'Fay Grim' vê os Estados Unidos com olho mordaz

Hal Hartley faz obra inteligente que testemunha intriga internacional e critica com humor a América de Bush

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten e do Estado de S. Paulo
Atualização:

É bom que esses filmes estejam assim, lado a lado, porque Fay Grim e Promessas de Um Cara-de-Pau, apesar de todas as suas diferenças, compartilham o mesmo desejo, de seus diretores, de dar um testemunho sobre os EUA, na atualidade. Fay Grim envolve a personagem numa daquelas intrigas de humor tão sutil quanto mordaz, das quais o diretor Hal Hartley há anos possui o segredo. A novidade é que Hartley agora relaciona a personagem de Parker Posey com agentes secretos e velhos revolucionários (reacionários, também) para refletir sobre a crise de identidade da ‘América’, sob George W. Bush. De uma forma mais simples e direta, Promessas de Um Cara-de-Pau fala sobre o processo eleitoral e radicaliza a questão da responsabilidade individual. O foco é na eleição presidencial norte-americana, mas pode servir para a municipal em São Paulo, por que não?   Veja também: Trailer de Fay Grim      Cinéfilos de carteirinha devem lembrar-se de que, nos anos 90, Hal Hartley era um dos diretores mais CC - cool e cult - do cinema dos EUA. Para muitos críticos, ele era a própria cara da produção independente no que tinha de mais ousado. Avesso às formas narrativas tradicionais, Hartley conquistou adeptos por sua crítica mordaz ao modus operandi da sociedade norte-americana em filmes como Simples Desejo, Amateur e Flerte. Em 1997, ele fez As Confissões de Henry Fool, do qual Fay Grim é a seqüência. Só para lembrar, Henry Fool ganhou o prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes. Além de escrever bem, e de forma concisa, para o cinema, Hartley disse aqui mesmo em São Paulo, onde foi jurado da Mostra Internacional naquele ano, que compunha, musicalmente, as imagens, mais do que as filmava. Antes de falar sobre Fay Grim, a ‘viúva’ de Henry Fool, talvez seja interessante traçar um perfilzinho rápido do sujeito desconhecido que chegava a uma cidade dos EUA para subverter a vida de todos. O próprio Hartley definiu certa vez Henry como um diabo contemporâneo não sobrenatural. Na seqüência, o diabo desapareceu há tempos e não deixou muita saudade na mulher, Fay, irmã do poeta Simon, de quem Henry era grande amigo. Simon está na cadeia e o filho de Fay (e Henry) começa o filme tendo problemas na escola, por seduzir os colegas de aula com uma engenhoca que reproduz uma orgia em movimento. Henry deixou alguns cadernos, e é a posse desses cadernos que desencadeia uma verdadeira intriga internacional. De repente, são vários agentes buscando os segredos contidos nesses cadernos que remetem ao 11 de setembro, no Chile, quando a CIA ajudou a depor o presidente constitucional Salvador Allende - porque sua política econômica não beneficiava os EUA, explica o agente Jeff Goldblum. Outros episódios controvertidos dos anos 60 e 70 também estão ali documentados. A narrativa salta para a França, sempre econômica e nunca com o formato de um thriller tradicional. E mais - Henry pode estar vivo. O resultado é um filme minimalista inteligente e simpático, no qual dá gosto ver como Hartley resolve os problemas de produção. Fay Grim é um compêndio da produção barata, e este é seu maior charme.   Fay Grim (EUA-Alemanha/2007, 118 min.) - Suspense. Dir. Hal Hartley.  16 anos. Cotação: Bom

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.