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Análise: Nelson Pereira dos Santo colocou o País na tela e revelou o brasileiro como um guerreiro

Na produção do cineasta havia o desejo de colocar o Brasil na tela e revelar o brasileiro não como homem cordial

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Cacá Diegues, que foi companheiro de Nelson Pereira dos Santos no Cinema Novo, escreveu um texto lindo sobre ele. Disse que Nelson, como todo grande artista, é uma luz que ilumina a criação de um povo, um marco cultural da história do seu tempo e do tempo que virá dele. 

Nelson morreu no sábado, 21, aos 89 anos, de falência múltipla dos órgãos. Ele estava internado desde o dia 12 de abril, no Rio, com sintomas de pneumonia e, durante exames médicos, foi descoberto um câncer no fígado.

Nelson, tendo escolhido o cinema como meio de expressão, foi estudar cinema nas França Foto: TIAGO QUEIROZ/AE

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Glauber Rocha morreu com 42 anos, Leon Hirszman, com 49, Joaquim Pedro de Andrade, com 56. Nelson conseguiu sobreviver a todos. Viveu mais, produziu mais. Talvez tenha errado mais, mas sua obra, por desigual que seja, possui uma unidade – o desejo de colocar o Brasil na tela e revelar o brasileiro não como homem cordial, mas como um guerreiro que não se rende às circunstâncias. Nelson, tendo escolhido o cinema como meio de expressão, foi estudar cinema nas França, no pré-nouvelle vague. De volta ao País, e impregnado pelo neorrealismo, fez o díptico Rio 40 Graus e Rio Zona Norte.

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Em 1963, e usando o próprio livro de Graciliano Ramos como roteiro, fez de Vidas Secas uma experiência seminal – e um marco na estética da fome do Cinema Novo. Passaram-se 21 anos e, em 1984, com outra adaptação de Graça, Nelson produziu outra obra-prima, Memórias do Cárcere.

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São, talvez, seus maiores filmes, mas o conjunto de suas obras, lançado em DVD – Nelson Pereira dos Santos, Vol. 1 e 2 –, resgata aquilo que Cacá chama de luz que não se apaga. El Justiceiro, o seu Rio Zona Sul; o antropofágico Como Era Gostoso o Meu Francês; O Amuleto de Ogum. Adaptou grandes escritores e pensadores do Brasil – Machado de Assis, Graciliano, Jorge Amado, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda. Não admira que tenha sido eleito, em 2006, para a Academia Brasileira de Letras. Poderia integrar também a Academia de Música, fundada por Villa-Lobos, por seus documentários sobre Zé Keti e Tom Jobim.

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Cada um, cada crítico, cada cinéfilo, terá o seu Nelson, mas nesse momento de reflexão – e despedida – o importante é destacar duas obras maiores que ainda permanecem numa espécie de limbo. Fome de Amor, de 1968, ano mítico, foi seu filme mais experimental e plástico. Na Estrada da Vida, de 1980, com Milionário e Zé Rico, foi, pelo contrário, nacional e popular, no sentido gramsciano. O artista, o próprio Nelson, como um trabalhador.

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