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Governo encerra parceria PIC-TV

Governo corta recursos que ajudaram a realizar 48 filmes através do Programa de Integração TV-Cinema (PIC-TV). Cineastas estão desolados. A simples presença da TV Cultura no projeto dava mais credibilidade e ajudava a atrair o financiamento de empresas privadas

Por Agencia Estado
Atualização:

O PIC-TV (Programa de Integração TV-Cinema), uma das mais bem-sucedidas parcerias entre cinema e televisão acaba de chegar ao fim. Sem aviso prévio, o governo estadual simplesmente cortou os recursos que ajudaram a produzir 48 filmes. Isso ocorre no momento em que mais se discute a participação da televisão na produção de filmes, com a parceria entre a Rede Globo e a Colúmbia, e também com o estrondoso sucesso de O Auto da Compadecida. Desde que o PIC-TV foi criado, em 1996, o programa abriu as portas da TV aberta para dezenas de produções. A simples presença da TV Cultura no projeto dava mais credibilidade e ajudava a atrair o financiamento de empresas privadas. Ivan Isola, responsável pelo PIC, não esconde a contrariedade com o fim do programa, embora alimente a esperança de vê-lo ressurgir. "Não havia verba para este ano e, como se tratava de um convênio, o governo resolveu deixar o PIC em suspenso, apesar dos bons resultados que obtivemos." O PIC-TV não apenas financiava parcialmente os filmes, mas também ajudava a complementar o orçamento das produções junto a outras estatais. "Para cada R$ 1 milhão que investíamos num filme, o PIC alavancava outros R$ 2,4 milhões em recursos incentivados", afirma Isola. Além disso, garantia a exibição de chamadas na TV enquanto o filme estivesse em cartaz e a posterior exibição na própria TV Cultura. O filme Ação Entre Amigos, do diretor Beto Brant, considerado um dos melhores feitos com verba do programa, estava orçado em R$ 1,5 milhão. O PIC entrou com R$ 300 mil, conseguiu R$ 267 mil junto ao Banespa e outros R$ 80 mil com a Sabesp, totalizando quase a metade do total necessário. O restante foi obtido junto à iniciativa privada. Já o filme Domésticas, de Fernando Meireles, atualmente em cartaz, orçado em R$ 1,2 milhão recebeu R$ 150 mil do PIC-TV e outros R$ 65 mil do Banespa, completando o orçamento por intermédio de empresas, pela Lei do Audiovisual. No meio cinematográfico, o clima é de tristeza, com uma pitada de revolta. Em São Paulo, praticamente não há um único cineasta conhecido que não tenha recebido apoio do PIC-TV, de Hector Babenco a Ugo Giorgetti. O diretor Carlos Reichenbach, por exemplo, não se conforma. "O PIC era a única forma transparente de financiamento para os filmes. Os projetos eram analisados sem interesses políticos e isso possibilitou a produção de um leque bastante abrangente, do filme experimental a produções de sucesso." Para ele, o fim do PIC pode ser o começo de outra morte do cinema brasileiro. "Projetos que tenham interferência política e burocrática não têm futuro e as produções com parceria da TV Globo só vão produzir lixo cultural." Giorgetti (Sábado, Boleiros) também lamentou o fim das atividades, embora ache que a decisão ainda não é definitiva. "Para mim, essa notícia é devastadora, mas vou lutar com todas as minhas forças para que continue, pois não houve um comunicado oficial encerrando o PIC, apenas um corte de verba", afirma. Para ele, o programa tinha uma maneira moderna de se relacionar com o projeto, que era analisado individualmente. "O filme não era escolhido por um júri, mas por duas ou três pessoas convidadas a dar um parecer apenas sobre aquele projeto." Ana Carolina (Amélia) lamenta que o cinema brasileiro tenha que viver de ciclos. "O PIC-TV deveria ser uma coisa mais duradoura. É um modelo de relação com a TV aberta que deveria ser aperfeiçoado, não extinto." Carolina, que teve parte do orçamento de Amélia obtida com a ajuda do PIC, só tem elogios ao projeto. "Fui selecionada da maneira mais profissional possível todo o dinheiro saiu dentro dos prazos, nunca houve exigências descabidas... Não posso acreditar que uma experiência dessas caia por terra." Ela deixa uma pergunta no ar: "Por que a secretaria do Audiovisual, no lugar de investir em uma TV fechada, não coloca dinheiro num projeto como o PIC?" Ivan Isola garante que não entregou os pontos e vai lutar para criar a Cultura Filmes, que seria um braço da TV Cultura destinado à produção de filmes. "Teria os mesmos moldes do PIC-TV, mais eficiente e sem os defeitos." Segundo ele, a produtora seria um departamento da emissora. "Ela teria uma verba anual, da mesma forma que o departamento de jornalismo, por exemplo", explica. A Cultura Filmes incorporaria os estúdios da Vera Cruz, que estão em fase de construção e incluem uma escola de cinema. Com isso, o programa deixaria de vez as incertezas do convênio para ter a garantia e a solidez da TV Cultura. "A Cultura Filmes representa uma evolução do PIC-TV e é uma alternativa que merece ser estudada", garante Ugo Giorgetti. Isola lembra ainda que os filmes já em fase de produção não estão ameaçados. "O dinheiro deles está assegurado." Além disso, o programa continuará recebendo verbas da comercialização dos filmes produzidos, cujos direitos pertencem à TV Cultura por dez anos.

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