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'O Beijo da Mulher Aranha' e seu fotógrafo

Rodolfo Sanchez, 66 anos, assina a fotografia do filme que abre e do que fecha o Festival de Paulínia

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Por Redação
Atualização:

Sonia Braga, em cena de cópia restaurada do filme 'Beijo da Mulher Aranha'. Foto: Divulgação

 

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Luiz Carlos Merten

SÃO PAULO - Parece que foi planejado - Rodolfo Sanchez, um dos maiores diretores de fotografia do cinema brasileiro, completa hoje 66 anos. Se ele tivesse planejado, o timing não seria mais perfeito. Sanchez vai comemorar a data em alta, em Paulínia, que inicia hoje seu festival de cinema. Um filme que ele fotografou há 26 anos - um clássico de Hector Babenco, O Beijo da Mulher Aranha - inicia hoje o evento. E outro, que ele também fotografou, o encerrará, na semana que vem, 400 Contra Um, de Caco Souza. Além do fotógrafo, ambos compartilham várias outras coisas. Os respectivos relatos se passam em diversos planos, ou épocas, e o presídio é cenário nas duas narrativas.

 

O Beijo inspira-se no romance de Manuel Puig sobre presidiário que entretém seu colega de cela, um prisioneiro político, contando história de filmes, nas quais reluz a misteriosa e sensual Mulher Aranha. 400 conta a história de William da Silva e de como ele criou o Comando Vermelho. Na narrativa retrocede no tempo e no espaço até o presídio Cândido Mendes, na Ilha Grande, onde conviveram presos comuns e políticos, durante a ditadura militar. Dessa promiscuidade - os criminosos comuns consideram os presos políticos ‘almofadinhas’ - saiu uma aliança. Os presos comuns, e William, absorveram os métodos da guerrilha e criaram o CV. Esta história já foi contada na perspectiva dos presos políticos, por Lúcia Murat, em Quase Dois Irmãos. Caco Souza a conta do ângulo dos presos comuns.

 

Em maio, O Beijo da Mulher Aranha foi o filme escolhido para a noite de abertura de Cannes Classics, importante seção do maior festival do mundo que só mostra clássicos restaurados. Hector Babenco, acompanhado por uma resplandecente Sônia Braga - a Mulher Aranha - lembrou da estreia mundial do filme, lá mesmo, na Croisette. A equipe não sabia qual seria a recepção - Pixote, a Lei do Mais Fraco fora recusado pelo festival, anos antes - e O Beijo, realmente, não tinha a cara do cine brasileiro que os europeus apreciavam, via Cinema Novo. A acolhida superou a expectativa e William Hurt, que faz o protagonista, o travesti que conta as histórias, foi o melhor ator daquele ano, bisando seu prêmio de interpretação com o Oscar do ano seguinte.

 

Sanchez não acompanhou O Beijo em Cannes. "Tinha compromissos no Brasil, na época." Ele também não acompanhou a restauração do filme, feita pelos melhores profissionais do mundo, em laboratórios nos EUA. Está cheio de expectativa - "Babenco é um perfeccionista. Não teria se contentado com menos que a perfeição, e ele gostou do resultado."

 

Há quase 30 anos, O Beijo colocou problemas de ordem técnica, na fase de pós produção, que hoje talvez fossem facilmente superados por meio da digitalização. O visual do filme se alterna entre a sordidez da cadeia e o mundo glamouroso da Mulher Aranha. "A maior dificuldade foi tirar a cor, para acrescentar mais vermelho nas cenas que representam o nazismo. Fizemos isso fotoquimicamente", Sanchez lembra.

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Nascido em Buenos Aires, ele desembarcou no Brasil como fotógrafo de publicidade. Babenco queria que ele fotografasse seu longa de estreia, O Rei da Noite, mas não houve coincidência de datas. Anos depois, Sanchez fotografou para ele Pixote e O Beijo. Nenhum dos dois filmes tem o look que os críticos gostam de denunciar, em obras assinadas por profissionais vindos da publicidade. Sanchez conta que nunca quis trazer a publicidade para o seu cinema. "A fotografia deve servir ao filme, dando-lhe a linguagem que o roteiro pede."

 

Sanchez lembra que Pixote precisou estourar nos EUA para virar o filme de culto que é. Mas a própria entrada no mercado americano não foi fácil. "Eles não acreditavam que uma história daquelas pudesse acontecer. Babenco teve de gravar uma apresentação para cópias que circularam nos EUA." Sanchez não vê inferioridade nenhuma entre o estilo brasileiro e o norte-americano de fotografar. "Mas eles têm mais dinheiro, e isso sempre vai aparecer."

 

"Sou como um lutador que não para de treinar, à espera das grandes lutas (o cinema)", avalia. Paulínia é um festival que tem a vocação do tapete vermelho. Rodolfo Sanchez este ano é o homem. Pisa no tapete na abertura e no encerramento. O show vai começar.

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