equipe em 2012, mas, pressionado por um outro projeto, ele precisou de um escritor. A Anonymous Content, empresa de produção e gestão que se associou aos produtores, contratou Singer, um ex-roteirista da série The West Wing, cujo interesse pelo jornalismo deu origem ao roteiro do filme sobre o WikiLeaks, O Quinto Poder. Os dois tornaram-se rapidamente repórteres investigativos, e entrevistaram várias vezes os jornalistas sobre o projeto e suas vidas. Vasculharam os arquivos do Globe e os autos dos processos. Reuniram-se com outros jornalistas do jornal, com os sobreviventes dos abusos, com os advogados envolvidos ao longo dos anos e com os especialistas em hierarquia católica.  Mas lá no meio de seu trabalho de colaboração, McCarthy ainda perguntava a si mesmo e a Singer do que o filme trataria, além da importância do bom jornalismo. “Então, Josh e eu passamos a nos dar conta de um novo grau de relevância dessa história quando começamos a discutir a questão da cumplicidade e da deferência da sociedade”, o que incluía o próprio Globe, disse McCarthy. “Quando nos conscientizamos de que esses crimes não existem no vácuo, que são algo grande demais, que afetam gente demais, concluímos que as pessoas tinham de saber.” Depois de conversar longamente por telefone com o repórter Mike Rezendes, que interpretaria na tela, Ruffalo viajou para Boston para seu primeiro encontro. “Sentamos na minha sala”, contou Rezendes. “Ele abriu um bloco de anotações e ligou seu iPhone, e foi me fazendo perguntas, não sobre como eu fiz o que fiz, mas por que fiz, por que escolhi essa profissão e por que decidi ser um repórter investigativo”. Ruffalo gravou em vídeo Rezendes andando pelo apartamento espartano, imaculado, tirou fotos da estante de Rezendes e, inclusive, pediu que ele lesse o roteiro. Os outros repórteres receberam um tratamento mais ou menos igual. McAdams fez inúmeras perguntas a Sacha Pfeiffer sobre as coisas de sua preferência e suas conversações com a família a respeito da Igreja. A atriz também ouviu um programa de rádio que Pfeiffer apresentava de maneira a captar sua fala acelerada. Keaton perguntou a Walter V. Robinson, o editor do Spotlight, coisas completamente sem relação com a investigação. “Na realidade, eu queria conhecer Ted Williams, mas não me preocupei com certas coisas”, disse Keaton. “Só queria observá-lo, ver como ele se comportava.” / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA  

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