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'Não sou um astro, apenas tive sorte’, diz Ian McKellen, o novo Sherlock Holmes

É assim que o grande ator inglês do palco e da tela, que agora estrela ‘Mr. Holmes’, explica o seu sucesso

Por Colin Covert
Atualização:

MINNEAPOLIS - Pessoas esperam coisas deliciosas de Ian McKellen, o grande ator inglês do palco e da tela. Ele recebeu seu primeiro pagamento aos 3 anos, subiu no seu primeiro palco com 6 e, desde sua estreia profissional, em 1961 aos 22 anos, nunca parou de trabalhar. Ele pertence a uma geração estelar de atores clássicos, tendo interpretado grandes heróis e vilões de Shakespeare, e recebeu o título de cavaleiro por serviços prestados às artes da rainha Elizabeth, em 1991, e depois começou a florescer no cinema. 

Seus papéis como Gandalf nas trilogias de O Senhor dos Anéis e do Hobbit e como Magneto nos filmes X-Men fizeram dele um ícone global. Em seu último filme, McKellen faz outro personagem com grande apelo popular: Sherlock Holmes. Calmo, encantador e realista, McKellen pode ser um dos cavaleiros mais simpáticos da Grã-Bretanha. Com a clássica depreciação britânica, ele descreve um dos mais impressionantes currículos do último meio século como um trabalho que faz num ofício que gosta. 

Um novo caso, aos 93 e aposentado Foto: Giles Keyte/Divulgação

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McKellen ridiculariza simpaticamente a sugestão de que ele seja um superastro internacional. Soltando uma sonora gargalhada por telefone desde Nova York, ele disse: “Não me sinto assim. Você não deve superestimar a coisa. Não sou Tom Hanks. Não sou Tom Cruise. Eu posso andar na rua. Posso usar o transporte público”. “Ultimamente, tenho estado em alguns filmes que foram extremamente populares, mas me tire de O Senhor dos Anéis e ainda terá o trabalho extraordinário de Peter Jackson. Eu fiz parte da equipe. Acho que seria um bom papel para outro ator. Eu só fui o sortudo”, afirmou. 

Mas ele é notado nas ruas. “É verdade que onde eu vou, ultimamente, sempre há pessoas que me reconhecem. Mas isso não me incomoda”, lembrou ele. “Faz com que eu me sinta bem-vindo, sempre que acontece. Não me importo de apertar a mão de um desconhecido. Não tenho portões eletrificados em torno de minha casa.” 

Em Mr. Holmes (que estreou na sexta-feira, 17, nos EUA), seu Sherlock está aposentado e com problemas de memória aos 93 anos, analisando um caso não solucionado envolvendo uma bela mulher. Para McKellen, é a segunda vez que ele interpreta um gênio idoso para o diretor Bill Condon. Em Deuses e Monstros, de 1998, da dupla, a representação do diretor James Whale de Frankenstein lhe rendeu um Oscar. Eles se juntaram uma terceira vez, com McKellen terminando recentemente sua participação como o relógio antigo tagarela e inquieto no remake em ação ao vivo da Disney de seu clássico A Bela e a Fera

Muitos papéis de McKellen foram interpretados por muitos outros muitas vezes, mas antes de sua interpretação de Holmes, ele nunca havia sido escolhido para um personagem que fora filmado tão frequentemente. Desde que o lendário detetive foi trazido à tela nos anos 1990, ele tem sido popular, com Robert Downey Jr., Benedict Cumberbatch e Jonny Lee Miller, seguindo os passos de Basil Rathbone e Peter Cushing. 

“Nossas impressões de Sherlock Holmes provêm tanto dos atores que o interpretaram como das histórias propriamente ditas”, informou McKellen. “Sou familiarizado com todas e elas são muito diferentes, não é mesmo?” Ele voltou a Conan Doyle para pesquisar seu papel. O roteiro do filme foi adaptado por Jeffrey Hatcher do romance de Mitch Cullin, A Slight Trick of the Mind (Um leve truque da mente, em tradução livre). Como a história se alterna entre a Londres do pós-guerra, em 1947, e três décadas antes, McKellen representa Holmes em robusta maturidade e em seus anos de declínio. 

