PUBLICIDADE

A beleza e o caos na fotografia de Polidori

O canadense, radicado em Nova York, abre mostra retrospectiva hoje no Rio

Por Roberta Pennafort
Atualização:

Paredes amarelas furadas de balas da guerra do Líbano. Automóveis "estacionados" sobre casas depois da passagem do furacão Katrina por New Orleans, nos Estados Unidos. Objetos e roupas as mais coloridas amontoados pelo chão de apartamentos saqueados em Nova York. Fachadas e interiores de imponentes construções de Havana caindo aos pedaços. São fotografias que revelam situações de tragédia, violência e abandono. No entanto, existe algo de belo nelas. Para o fotógrafo canadense radicado em Nova York Robert Polidori, de 58 anos, autor dessas imagens, é mesmo paradoxal a noção de beleza na modernidade. "Gosto desse paradoxo. As pessoas são atraídas pelas fotos por achá-las bonitas, mas, quando as veem de perto, percebem que não são", ele explica. "O caráter humano é mais baseado na tragédia do que na felicidade. Quando eu estava em Beirute, via que os moradores queriam preservar as marcas da guerra. Diziam: ?É tão bonito!? Quando você sofre muito e sobrevive, sente-se orgulhoso, passa a curtir a dor que sentiu." Polidori está no Rio esta semana para a abertura de sua primeira retrospectiva na América Latina, que será hoje à noite, no Instituto Moreira Salles, na Gávea (R. Marquês de São Vicente, 474, tel. 21 3284-7400). Às 18h30, fará uma palestra no auditório do centro cultural. A exposição - que segue para o Museu da Casa Brasileira, em setembro - é composta de 69 fotos, às quais é impossível lançar um olhar indiferente. Ele se dedicou a estes ensaios nos anos 80, 90 e 2000. Em Pripyat e Chernobyl, na Ucrânia, registrou, em 2001 (passados 15 anos, portanto, do pior acidente nuclear da história, que afetou mais de 200 mil pessoas), a usina desativada, a sala de cirurgia e a maternidade de um hospital destruídas, o berçário, o jardim de infância e a escola sem nenhum sinal de vida. À capital cubana ele foi em 1997; por New Orleans, passou em 2005, o ano em que o Katrina devastou a cidade e matou cerca de 1.500 moradores. Parte dessas fotos estava em New Orleans After The Flood, mostra que ocupou o Metropolitan Museum of Art, de NY, em 2006. "Nova Orleans foi a experiência mais difícil fisicamente, porque o cheiro era muito ruim, por conta do mofo e dos alimentos apodrecidos", ele lembra, citando ainda o ensaio na Ucrânia como um divisor de águas em sua vida. "Antes de ir, eu acreditava em Deus; depois, não. Constatei que todos estamos sozinhos neste mundo." O interesse por retratar este tipo de cena surgiu por volta de 1985, quando, por intermédio de um corretor imobiliário, conheceu um prédio, em NY, que estava com três apartamentos arrombados por jovens da vizinhança. Seus proprietários haviam morrido e os garotos os invadiram. Quebraram tudo e foram embora sem roubar quase nada. "Percebi que o que sobra de uma vida não tem valor para ninguém: os quadros nas paredes, as roupas que se vestia..." Naquela época, foi atraído também pelo Palácio de Versalhes, a 21 quilômetros de Paris, e os constantes processos de restauração pelos quais passa. Polidori o vem fotografando até hoje. Ao observar esse conjunto, percebe-se que, para Polidori, a questão do tempo é fundamental. "Não é só o abandono o que eu estou procurando, mas as camadas de tempo, uma sobre a outra. É difícil achar profundidade de significado em algo que é muito novo. É como a memória. Um bebê não tem memória alguma, não sabe nada. Acontece o mesmo com uma casa nova." Fotógrafo de arquitetura há 30 anos, Robert Polidori nasceu em Montreal, mas viveu toda a vida nos Estados Unidos. Já colaborou com revistas como The New Yorker, Newsweek e Vanity Fair. As fotos que vieram para o Brasil foram publicadas em livros de arte que ele vem lançando desde os anos 90. Seu trabalho já havia integrado mostras coletivas realizadas por aqui em 2008 e 2000.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.