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Jeremy Irons, de 'O Homem Que Viu o Infinito', diz que sua casa é local onde se encontra no momento

Em cartaz no Brasil, o drama fala da amizade de Ramanujan, um gênio autodidata da matemática da Índia, e G.H. Hardy, excêntrico professor da Universidade de Cambridge.

Por Ruth La Ferla
Atualização:

NOVA YORK - Jeremy Irons tem uma casa em Londres, outra em Oxfordshire e um castelo do século 15 em Cork, na Irlanda, pintado de uma cor que os vizinhos reclamões juram ser cor-de-rosa. “Ficaram doidos da vida, mas não é rosa; é a cor da alga fresca e se mistura com a paisagem marinha à sua volta”, explicou o astro quando esteve, recentemente, em Nova York.

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A julgar pelo visual cansado, tudo indica que Irons não deve ter passado muito tempo na propriedade neste último ano. Uma agenda atribulada de filmagens e a consequente publicidade o levaram a rodar o mundo e também a ir a Washington como o grande destaque da sessão para exibição de seu último filme, O Homem Que Viu o Infinito, na Casa Branca. Em cartaz no Brasil, o drama fala da amizade de Ramanujan, um gênio autodidata da matemática da Índia, e G.H. Hardy, excêntrico professor da Universidade de Cambridge.

Considerando-se todas as viagens que fez para vender o longa no qual interpreta G.H. Hardy, Irons teria mais é que se sentir completamente perdido. “De jeito nenhum”, ele garante. O ator de 68 anos faz de seu passatempo, na verdade, sua paixão, transformar a suíte de hotel ou a casa alugada que lhe cabem com todos os confortos de um trailer de férias. E lhe dirá que a sua casa é o lugar onde se encontra no momento.

Astro. Hoje cobiçado por diretores, Jeremy queria fazer parte de circo quando era garoto. Foto: An Rong Xu/The New York Times

“Eu costumava viajar levando muitas echarpes chinesas, que comprei em Hong Kong, com uns bordados lindíssimos. E pendurava em tudo quanto era lugar”, conta.

A turnê publicitária extensa – devido, em parte, às ambições pelo ouro do Oscar – o força a levar uma bagagem mínima. No Lowell Hotel de Upper East Side, onde conversamos em meio a algumas doses de bourbon (Eagle Rare) e cigarros com sabor de alcaçuz, ele parecia se virar muito bem com a decoração sóbria: cadeiras forradas de damasco, divãs macios e uma escrivaninha de cerejeira. Já seu visual, seguindo a linha rústica com um casaco meio gasto e botas espanholas, se mostrava à altura da grandiosidade do ambiente, apesar de um pouco deslocado. Como o violão ao pé da cadeira. E Smudge, a simpática cachorrinha, mistura de Jack Russell/bichon frisé, que vai a todo lugar que Irons vai. Nem um pouco tímida, ela pula da cama assim que é chamada para uma sessão de fotos.

“Desculpa, Smudge, por fazê-la se submeter a isso. Olhe para cima, assim. Tente ficar de olho ali na galeria. Cabeça erguida – isso mesmo!”, brinca ele.

Objeto de desejo de muitos diretores e esteta confesso, Irons trabalhou em um antiquário para pagar a escola de arte dramática. E admite ainda ter uma ligação mística com os objetos, entre eles uma poltrona que comprou em Bristol – à qual, inclusive, acrescentou uma almofada elegante e cara. Tem também a moto BMW, que usa quando está na Inglaterra e com a qual vai até para os ensaios. “Eu converso com ela. Tenho que me desculpar quando fico longe muito tempo ou uso a moto de outra pessoa.”

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Essa sua tendência espiritual vem da infância, passada na Ilha de Wight, onde seu pai era contador. Católico, acreditava – e, de fato, ainda acredita – na força das boas ações. Uma vez, chegou a ajudar uma paróquia no sul de Londres, com visitas aos fiéis doentes e idosos, incursões musicais no órgão da igreja e a administração do clube juvenil.

Havia distrações irresistíveis: nas noites de folga, Irons circulava pelo West End com o violão às costas. “Vira e mexe uma garota puxava papo”, conta. E descobriu que o visual de trovador era irresistível. “Era uma maneira maravilhosa de atrair as meninas que, até então, viviam num mundo de sonho na minha cabeça.”

Na escola só para meninos que frequentava, tocava em um grupo de rock chamado The Four Pillars of Wisdom. E se recorda de que o baixista fazia sucesso com as fãs enquanto ele mesmo não tirava o olho do chão. “Eu nunca nem tinha conversado com uma menina. Não tinha a mínima experiência nessa área”, lembra.

O que é difícil de imaginar, uma vez que não parece deixar que o casamento de quase 40 anos com a atriz irlandesa Sinead Cusack abafe sua reputação de garanhão, a mesma que fez com que seu nome aparecesse nos tabloides inúmeras vezes, ligado a várias beldades. Entretanto, foi um Irons aparentemente contido que disse a esta repórter que casos extraconjugais não fazem bem para a saúde mental de ninguém.

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Mas é claro que mantém e aprecia alguns vícios. “Não gosto de regras; faço questão de violar tantas quanto posso. Para mim, é o que dá emoção à vida”, ressalta o ator.

Quando garoto, chegou a pensar em fazer parte de um circo. “Mas aí, numa ocasião, fui dar uma espiada nas barracas e descobri que a grande maioria dos funcionários dormia em cabines, com dois beliches em cada uma. Pensei: ‘Sou muito classe média para isso’.”

Em comparação, o teatro parecia um luxo. “Adorava o fato de poder me levantar às dez da noite e ir dormir às duas da tarde, tipo, na contramão do resto do mundo. Adorava os cheiros, a atitude, o fato de parte dos meus colegas serem tão inseguros, o que os tornava extremamente abertos”, recorda o

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A boemia lhe agradava. E diz se identificar com a época, já distante, em que “os atores não tinham que votar e volta e meia eram presos”. “Era um bando de desacreditados, de vagabundos e trambiqueiros”, descreve, parecendo se divertir com a lembrança.

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E o espírito rebelde que subsiste se mostra cético em relação ao estado da política norte-americana. “Vi todos os debates e fiquei superdeprimido”, confessa. E depois de criticar o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, interceptou um olhar da assessora de imprensa, Sally Fisher, sentada, vigilante, no sofá ao lado. “Ela não gosta que eu fale de política”, dispara.

Ele pode até falar de problemas, mas não do que lhe vai no íntimo. “Uma vez, há muito tempo, comecei a fazer terapia. A psicóloga ficava fazendo perguntas e eu só pensando: ‘Não é da sua conta. Não quero falar sobre isso’. Depois de alguns minutos, ela disse: ‘Acho que você ainda não está preparado’.”