CANNES – Talvez para compensar o fato de que, nestes 70 anos de Festival de Cannes, apenas uma mulher tenha recebido a Palma de Ouro – Jane Campion, por O Piano –, a organização do evento tem colocado mulheres na presidência do júri da mostra Un Certain Regard, que integra a seleção oficial.
Depois de Marthe Keller e Isabella Rossellini, Uma Thurman ocupou o posto em 2017. “Foi uma presidente trabalhadora”, definiu o diretor artístico Thierry Frémaux.
Na hora de anunciar os prêmios, Uma antecipou que as escolhas haviam sido diversificadas, mas esclareceu que não houve nenhum desejo de composição.
A própria qualidade da seleção determinou que assim fosse. E vieram os prêmios – o do júri para Michel Franco, por Las Hijas de Abril; direção, para Taylor Sheridan, por Wind River; interpretação, um só prêmio, para a italiana Jasmine Trinca, por Fortunata, de Sergio Castellitto; um novo prêmio definido como ‘Poesia do Cinema’, para Mathieu Amalric, por Barbara; e – cereja do bolo – melhor filme para o iraniano Lerd, Um Homem Íntegro, de Mohammad Rasoulof.
Na sequência, passou o filme vencedor. É excelente, melhor que muita coisa vista na competição.
Passa-se em algum momento da história recente do Irã, sob a condução do aiatolá Khomeini. Rememorando – exilado na França, Khomeiuni comandou à distância o movimento que paralisou o país, tomou conta das ruas e levou à deposição do governo imperial do Xá Reza Pahlevi.
Entre outras coisas, o Xá foi deposto porque se afastou da tradição, se uniu ao Ocidente (EUA) e, como seus ministros, era acusado de corrupção.
Será mera coincidência que o protagonista se chame Reza? É um homem íntegro, exceção num país que, sob a salvaguarda da religião e da moralidade, afundou de vez na corrupção. Qualquer semelhança com a atual situação do Brasil fica por conta e risco do leitor.
Mesmo sem ser um filme de tese – é muito bem escrito e realizado. O diretor levanta uma questão importante. É possível enfrentar a corrupção sem se corromper? Fazer alianças sem se comprometer e sujar as mãos? Até onde vai a tal integridade?
Lerd é das melhores coisas vistas nesse festival. Rasoulof faz uma crítica dura do Irã. Considerando-se o estado do país, há que torcer para que não venha a ser tratado como inimigo do regime, como Jasfar Pasnahi.
Os Premiados
Filme: Lerd - Um Homem Íntegro, de Mohammad Rasoulof
Direção: Taylor Sheridan, por Wind River
Poesia do Cinema: Bárbara, de Mathieu Amalric
Atriz: Jasmine Trinca, por Fortunata
Prêmio do Júri: Las Hijas de Abril, de Michel Franco