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“Foi divertido fazê-lo tanto como um homem no seu apogeu como no começo de sua senilidade”, contou. “Não se deve temer que muitos outros atores tenham tido sucessos notáveis fazendo o papel. Quando se faz Hamlet, ou Romeu ou o rei Lear, alguém já esteve lá antes de você, muitas centenas de vezes.” Foi ao interpretar um personagem idoso em seu tempo de universidade que McKellen chamou a atenção positiva que ajudou a inspirá-lo a seguir uma carreira no palco depois de se formar. 

Uma resenha fulgurante dizia: “Este pode perfeitamente ser um nome a lembrar”. “Quando você lê isso impresso, pensa, ‘Ah! Talvez eu seja suficientemente bom para me tornar ator’. Essa foi uma das principais razões por que eu o fiz”, evitando a vocação de seu pai, um engenheiro civil. “Isto me deu confiança, de modo que continuei fazendo homens com barbas compridas.” Um dos primeiros mentores de McKellen foi o famoso diretor de teatro Tyrone Guthrie, que havia criado o próprio teatro, em Minneapolis. 

Em 1963, Guthrie viajou até a Nottingham Playhouse na Inglaterra para fazer uma montagem de Coriolano de Shakespeare, elevando o inexperiente e nervoso McKellen do pequeno personagem que ele esperava como um não nomeado portador de lança ao papel de coadjuvante. Guthrie leu para o elenco a introdução a uma edição americana da peça que interpretava a tragédia de uma relação de amor e ódio entre o personagem título e seu inimigo jurado no campo de batalha.

Dizendo, “Concordo com tudo que isto diz”, Guthrie quis que McKellen fizesse aquele papel do arqui-inimigo homoerótico numa época em que tal relacionamento era considerado insidioso no teatro e ilegal fora dele. Apesar de Guthrie estar seriamente doente durante os ensaios, envolvido num pesado sobretudo e cachecol, ele encontrou energias para ensaiar os solilóquios de McKellen privadamente. “Ele estava no fim da vida. Estava com um resfriado terrível durante todo o processo, mas foi muito atencioso comigo e muito útil de muitas maneiras”, disse McKellen. “Gostei muito dele e fiquei impressionado por estar na sua companhia. Ele era o maior astro do grupo, o maior diretor de Shakespeare do mundo. Aqueles ensaios individuais foram uma maneira muito sensata de eu não me sentir envergonhado por achar que estava fazendo papel de tolo diante de outras pessoas”, recordou. 

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A produção foi um tremendo sucesso. “Esta produção honra Londres”, exultou uma resenha no New York Herald. “Eu me senti abençoado por trabalhar com ele”, ressaltou McKellen. “Foi o que me levou a fazer o Rei Lear lá”, na turnê da Royal Shakespeare Company de 2007 com lotações esgotadas. McKellen, uma das primeiras celebridades inglesas abertamente gay, tem sido há décadas um defensor dedicado dos direitos LGTB. 

Ele esteve em Nova York no mês passado para promover Mr. Holmes, que deve estrear no Brasil em 12 de novembro, e servir de mestre de cerimônias da Parada do Orgulho LGTB. Falando poucas horas depois da decisão histórica da Suprema Corte que concedeu o direito constitucional ao casamento de pessoas do mesmo sexo, ele disse: “Isto não caiu como um raio de céu azul”. E explicou: “Isso não é o começo. É, na verdade, o fim do processo. Mostra que as pessoas que estiveram defendendo a questão por anos e anos estão certas. Foi o que ocorreu hoje. A Suprema Corte foi ao encontro do restante dos Estados Unidos”. 

“Isso não significa que tudo esteja resolvido, porque os velhos preconceitos são duros de acabar e precisam ser tratados quase de caso a caso, de costa a costa, de família a família. Mas, por enquanto, há uma alegria palpável nas ruas de Nova York. Agora vou sair para a rua para ver o que está havendo, e ver a alegria nos rostos das pessoas, eu espero.” / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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Confira o trailer de Mr. Holmes

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