No movimento cíclico que é a evolução social humana, essa janela se fechou. Amor e dor, amor ou dor, estão lá fora. E a gente? Seguimos fechadinhos em nossos quartos, no escuro ou iluminados por uma luz amarelada e artificial. Protegidos. Seguros.
Confortáveis no dessentir.
O que pede a banda Homens de Melo, no seu disco de estreia, homônimo, lançado com exclusividade no blog, é que essa janela se abra novamente. Sinta. Coragem.
"Janela aberta por fresta ou completa / Por onde o sol entra com todo esplendor / Deixe com o vento entrar o amor", diz a estrofe de Cem Anos, a segunda faixa do álbum.
A celebrar os dez anos de existência, a banda formada por Gabriel Sielawa (voz), Rafael Pessoto (guitarra), Luise Martins (baixo) e Rodrigo Leal (bateria) se esparrama em gritos de esperança em tempos sombrios e de clausura.
Ao longo de 31 minutos, as canções do grupo se guiam pela abordagem sem excessos. Sob a batuta de Diego Xavier, da banda BIKE (spoiler: que, aliás, está para lançar um novo disco), a banda fechou sua formação na simplicidade do trio formado por guitarra, bateria e baixo, para dar vida a seus chamados.
Pedem por alforria em dias de clausura.
"Bate as asas na neblina o nevoeiro deixa respirar / Abre as asas, esse vento vai te fazer planar", cantam em As Asas.
Pedem por amor em dias de ódio.
"Vai dançar pra mim / Vem me olhar assim", diz o verso final de Elétrica.
São mais assertivos em Gente, canção que começa com pinceladas leves, mas se desenvolve e ganha pontes encorpadas, musculosas. A dicotomia estética e sonora escancara, frente a frente, os "tempos de paz" e "tempos de guerra" cantados por Sielawa.
Homens de Melo, o disco, vaga por esses nuances sem quebras bruscas, o que sugere que a maturidade desejada foi, de fato, alcançada.
Clara é a intenção da banda também. Pedem pelo fim das clausuras. Cantam por aberturas, afinal. As palavras "aberta", "abre" e "abrir" povoam as metáforas das músicas Ponta de Faca, Odé, As Asas e Cem Anos. Ou seja, quatro canções de um total de oito.
E eles estão certos. Talvez seja esse um dos grandes males do século 21: o distanciamento entre o ser e o sentir. E a culpa está na gente, mesmo. Sentir é duro, dói, machuca, às vezes.
Protegidos pelas relações virtuais, de redes sociais que falsamente aproximam, vive-se na apatia.
Prefiro estar no time da Homens de Melo. No time de quem se abre. Mesmo que machuque. Se Morrissey sobreviveu aos anos 1980, acho que temos alguma chance.
Ouça o disco de estreia da banda Homens de Melo: