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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

'Assim é a Vida' é a comédia mais saborosa do ano

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

Rodrigo FonsecaTempos de guerra fomentam a necessidade de comédias, como um analgésico para o desespero diante da brutalidade; porém, quando a crise que reina sobre o mundo é de ordem econômica, e não bélica, o alívio do riso não se sustenta, e o sombrio (o horror) emerge como tônica dominante, impondo a dúvida do suspense, no lugar da certeza da gargalhada. Foi assim que o noir ganhou as telas do planeta, a partir do crack da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, e é assim que o terror ganhou este ano, com Corra!, It: A Coisa e companhia... No Brasil, nem a neochanchada resistiu: narrativas cômicas mais popularescas, inspiradas na emergência financeira das classes C e D, na linha Até Que a Sorte Nos Separe ou De Perna Pro Ar, caíram de prestígio com o povão, uma vez que até essas classes perderam os trilhos da evolução com a bagunça em nossas finanças. No mundo todo a comédia agonizou, excetuando-se um filmaço francês, que se impôs pelo requinte narrativo e pela pimenta por trás de suas tiradas observacionais: Assim É a Vida (Le Sens De La Fête). Na direção, estão Olivier Nakache e Éric Toledano, dupla de maior prestígio popular da França na atualidade, quando o assunto é fazer rir. O título Intocáveis (2011) fala por eles. Ou melhor, os 20 milhões de ingressos que Intocáveis vendeu em sua pátria fala por tudo.

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Coroado com 2,8 milhões de pagantes em sua bilheteria francesa, e mais uma fortuna em diferentes países da Europa por onde passou, Assim É a Vida é a comédia de maior apelo do Velho Mundo neste ano em que o gênero agonizou pelo estado de coisas na saúde econômica do planeta. E, em termos estéticos, pode fácil ser definida como a melhor comédia varejão do ano - no terreno das comédias finas, The Square - A Arte da Discórdia, ganhador da Palma de Ouro de 2017, com estreia por aqui prevista para janeiro, ocupa este lugar. Mas a narrativa de Toledano e Nakache também tem seus momentos de sofisticação, sobretudo pela presença de uma lenda autoral do cinema na França: o ator e dramaturgo Jean-Pierre Bacri (de O Gosto dos Outros).

Gilles Lelouche encarna um cantor abilolado em "Assim é a Vida"  Foto: Estadão

Pontuado pelo absurdo ao longo de 115 hilários minutos, onde confusões se misturam a debates culturais de inclusão, Assim É a Vida flagra tudo o que pode sair errado na celebração de um matrimônio. O noivo é um chato, a noiva é uma alienada, entre os convidados o hedonismo rola solto. Enfim... é fuzarca certa. O erro da festança começa pela escolha de um cantor (Gilles Lellouch, em deliciosa atuação) que faz o oposto do que os noivos pedem. O empresário Max Angély (papel de Bacri), que organiza eventos de gala, tenta controlar sua ave canora, mas não consegue. E erra em outros pontos também. A cada deslize, a trama vai descortinando, virada a virada, o quão atrapalhada é a equipe responsável pela cerimônia funcionar.

Jean-Pierre Bacri: empresário em crise  Foto: Estadão

Falta esmero e invenção à fotografia, deveras bem comportada. Mas a edição inova por ela, aproveitando o melhor dos diferentes cantos do local da festa. Existe, na forma, uma escancarada (e declarada) inspiração em Cerimônia de Casamento (1978), de Robert Altman. Mas o resultado final descamba mais pra chanchada do que pro humor cínico de Altman. E tudo funciona na margem da graça, do alto astral e da provocação.

Cotação: muito bom

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