Literatura e cinema em 'Nome Próprio', com Leandra Leal

Atriz fala da carreira e do filme, com a história de uma garota, aspirante a escritora, que escreve um blog

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio , Patricia Villalba e de O Estado de S. Paulo
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Como nas guerras ou nas tramas de espionagem, há muita desinformação em torno de Nome Próprio, novo longa-metragem de Murilo Salles. Ok, é baseado, ou inspirado, nos livros Máquina de Pinball e Vida de Gato, além de textos de blogs de Clarah Averbuck. A autora, que afeta personalidade difícil, não gosta de ser chamada de blogueira. É escritora. Certo. Não se sabe também se gostou ou não da versão de seus textos para a tela. Afinal, participa de debates de lançamento com o diretor, e fez restrições ao filme no blog - o atual Adios Lounge (adioslounge.blogspot.com). O quanto de sinceridade existe nisso tudo, ou é apenas um daqueles casos em que o autor fica tomado pelo personagem?   Veja também: Trailer de Nome Próprio    Bem, existem algumas aproximações entre Clarah e Murilo, uma delas em particular - ambos adoram John Fante. Como ela não escreveu Pergunte ao Pó, e ele não o filmou, encontraram-se em torno da Máquina de Pinball. Se você notar proximidade temática e de estilo entre Averbuck e Fante não terá sido mera coincidência. Todo mundo gosta de Fante. Bukowski gostava.   Como fica, então? Melhor prestar atenção no filme e deixar essas falsas polêmicas para lá. A história é a de uma garota, Camila (Leandra Leal), aspirante a escritora e que se exercita em seu blog, postando impressões do cotidiano. Aliás, cotidiano dos mais movimentados porque Camila é uma espécie de Arturo Bandini (personagem de Fante) ou Bukowski de saias. Bebe como um estivador, fuma, toma bolinhas, dorme com meia São Paulo.   Percebe-se que Murilo desejou fazer um estudo do desespero juvenil contemporâneo. Na era da internet - quer dizer, num tempo em que a obsessão em comunicar-se apenas camufla o fato de que nunca as pessoas foram tão isoladas em si mesmas. O filme é deliberadamente "sujo" (nunca embeleza situações ou cenários), fotografa em registros frios e claustrofóbicos. Pouco sai à rua; não se vê o horizonte. Quase todo o tempo é passado nos apartamentos precários onde mora a moça, ou em botequins que freqüenta. Na proposta, o filme é interessante. Para enfrentá-lo, o espectador vê-se obrigado a conviver 1h54 com uma personagem literalmente insuportável.   A visão do autor sobre a juventude da internet não é muito suave. Camila parece um valentão de bar, dotado de um centro frágil como cristal. Procura construir-se pela escrita. É seu trunfo e possível salvação. Não sabemos se a autora conseguiu enxergar-se na personagem. Não interessa. Importa é o sentimento que ela desperta em nós, espectadores - um misto de irritação e ternura.   Entrevista com Leandra Leal, por Patrícia Villalba     Meio de piada, Leandra Leal diz precisar do ócio criativo para viver. É por isso que, apesar dos mil elogios que costuma receber quando está no vídeo, ela não costuma emendar uma novela na outra. Deu até tempo de a gente perguntar "cadê a Leandra Leal, que não faz mais novela?", até ela aparecer como a adorável Elzinha, da novela das 6 da Globo, Ciranda de Pedra, ou como a perturbada Camila, de Nome Próprio, filme de Murilo Salles que estréia nesta sexta, 18. São dois papéis radicalmente opostos - uma mulher dos anos 50, outra contemporânea; uma solar, outra obscura; uma bonita, outra nem tanto -, que demonstram a capacidade de Leandra de tornar de carne e osso tanto uma pin-up arrumadinha quanto uma aspirante a escritora descabelada.   Atriz desde os 8 anos, hoje com 23, é conhecida no meio pelo profissionalismo e personalidade forte. Ela tem uma voz doce, mas impõe grande respeito ao interlocutor. "Leandra tem o brilho das grandes intérpretes, e mergulha fundo na composição da personagem. Sua Elzinha é prova disso. Foi uma das primeiras atrizes escaladas, todo mundo a queria", elogia o autor Alcides Nogueira.   