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Opinião|Um argentino em Nova York

'Ninguém Está Olhando' foi apresentado no Cine Ceará como representante da Argentina. O filme tem coprodução com o Brasil e outros países

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:
 Foto: Estadão

O argentino (em coprodução com Brasil e outros países) Ninguém Está Olhando é o que se pode chamar de comédia dramática de qualidade.

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O personagem principal é Nico (Guillermo Pfening), ator de novelas de sucesso em seu país, que resolve tentar a carreira artística em Nova York. As coisas não são fáceis, e ele chega a trabalhar de babá do filho de uma compatriota casada com norte-americano.

O filme, dirigido por Julia Solomonoff, é moderno, tem estilo ágil, montagem rápida e personagens descolados. Joga um olhar na cena cultural nova-iorquina e põe em contraste as aspirações de um latino-americano de talento contra um meio cultural que pede clichês. Exemplo, Nico é loiro, mas para conseguir algum papel como latino precisa tingir o cabelo de preto.

Ninguém Está Olhando é o tipo de filme que joga com o "estar no lado de cá ou estar no lado de lá", como poderia ter dito um grande argentino, Julio Cortázar, que descreveu para sempre a condição do intelectual imigrante com seu Horácio Oliveira de Rayuela (O Jogo da Amarelinha). Horário era um estrangeiro em Paris, e torna-se mais estrangeiro ainda em Buenos Aires, quando decide voltar.

Nico não tem essa densidade crítica. Porém conserva essa dialética cruel, que não é apenas da Argentina, mas de todos os países, digamos assim, subdesenvolvidos. Miramos o Primeiro Mundo porque ele é promessa de uma cidadania simbólica que parecemos não ter em nossos países de origem. Por outro lado, quando saímos, nos sentimos mais estrangeiros do que nunca. Temos o nível do nosso trabalho rebaixado, não nos dão documentos e somos tratados como estranhos e indesejáveis. A volta não se dá por consciência, mas talvez por cansaço e esgotamento. E sempre encerra um certo gosto de derrota.

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Essas linhas estão lá, esboçadas, em linguagem contemporânea e agradável em Ninguém Está Olhando. Um bom filme.

Uma presença interessante é a da diretora brasileira Petra Costa, numa ponta. Petra dirigiu um filme chamado Elena, sobre a irmã, atriz que foi para Nova York tentar a carreira, deu-se mal e teve fim trágico. Sua participação no filme acrescenta uma camada a mais de significado. Pelo menos para quem conhece Petra, seu trabalho, e o sensível retrato que pintou da irmã morta.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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