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Pequenas neuroses contemporâneas

Opinião|"Não acabou, tem que acabar, quero o fim da Polícia Militar"

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Atualização:

 

O que se viu ontem pelo Brasil, nos protestos contra a morte de Marielle Franco, é simples: quer-se uma nova política.

Não tinha bandeiras do PT ou centrais sindicais. Nem dos partidos comunistas.

Não tinha camelôs com seus isopores.

Nem a PM estava por lá (apareceu no final).

Foi uma manifestação espontânea, convocada horas antes pelas redes sociais, e que juntou multidões no Brasil todo.

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Tinha uma palavra de ordem uníssona.

"Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar" ganhou uma nova versão: "Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar - e racista".

Bandeira de Marielle.

Era muita gente, que jamais será contabilizada (especialmente pela PM, em que se pedia o fim).

Jornalistas, perplexos, não sabiam por onde começar.

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Participo de manifestações políticas desde 1975 (a missa do Herzog foi a primeira). Nunca vi tanta gente. Viam de todos os cantos. E nunca me emocionei tanto.

Era revolta contra o racismo. Era a vez das mulheres. Era a esperança de um novo e justo Brasil.

Nem carro de som tinha.

A manifestação que ocupou toda a Avenida Paulista nem tinha roteiro.

Conseguiu-se um carro de som ali mesmo do bloco de carnaval Tarados Ni Você, que costuma sair pelo centro da cidade cantando Caetano Veloso.

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Carro de som que, como toda cidade, ficou preso no congestionamento.

A liderança do PSOL não discursou, não segurou bandeira, nem arrastou a multidão.

Sacou que o protagonismo era das mulheres, especialmente das mulheres negras.

Quem puxou uma caminhada foi o bloco de afoxé só de mulheres, Ilú Obá de Min.

Bloco que sai no Carnaval na Praça de República e, em outro dia, na Barra Funda.

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Paramos todos no final da Paulista.

O carro de som conseguiria chegar na Praça Roosevelt.

Enquanto uma manifestação que vinha da Prefeitura chegava no rabo da passeata, na Brigadeiro Luiz Antônio, decidiu-se seguir para o centro.

Começamos a descer a Consolação.

Não parava de chegar gente.

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A indignação só aumentava.

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"Coincidência é o cara%&$, mataram um preto, pobre e favelado...", entoavam.

"Machista, fascista, não passarão!"

Chegaram notícias de que o Governo Temer usava a manifestação e a execução para justificar a intervenção militar no Rio de Janeiro; sem a Reforma da Previdência, a intervenção, que Marielle era contra, transforma-se no único possível legado de um governo impopular.

Chegou a notícia de que a Executiva Nacional do PT associou o assassinato da vereadora ao "mesmo processo político que levou à condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro."

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Não tem nada a ver uma coisa com a outra.

PT não larga o osso.

Lula não larga o osso.

O PT não estava naquela manifestação.

Ao contrário, querem uma nova política.

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Querem de volta a pauta dos direitos civis, justiça social e da democracia nas ruas.

Aquelas que estão caladas.

Retomar o protagonismo da luta política.

Este é o legado de Marielle.

Esta é a missão que se pode tirar da execução covarde: reacender no Brasil a esperança vencida pela corrupção e privilégios de uma classe há muito no Poder.

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Opinião por Marcelo Rubens Paiva
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