Além de Ciranda de Pedra e Nome Próprio, Leandra poderá ser vista como a Ritinha de Bonitinha Mas Ordinária, de Moacyr Góes, previsto para janeiro. Antes tem uma "participaçãozinha micra" no novo longa de Eduardo Belmonte, Se Nada Mais Der Certo, que estréia no segundo semestre. E volta a produzir e dirigir Mercadorias e Futuro, em agosto, onde trabalha ao lado do marido, José Paes de Lira, o Lirinha. Em meio às gravações da novela, a atriz conversou com o Estado ao telefone.   Você não está o tempo todo na TV, como as atrizes da sua idade que conseguem a mesma projeção. É circunstancial ou intencional? Não sei se consigo trabalhar muito o tempo inteiro, preciso de um tempo de férias. Gosto de fazer umas viagens entre um trabalho e outro. E tem os projetos pessoais, além dos em cinema e teatro, que tomam bastante tempo. Por isso não dá para se dedicar o tempo todo a uma coisa só - fazer uma peça atrás da outra, um filme atrás do outro, nem uma novela atrás da outra.   Mas você tem uma diretriz para aceitar papéis? Não, analiso um a um. O ator sempre é convidado, né? Por isso que quando tive vontades maiores de fazer certo tipo de coisa, comecei a produzir. Mas não tenho uma diretriz. Não sei bem aonde quero chegar.   Ainda faz testes? Claro, acho normal fazer teste. Não é para avaliar sua capacidade, mas para ver se o que o diretor tem na cabeça pode ser feito por você. Para Ciranda de Pedra, especificamente, me chamaram, porque eu já tinha feito (a minissérie) A Muralha com a Denise (Saraceni).   Você atua, dirige, escreve e produz. O que representa, então, estar na TV para você? Muitas coisas, desde eu conseguir captar dinheiro para os meus projetos até como um lugar onde as pessoas podem ver meu trabalho. Estou na TV desde os 12 anos, e adoro. Esse conceito de "ator de TV" é uma coisa bem paulista. Em São Paulo, há atores que sobrevivem sem TV, mas no Rio não tem isso. Eu não tenho isso, não. Não sou atriz de lugar nenhum.   A Elzinha de 'Ciranda de Pedra' tomou um espaço grande, chamou bastante a atenção. Como foi a composição, qual a sua participação nela? Em primeiro lugar, o texto da Elzinha é muito bom. Ela já é forte no texto, que deu uma boa base para os que trabalharam na composição. E o figurino que a Gogóia (Geórgia Sampaio, figurinista da novela) fez ajudou bastante. Fui ver muito filme de época, até para saber como me movimentar. No início, tinha muito cuidado com o jeito de andar, parar, falar e com os gestos. Nos dois primeiros meses, não fiz nada além de estudar isso, foi bem difícil. Há um limite muito pequeno para não cair no caricato.   A Elzinha é uma mulher de época, e você disse que ela é bem distante de você. É na Camila de Nome Próprio que você se reconhece mais? Temos coisas em comum. Talvez me lembre um pouco o que eu fui mais adolescente, apesar de ela ter 20 e poucos anos, essa coisa mais sofrida. Mas, sem dúvida, temos em comum o tempo e as questões que rondam a mulher contemporânea.   Não passa, então, por aquelas crises de "ah, como dói criar"... Isso eu até tive um pouco, mas quando era mais nova. Mas não tenho essa coisa de me expor de uma maneira meio autodestrutiva como ela. A Camila tem a vida misturada com a arte de uma maneira muito forte. Não é uma necessidade de aparecer, ela é uma figura angustiada mesmo e utiliza sua vida como matéria-prima.   Já ouvi gente dizendo que você precisou de coragem para fazer o filme, por causa da quantidade de cenas de nudez. Para você, foi mesmo um ato de coragem? Acho que a gente tem de ter coragem para tudo hoje em dia. Se você não se entrega ao seu trabalho, em que vai se entregar? Costumo dizer que, no filme, estou o tempo inteiro nua, mesmo quando estou vestida.      

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