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Partituras sem contratempos

Há 59 anos, o sonho começava em uma caverna escura.

Num 16 de janeiro, há 59 anos, o empresário Alan Sytner, um amante do jazz, abria em Liverpool o Cavern Club. Mal sabia ele que aquele porão abafado e úmido iria se transformar no mais reverenciado templo do rock mundial. O Cavern foi a casa dos Beatles entre 1961 e 1963, onde se apresentaram 292 vezes. Demolido e reconstruído, hoje ele sobrevive menos como casa de espetáculos e mais como ponto turístico de Liverpool. Perdeu o velho charme. Mesmo assim, longa vida ao Cavern.

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Por Carlos de Oliveira
Atualização:

A Liverpool dos anos 50 era uma espécie de espectadora passiva do intenso vaivém de navios que cruzavam o Atlântico, agora livre dos U-Boats, os temíveis submarinos nazistas. A guerra havia recém-terminado e existia no ar uma certa sensação de recomeço. Cada navio que chegava ao porto era uma possibilidade de vida nova. Eles traziam materiais para a reconstrução da Europa, ofereciam empregos e promoviam um intercâmbio cultural baseado especialmente na música.

Os então Siver Beatles na porta do Cavern Club, em 1962. Ringo ainda não havia chegado à banda.  Foto: Estadão

No Cavern Club, um início de carreira sem pompa nem circunstância  Foto: Estadão

Filas imensas formavam-se na porta do Cavern. Todos queriam ver os Beatles.  Foto: Estadão

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Para compensar a solidão das viagens pelo mar, marinheiros que vinham da América traziam em suas bagagens discos de 78 rotações e o jazz rolava em suas vitrolas. No porto, a música era moeda de troca e gerou negócios. Um deles viria a se tornar o templo do sonho, o lugar onde tudo começou.

Foi o empresário Alan Sytner que teve a ideia de aproveitar o porão escuro e úmido de um prédio velho situado na 10 Mathew Street, que mais parecia uma caverna, e transformá-lo em um clube de jazz, abrindo suas portas no dia 16 de janeiro de 1957. Nascia o Cavern Club, que antes teve os sugestivos (e supostamente elegantes) nomes de Paris Jazz Club e Le Caveau De La Huchette.

Na primeira noite de espetáculos tocaram no Cavern as bandas The Merseysippi Jazz Band, The Wall City Jazzmen, Ralph Watmough Jazz Band e The Coney Island Skiffle Group. Acredita-se que pelo menos 600 pessoas espremeram-se no interior do clube e outro tanto nas filas que se formaram ao longo da Mathew Street.

Dois meses e 15 dias depois de sua inauguração, um certo Richard Starkey subiu ao minúsculo palco do Cavern para tocar bateria com o Eddie Clayton Skiffle Group. Menos de dois meses depois, um rapaz de nome John Winston Lennon faria o mesmo com a sua Quarry Men Skiffle Group. Em janeiro de 1958 foi a vez de Paul McCartney tocar no Cavern, já como integrante do Quarry Men.

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Algumas coincidências fizeram com que eles agregassem à banda um menino de 17 anos de nome George Harrison, um baterista tido como bonitão chamado Pete Best e um escocês intelectual de nome Stuart Sutcliffe. Em agosto de 1960 foram tocar nos inferninhos da  Reeperbahn Strasse, em Hamburgo, Alemanha, e comeram o pão que o diabo amassou. De volta a Liverpool, já eram os Silver Beatles e foram tocar no Cavern. Lá eles se apresentaram 292 vezes, entre 1961 e 1963. Lá eles conheceram um empresário chamado Brian Epstein, Richard Starkey transformou-se em Ringo Starr e todos juntos viraram os Beatles. O resto é história e sonho.

Uma sombra - O Cavern continuou ativo por mais dez anos e lá se apresentaram nomes famosos como os Rolling Stones, os Yardbirds e o Queen. Em 1973 o Cavern fechou suas portas e o prédio foi demolido. Onze anos depois ele foi reconstruído com parte dos tijolos originais, na mesma rua, só que quinze metros à frente. Em 1989, em crise, fechou novamente suas portas para reabri-las um ano e meio depois. Bem em frente ao Cavern atual fica o Cavern Pub, com um estátua de gosto bastante duvidoso de John Lennon à porta. O velho Cavern Club virou turismo. O de hoje não é nem sombra do que costumava ser.

Veja os Beatles no Cavern, em 1962:

 

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